Abstinência de álcool pode reduzir AVC em pacientes com FA de início recente

Estudo avaliou a associação entre o consumo de álcool (principalmente abstinência) e o risco de AVC isquêmico após o diagnóstico de FA.

A associação entre o consumo de álcool e o risco de fibrilação atrial (FA) já está bem estabelecida, porém a associação entre consumo de álcool e acidente vascular cerebral (ACV) é mais controversa, com estudos mostrando resultados conflitantes. Também não é bem claro se há relação entre o consumo de álcool e AVC em pacientes com FA.

Foi feito então um estudo para avaliar a associação entre o consumo de álcool (principalmente abstinência alcoólica) e o risco de AVC isquêmico após o diagnóstico de FA.

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Abstinência alcoólica pode reduzir AVC em pacientes com FA de início recente

Características do estudo

Foi um estudo de coorte observacional com a população da Coreia, onde todos os adultos maiores de 40 anos passam por avaliação clínica a cada dois anos. Essa avaliação inclui obtenção de medidas antropométricas, pressão arterial, exames laboratoriais e preenchimento de um questionário com informações sobre tabagismo, consumo de álcool e atividade física. 

Neste estudo foram incluídos todos os pacientes com novo diagnóstico de FA entre 2010 e 2016 e que passaram por avaliação dois anos antes e depois do diagnóstico. Foram excluídos os com FA valvar e menores de 20 anos, além dos que já tinham diagnóstico de AVC.

O consumo de álcool foi avaliado por meio do preenchimento de questionário e os pacientes foram divididos em três grupos: não etilistas, abstêmios após o diagnóstico de FA e etilistas (incluindo os que já eram e os que iniciaram o consumo de álcool após o diagnóstico de FA). Também foram obtidas informações sobre a frequência e quantidade do consumo e o consumo semanal foi dividido em leve (0 a 105 g), moderado (105 a 210 g) e intenso (≥ 210 g). 

O desfecho primário foi a ocorrência de AVC isquêmico no seguimento, iniciado dois anos após o diagnóstico da arritmia e com término quando ocorrência de AVC, morte ou fim do estudo (dezembro 2017). 

Os três grupos foram comparados entre si e foram feitas análises de subgrupos, de acordo com sexo, idade (< 65 anos, 65 a 74 anos ou ≥ 75 anos), risco de AVC pelo score de CHA2DS2VASC (< 3 e ≥ 3) e tabagismo (nunca fumou, ex-tabagista ou tabagista atual).

Resultados

No período, 97.869 pessoas foram diagnosticadas com FA. A idade média foi de 61,3 anos, 62,4% eram do sexo masculino e o CHA2DS2VASC médio foi de 2,3. O tempo médio entre a primeira avaliação e o diagnóstico, entre o diagnóstico e a segunda avaliação e entre as avaliações foi de 1,1, 0,9 e 2,0 anos respectivamente. Do total de pacientes 51% não eram etilistas, 13% estavam abstêmios após o diagnóstico e 36% eram etilistas. 

Entre os etilistas, 58,8% eram etilistas leves, 23,5% moderados e 17,8% intensos na segunda avaliação. Pessoas desse grupo tinham tendência a serem mais novos, do sexo masculino e terem CHA2DS2VASC médio menor que os outros dois grupos, além de terem prevalência menor da maioria das comorbidades. De forma concordante ao CHA2DS2VASC mais baixo, os etilistas faziam menos uso de anticoagulantes orais. Ainda, esse grupo incluía uma grande proporção de tabagistas, menor proporção de pessoas de baixa e fazia mais atividade física

A prevalência de insuficiência cardíaca, doença arterial obstrutiva periférica, doença pulmonar obstrutiva crônica, doença renal crônica e câncer era maior nos não etilistas e abstêmios que nos etilistas. 

Durante o seguimento de 310.926 pessoas-ano, 3.120 pessoas tiveram AVC isquêmico (10 por 1.000 pessoas-ano). Em 5 anos, a taxa de incidência de AVC foi menor em não etilistas e abstêmios que em etilistas e a razão da taxa de incidência após ajustes mostrou que esse risco de manteve menor nos dois grupos em relação aos etilistas. 

Na análise multivariada os resultados foram consistentes. Após realização do Propensity Score Matching, as características de base dos abstêmios e etilistas ficaram balanceadas, a taxa de AVC em 5 anos se manteve menor nos abstêmios em comparação aos etilistas e a razão da taxa de incidência também mostrou que abstêmios tinham menor risco de AVC comparado a etilistas. Na análise de subgrupos, os resultados foram consistentes com os resultados principais.

Em relação a quantidade de álcool ingerida, abstêmios que consumiam quantidade leve a moderada por semana e pararam de beber após diagnóstico de FA, tinham risco de AVC semelhante aos não etilistas. Já os que tinham consumo intenso de álcool e pararam de beber após o diagnóstico de FA mantinham um risco de AVC maior que os não etilistas. Além disso, os etilistas tinham risco aumentado em relação aos não etilistas, independente da quantidade ingerida previamente. Além disso, quantidade maior de álcool estava associada com maior risco de AVC.

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Idade avançada é fator de risco importante para AVC isquêmico e os etilistas eram pessoas mais jovens. Após ajustes e as diferenças de idade ficarem bem balanceadas, o risco de AVC permaneceu alto nos etilistas (11,7 por 1.000 pessoas-ano) comparado a abstêmios e não etilistas (10,1 por 1.000 pessoas-ano e 8,8 por 1.000 pessoas-ano). Outro ponto relacionado a isso foi que nos pacientes com mais de 75 anos o efeito benéfico da abstinência foi atenuado. Este estudo, além de ser observacional, pode ter algumas outras limitações, como possível interferência de outras comorbidades, já que apesar dos ajustes realizados, fatores confundidores pode persistir. 

Conclusão

Neste estudo, qualquer quantidade de álcool ingerida pelos pacientes com FA foi associada a maior risco de AVC comparado aos não etilistas e houve uma associação positiva com a dose (maior dose, maior risco). Quando o paciente parava de ingerir álcool após o diagnóstico, o risco de AVC tinha redução importante, se tornando praticamente semelhante ao de não etilistas na maioria dos pacientes. 

Estes achados são importantes e reforçam a necessidade de promoção de mudanças de estilo de vida como parte do tratamento de pacientes com FA, com resultados benéficos da redução de ingestão de álcool e, principalmente, da abstinência alcoólica. Na prática diária, esta é uma medida que deve ser enfatizada. 

Referências bibliográficas:

  • Lee S-R, et al. Lower risk of stroke after alcohol abstinence in patients with incident atrial fibrillation: a nationwide population-based cohort study. European Heart Journal. 2021. ehab315. doi: 10.1093/eurheartj/ehab315

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