Ácido tranexâmico ultra precoce tem benefício na HSA?

Foi publicado no Lancet, dezembro, um estudo sobre impacto em desfechos clínicos do uso precoce de ácido tranexâmico na HSA aneurismática.

Nos pacientes com hemorragia subaracnóide (HSA) aneurismática, episódios de ressangramento estão associados a piores desfechos e maior mortalidade. Assim, estratégias no sentido de controle do aneurisma roto (tratamento endovascular ou neurocirúrgico) devem ser empregadas assim que possível, de forma precoce. Estudos anteriores evidenciaram que o uso de ácido tranexâmico foi associado à redução do risco de ressangramento nesses pacientes, no entanto não demonstraram benefício nos desfechos clínicos , como funcionalidade a longo prazo. Existe ainda dúvida a respeito do impacto em desfechos clínicos do uso precoce de ácido tranexâmico na HSA aneurismática. Sendo assim, foi publicado no Lancet, em 21 de dezembro de 2020, o ULTRA Trial (Ultra-early tranexamic acid after subarachnoid haemorrhage (ULTRA): a randomised controlled trial). 

Estudo do Lancetsobre impacto em desfechos clínicos do uso precoce de ácido tranexâmico na HSA aneurismática.

O estudo ULTRA Trial

O estudo, que foi prospectivo, randomizado, controlado e multicêntrico, envolveu 955 pacientes no período de julho de 2013 a julho de 2019, tendo sido realizado na Holanda. O objetivo principal do estudo foi determinar o impacto do uso ultra precoce do ácido tranexâmico nos desfechos clínicos em seis meses. A população, com cálculo amostral prévio, foi formada a partir dos seguintes critérios de inclusão: idade > 18 anos, sintomatologia sugestiva para HSA com início há menos de 24h e tomografia de crânio (sem contraste), confirmando a presença de HSA. Alguns fatores de exclusão para o estudo foram: hemorragia perimesencefálica na tomografia com Glasgow de 13 a 15, tratamento atual para trombose venosa ou tromboembolismo pulmonar, gestação, e doença renal terminal. Os pacientes foram randomizados na proporção 1:1, assim que os critérios de inclusão fossem preenchidos, para o grupo ácido tranexâmico (TXA), com um total de 480 pacientes, ou para o grupo controle (475 pacientes). Não houve cegamento em relação ao grupo do estudo para pacientes, profissionais de saúde e investigadores.

Intervenções e desfechos sobre uso do ácido tranexâmico

O grupo TXA recebia, assim que a randomização era concluída, um bolus de 1 grama (g) de TXA endovenoso, seguido por 1 g de TXA endovenoso, a cada 8h. A intervenção era mantida até o tratamento do aneurisma (endovascular ou cirúrgico), ou até o máximo de 24h, o que ocorresse primeiro. O tratamento com TXA poderia ser suspenso também caso a angiografia não evidenciasse aneurisma, ou se fosse identificada outra patologia intracraniana como responsável pela HSA.

O desfecho primário consistiu na avaliação do status clínico e funcional desses pacientes pela escala de Rankin modificada (mRS), realizada através de entrevista telefônica, seis meses após a randomização. A avaliação foi feita por enfermeiras, com cegamento em relação ao grupo que o paciente pertenceu durante o estudo.

O resultado na escala de Rankin modificada foi categorizado arbitrariamente em: desfecho clínico bom (mRS 0 – 3) ou desfecho clínico ruim (mRS 4 – 6). Os desfechos secundários foram a taxa de mortalidade geral em trinta dias e seis meses; além da avaliação de desfecho clínico excelente, também arbitrariamente definido como escala mRS  entre 0 – 2, aos seis meses.

Resultados

A partir de análise intention-to-treat, o desfecho primário (desfecho clínico bom) foi encontrado em 287 pacientes (60%) no grupo TXA e em 300 pacientes (64%) no grupo controle (OR ajustado 0.86; IC 95% 0.66 – 1.12), ou seja, não houve diferença estatística. Quanto aos desfechos secundários, o desfecho clínico excelente foi significativamente menor no grupo TXA do que no grupo controle (OR 0.74; IC 95% 0.57 – 0.96), porém sem significância estatística. A mortalidade geral em trinta dias e seis meses também não apresentou diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos.

O estudo, tendo proposto a administração ultra precoce do TXA, teve como mediana de tempo, dos primeiros sinais e sintomas de HSA até a administração da primeira dose de TXA, apenas 185 minutos (IQR 130 – 333 minutos). A mediana de tempo do ictus dos sintomas, até a realização da tomografia de crânio foi de 93 minutos (IQR 65–165 minutos); e o tempo médio para tratamento do aneurisma, após o diagnóstico, foi de 14 horas (IQR 5–20 horas). Não houve diferença significativa nos eventos adversos, como complicações tromboembólicas e ressangramento, entre os grupos.  A despeito do uso precoce da medicação, de forma diferente a estudos prévios, nesse estudo não houve redução de ressangramento com o uso do TXA. Talvez o tratamento definitivo rápido dos aneurismas tenha reduzido o poder do estudo para esse desfecho.

Mensagens Práticas sobre administração de ácido tranexâmico

O estudo evidenciou que a administração ultra precoce de ácido tranexâmico (TXA) em pacientes com HSA, após confirmação diagnóstica por tomografia, não teve impacto em desfechos clínicos. A partir da evidência robusta fornecida por esse estudo, o uso rotineiro de TXA nessa situação não deve ser realizado.

Um grande número de pacientes com HSA, em ambos os grupos, evoluíram com complicações como ressangramento antes do tratamento do aneurisma, hidrocefalia, e tromboembolismo venoso.  Assim, pesquisas futuras devem focar no tratamento rápido dos aneurismas, uma vez identificados, além da identificação precoce e prevenção de outras complicações que impactam o prognóstico durante a internação hospitalar.

Referências bibliográficas:

 

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo

Selecione o motivo:
Errado
Incompleto
Desatualizado
Confuso
Outros

Sucesso!

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo.

Você avaliou esse artigo

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Baixe o Whitebook Tenha o melhor suporte
na sua tomada de decisão.