ADA 2021: GRADE trial – o que o paciente com DM2 deve receber depois da metformina?

Um dos destaques do congresso da ADA 2021 foi a apresentação do estudo GRADE, que avaliou os efeitos do tratamento combinado da metformina com outros antidiabéticos na DM2.

Nesta segunda feira, 28, um dos temas de maior destaque do congresso da American Diabetes Association (ADA 2021) foi a apresentação do estudo Glycemia Reduction Approaches in Diabetes: A comparative Effectiveness Study (GRADE), cujos dados ainda não foram publicados.

Este é um trial importante pois se trata de um ensaio clínico randomizado, pragmático, de 36 centros norte-americanos, financeado pelo National Institute of Health (NIH)/EUA com o intuito de avaliar a longo prazo os efeitos do tratamento combinado da metformina com outros antidiabéticos em pacientes com diabetes tipo 2 (DM2), com menos de dez anos de diagnóstico.

médico receitando medicamentos para diabetes tipo 2

Metformina e novos antidiabéticos

Como já abordado em outro texto publicado aqui no Portal PEBMED, apesar de o guideline da ADA sugerir meios de escolhermos qual a melhor opção para tratamento além da metformina, há pouca evidência de qualidade (ou quase nenhuma) que avalie a longo prazo o impacto de terapias combinadas. A proposta do GRADE foi trazer informações que poderiam impactar nessa decisão, com potencial para alterar a prática. Para tanto, reuniu diversos renomados especialistas norte-americanos entre seus autores.

O Dr. David Nathan (Harvard University), conhecido por participar de outros trials em diabetologia como o DCCT e o DPP, deu início a apresentação.

O background: em 2011, mais de 24 milhões de norte-americanos já tinham diagnóstico de diabetes, com uma incidência anual de 1.6 milhões de novos casos. Por 73 anos, apenas insulina, sulfonilureias e metformina estiveram disponíveis para o tratamento do DM2. Porém, nos últimos quinze anos, oito novas classes de medicações surgiram. Animador, porém os custos também aumentaram exponencialmente e uma dúvida surgiu: quem deve receber qual medicação?

Desde então, vários esquemas de “steps” foram propostos para que pudéssemos atingir o alvo do tratamento, a famosa glicada menor que 7%. Mas como? E mais importante: com base em que evidência?

Para tentar responder essa pergunta, ou ao menos reduzir o gap de conhecimento no assunto, o GRADE foi desenhado para investigar de forma comparativa quatro possíveis tratamentos combinados com a metformina: insulina glargina, liraglutida (agonista de GLP-1), sitagliptina (inibidor de DPP-4) ou glimepirida (sulfonilureia).

Tais medicações foram escolhidas por ter estudos de segurança bem estabelecidos e efeitos colaterais aceitáveis. Vale ressaltar que os inibidores de SGLT-2 na época da randomização (2013) ainda não estavam aprovados nos EUA.

Desenho do estudo GRADE

  • Foram incluídos pacientes DM2 com diagnóstico há menos de dez anos, que não sofreram eventos cardiovasculares nos últimos 12 meses, com glicada > 6,8% e idade maior que 30 anos ao diagnóstico
    (spoiler: com isso, observamos uma população de relativo baixo risco cardiovascular);
  • Todos os pacientes na randomização deviam estar em uso de metformina 1 a 2 g/dia;
  • Excluídos especialmente DM1 ou DM por causas secundárias, uso de outro antidiabético há menos de seis meses, TFG <30, pancreatite prévia, IC NYHA 3, história de câncer nos últimos cinco anos;
  • Havia um período de seis a 12 semanas para otimização da dose de metformina e ao final, foram incluídos os pacientes que apresentavam A1C entre 6,8 a 8,5% (média 7,5%);
  • Desfecho metabólico primário: tempo para atingir glicada maior ou igual a 7,0%. Esse tipo de análise é interessante uma vez que conhecemos a história natural do DM e que ao longo dos anos, a tendência é ocorrer uma piora da glicada;
  • Secundário: tempo para atingir glicada maior ou igual a 7,5%;
  • Terciário: após atingir o desfecho secundário, todos participantes recebiam glargina. A partir daí, novamente se avaliava o tempo para atingir glicada maior ou igual a 7,5%;
  • O estudo tentou ser bem completo na análise de desfechos e incluiu ainda a avaliação de incidência cumulativa de complicações microvasculares (albuminúria > 30 mg/g e > 300 mg/g, TFG < 30 mL/min ou neuropatia utilizando o escore de Michigan);
  • Avaliou também a incidência cumulativa de eventos cardiovasculares. Como se tratava de uma população de menor risco, não havia poder estatístico para MACE isoladamente, de forma que foi elaborado um desfecho combinado de “qualquer evento cardiovascular”, que somava MACE, hospitalização por IC e outros eventos como AIT, necessidade de revascularização e angina instável, por exemplo.

