Ablação ou tratamento medicamentoso para redução de eventos cardiovasculares na FA

O estudo CABANA levantou uma questão bastante simples: se em pacientes com FA sintomáticos a ablação seria superior ao controle do ritmo cardíaco com medicamentos na redução desses desfechos.

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Analistas financeiros estimam que o mercado da ablação para a fibrilação atrial (FA) envolva hoje em dia cerca de 4,5 bilhões de dólares. O crescimento da utilização de ablação tem se mantido, apesar das poucas evidências que o procedimento invasivo melhore desfechos duros como morte e acidente vascular encefálico (AVE). Os investigadores do estudo CABANA (The Catheter Ablation versus Antiarrhythmic Drug Therapy for Atrial Fibrillation) levantaram então uma questão bastante simples: se em pacientes com FA sintomáticos a ablação seria superior ao controle do ritmo cardíaco com medicamentos na redução desses desfechos. Os resultados do estudo foram apresentados no último Heart Rhythm Society (HRS) 2018 Scientific Sessions.

O estudo CABANA foi desenvolvido para comparar a segurança e eficácia da ablação por cateter com terapia medicamentosa para tratamento de pacientes com FA. Foram envolvidos 2.204 pacientes (média de idade 67,5 anos; 63% do sexo masculino) divididos em dois grupos – ablação (n=1.108) e terapia com medicamentos (n=1.096) – e seguidos por cinco anos. A ablação primária foi realizada com técnicas padrão (isolamento das veias pulmonares (IVP) / ablação circunferencial de área ampla (WACA), ablações acessórias, conforme necessário). Todos os pacientes receberam anticoagulação. Os resultados foram apresentados na forma padrão de intenção de tratar (ITT), o que significa que os pacientes que realizaram crossover ainda eram contados em seu grupo original. Os médicos participantes não foram cegados em relação ao procedimento realizado.

A questão mais discutida do estudo diz respeito ao elevado número de pacientes que não receberam o tratamento que lhes foi atribuído. No braço de ablação, 102 pacientes (9,2%) não tiveram ablação. A maioria se deve à escolha do próprio paciente. No braço medicamento 301 pacientes (27,5%) fizeram crossover para ablação.

Os desfechos primários do estudo foram morte, AVE, sangramento severo ou parada cardíaca. Após cinco anos de seguimento não houve diferença significativa no desfecho primário (hazard ratio (HR), 0,86; 95% CI, 0,65 – 1,15; P = 0,3). Nenhum dos componentes do desfecho primário teve diferença significativa entre ablação e terapia medicamentosa. Morte 5,2% vs 6,1% (p=0,38), AVE 0,3% vs 0,6% (p=0,19). Portanto os resultados indicam que ablação não é superior à terapia medicamentosa para desfechos cardiovasculares em cinco anos para pacientes com FA nova ou não tratada que necessitam de tratamento. Porém em uma subanálise em relação ao modo “como tratado” a ablação demonstrou eficácia superior à terapia medicamentosa.

Uma razão fundamental para que os estudos clínicos produzirem um nível mais alto de evidência do que os estudos observacionais é a randomização. A randomização geralmente equilibra todos os outros fatores além do tratamento. É por isso que os leitores do estudo CABANA devem reconhecer que quaisquer descobertas além da análise da ITT são observacionais. O ITT preserva a randomização. Mesmo que a comparação “como tratado” faça sentido é preciso se ater às regras da ciência.

Há, pelo menos, duas razões para isso: primeiro, os pacientes que passaram para a ablação podem ser diferentes dos pacientes que permaneceram no braço do medicamento. Em segundo lugar, porque o estudo foi aberto e conduzido em centros de ablação, os vieses pró-ablação dos médicos podem afetar a escolha do crossover, bem como o atendimento dos pacientes após o procedimento.

Talvez outra maneira de interpretar o estudo CABANA e preservar o princípio da ITT seja dizer que o estudo não comparou realmente a ablação aos medicamentos como foi planejado, mas comparou a estratégia de ablação versus a terapia médica inicial com a ablação para sintomas recorrentes. Neste cenário, não pode haver alegação de que a ablação é superior aos medicamentos para reduzir os principais desfechos, mas podemos preservar a possibilidade de que a ablação permaneça uma opção razoável para pacientes selecionados com FA.

O estudo CABANA ainda não foi publicado. Isso é crucial, pois o artigo certamente incluirá os detalhes necessários para uma avaliação mais completa.

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