10 mitos sobre o cuidado neurointensivo

A necessidade de conhecimento da anatomia e fisiopatologia do sistema nervoso central é evidente quando se discute o cuidado ao paciente com lesão cerebral aguda. Veja os 10 mitos do cuidado neurointensivo.

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1 – Apenas neurointensivistas, neurologistas e neurocirurgiões devem se preocupar com o cérebro.

A necessidade de conhecimento da anatomia e fisiopatologia do sistema nervoso central é evidente quando se discute o cuidado ao paciente com lesão cerebral aguda. Apesar da principal causa de admissão em unidade de terapia intensiva (UTI) não é relacionada a uma patologia neurológica ou neurocirúrgica, o cérebro também pode ser afetado. A principal causa são as patologias cardíacas e respiratórias que podem acarretar um fornecimento de oxigênio insuficiente, inadequada manutenção da barreira hematoencefálica, efeitos nocivos de sedativos, toxicidade medicamentosa e sepse resultado em delirium, encefalopatia, alteração no nível de consciência, coma e crises convulsivas. Assim, os cuidados intensivos devem incluir o cuidado neurointensivo de praxe. Dispor de uma equipe multiprofissional é de suma importância para identificação rápida e eficaz de sinais e sintomas sugestivos de disfunção neurológica. É necessário dispor de um profissional neurologista e neurocirurgião para a avaliação especializada e no auxilio à tomada de conduta.

2 – O exame clínico do paciente neurológico é muito difícil e por vezes impossível de ser realizado.

A avaliação clínica geral do paciente é a principal ferramenta de diagnóstico. A avaliação da consciência, cognição, função do tronco cerebral e função motora e sensitiva deve ser realizada na admissão e diariamente. A pratica diária e um roteiro objetivo (checklist) auxilia o exame físico e evita fatores de confusão. Distúrbios metabólicos fase pós-ictal e sedativos confundem os exames neurológicos. Estes devem ser usados com moderação em lesões cerebrais graves, exceto para indicações específicas, como o controle da pressão intracraniana (PIC), o tratamento de convulsões ou o controle da temperatura (CT).

3 – Não devemos mais monitorar a pressão intracraniana (PIC) no traumatismo cranioencefálico (TCE).

O monitor PIC tem sido fator que induz condutas mais agressivas, prejudicando os pacientes sem melhorar seus resultados. O ensaio Best-TRIP é muitas vezes indevidamente interpretado como evidência contra o monitoramento da PIC – uma visão que, de forma inadequada, indica o uso do monitoramento e a titulação da terapia. A controvérsia não é monitorar ou tratar a PIC, mas como esse sinal deve ser interpretado e respondido. Dessa forma deve-se monitorar a PIC sempre no TCE

4 – O limiar para tratar a PIC é de 20 ou 22 mmHg.

A alteração dos limiares de tratamento da PIC de 20 para 22 mmHg em diretrizes implica que uma PIC de 21 mmHg é considerada limite da normalidade, enquanto uma PIC de 23 mmHg deve ser tratada de forma agressiva. Estudos intervencionistas em que tratamentos agressivos, realizar craniectomia descompressiva ou hipotermia quando aplicados precocemente após cruzar o limiar de 20 mmHg, mostraram dano ao invés de benefício. Uma abordagem escalonada é racional e medidas agressivas devem ser provavelmente reservadas para elevações sustentadas da PIC acima de 25 a 30 mmHg que não respondem à terapia conservadora.

5 – O uso cetamina aumenta a pressão intracraniana (PIC).

Elevações da PIC induzidas pela cetamina foram relatadas em pequenos estudos em pacientes não ventilados (e não com lesões cerebrais agudas). De fato, a cetamina, como adjuvante em pacientes sedados mecanicamente ventilados, pode diminuir a PIC.

6 – Pacientes com hemorragia subaracnoidea (HAS) devem receber terapia “tripla H”.

A hidratação agressiva (com a consequente hemodiluição), associada à administração de vasopressores para aumentar a pressão arterial (PA), foi usada no passado na esperança de prevenir a isquemia cerebral tardia (IC) e o vasoespasmo. Entretanto, vem caindo em desuso pois pode ser prejudicial em uma população, onde a idade mediana é de 50 a 60 anos e as complicações cardiopulmonares são comuns. As recomendações atuais aconselham contra a hemodiluição e objetivam a normovolemia. Quando o diagnóstico ou a resposta à terapia são incertos, investigações adicionais podem ajudar a confirmar ou refutar o diagnóstico de isquemia cerebral – nem toda deterioração neurológica tardia na HAS se deve ao vasoespasmo.

Uso de AAS previne hemorragia subaracnoidea?

7 – Não há necessidade de controlar a temperatura após a parada cardíaca.

Não houve diferença no resultado entre temperatura de 33 ou 36°C. No entanto, esses achados não justificam a negligência do controle de temperatura após a parada cardíaca. Atingir 32–34°C pode ainda ser benéfico, mas muitos locais envolvidos nos estudo adotaram a meta de 36°C, uma vez que evita potenciais eventos adversos de resfriamento mais agressivo.

8 – A hipoglicemia é prejudicial para o cérebro, a hiperglicemia não é.

O alvo glicêmico ideal para a lesão cérebro aguda é controverso. O controle rigoroso da glicemia no intervalo de jejum normal aumenta o risco de hipoglicemia (profunda), especialmente em mãos inexperientes. Por outro lado, a hiperglicemia é um preditor independente de desfecho neurológico ruim e morte após parada cardíaca. Assim, mesmo quando a discussão sobre o alvo glicêmico ideal está longe de ser resolvida, é importante não ignorar que hipoglicemia e hiperglicemia estão associadas a piores desfechos clínicos em pacientes com lesão neurológica aguda.

9 – No acidente vascular isquêmico agudo (AVCi), a revascularização deve ser feita dentro de 3 horas do início dos sintomas.

A janela de tempo convencional para trombólise em AVCi é de 3 h, extensível a 4,5 h em pacientes com idade ≤ 80 anos, sem história de diabetes e acidente vascular cerebral prévio combinados, uma pontuação de ≤25 do National Institutes of Health Stroke Scale (NIHSS), que não faz uso de anticoagulantes orais e sem evidência de imagem de lesão isquêmica envolvendo mais de 1/3 do território da artéria cerebral média. Quando a trombectomia mecânica é considerada, o prazo recomendado é de 6h pós-ictus, mas condições semelhantes à zonas de penumbra na imagem de perfusão permitem janelas de tempo mais longas até 16h.

10 – O controle da pressão arterial em hemorragia intracerebral (HIC) deve ser rigoroso.

A interpretação de ensaios recentes sobre o tratamento da hipertensão após a HIC é controverso. O controle precoce da PAS (pressão arterial sistólica) para alvos acima de 140 mmHg reduz a expansão do hematoma, mas não melhora o resultado neurológico ou a mortalidade. A redução mais agressiva da PAS para 110-140 mmHg no estudo ATACH-2 não encontrou benefício em comparação à faixa de 140 a 180 mmHg, mas uma taxa maior de complicações renais. Em resumo, o controle da PAS na HIC pode reduzir a expansão do hematoma, mas não abaixo de 140 mmHg.

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Referência:

  • Meyfroidt, G., Menon, D. & Turgeon, A.F. Ten false beliefs in neurocritical careIntensive Care Med (2018).

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