Resultados

Foram randomizados 5.047 pacientes, com média de idade de 57 anos, IMC de 34 kg/m² e TFG 95 mL/min. A dose média das medicações utilizadas ao final do primeiro ano foi de glargina 33 U/d, glimepirida 3,6 mg/d, liraglutida 1,4 mg/d e sitagliptina 96,3 mg/d. As doses ao final de quatro anos eram parecidas. Cerca de 93,7% dos participantes completaram uma média de cinco anos de seguimento (0 a 7,6 anos).

O tempo médio para atingir uma HbA1c > 7% foi de 882 dias no grupo liraglutida, 861 no grupo glargina, 810 para glimepirida e 697 com sitagliptina. A liraglutida teve um resultado 31% superior à sitagliptina e 13% superior que a glimepirida, sem diferença para a glargina.

Vale destacar que todas drogas foram melhores que a sitagliptina, havendo uma separação das curvas já no início do tratamento, sobretudo em pacientes com glicadas maiores (uma pena que a ADA não permitiu a reprodução desse conteúdo no momento).

Ao todo, 71% dos pacientes desenvolveram o desfecho glicada >7%.

Já para o desfecho secundário, glicada > 7,5%, a glargina foi a líder, ou seja, a que mais atrasou a piora do DM. Em tempo para o desfecho, participantes do grupo glargina levaram 1.188 dias para atingir tais níveis de A1C, comparado a 1.154 no grupo liraglutida, 1.116 dias com glimepirida e 1030 dias com sitagliptina. Houve uma separação estatística entre glargina e liraglutida com as demais. Resultado parecido com o desfecho terciário, com vantagem para as primeiras.

Eventos microvasculares: Não houve diferença entre grupos na incidência de eventos microvasculares investigados (albuminúria moderada ou grave, TFG < 60 e neuropatia).

Desfechos cardiovasculares

De forma isolada, não houve diferença na incidência cumulativa de MACE ou hospitalizações por IC. Vale lembrar que o estudo não tinha poder para tal avaliação. O que foi feito para haver possibilidade de análise estatística foi juntar todos os eventos e criar um desfecho chamado pelos autores de “any CVD”, ou seja, qualquer evento cardiovascular.

Com essa análise, houve uma diferença na incidência de eventos com base em Logrank test (p = 0,048), sendo que o que apresentou menor incidência de eventos foi o grupo liraglutida. Na comparação head-to-head, houve diferença apenas para a sitagliptina, com uma redução de 34% (p = 0,05), mas com curvas mostrando uma tendência a redução tanto de MACEs, como hospitalizações por IC e mesmo mortalidade por todas as causas. Seria uma questão de tempo de seguimento?

Interessantemente, o grupo liraglutida mostrou também menores níveis pressóricos que os demais grupos, com significância estatística.

Já o peso não mostrou nada inesperado, com o grupo liraglutida tendo uma diferença significativa dos demais, com perda média de -4 kg ao final de 4 anos de seguimento.

Por fim, todas drogas se mostraram seguras, havendo apenas uma incidência pouco maior de hipoglicemias graves no grupo glimepirida (2,3%) que nos demais, inclusive mais que a glargina (1,4%).

Obs: Os autores destacam que estes resultados são preliminares, pois ainda é necessário a adjudicação de eventos cardiovasculares (atualmente a análise está em torno de 90% dos eventos).

Conclusões

O estudo GRADE traz dados inéditos sobre o efeito da associação de medicações antidiabéticas no DM2 e como elas se comparam. Vale lembrar que, sobretudo do ponto de vista cardiovascular, os resultados são preliminares.

Já podemos ressaltar que o impacto de combinar metformina com sitagliptina parece menor que com liraglutida (parece óbvio, mas não tínhamos estudos head-to-head dessa forma ainda!), bem como talvez valha a pena lançar mão mais precocemente da glargina, já que esta se provou segura e eficaz. Mais que isso, a associação de terapias parece atrasar a evolução do DM, pelo menos em termos de tempo para elevação de glicada.

Tudo bem que não houve diferença em desfechos microvasculares, porém o tempo de seguimento para tanto foi relativamente pequeno. É preciso ter em mente, ainda, que o estudo englobou em um balaio só pacientes recém diagnosticados com pacientes já não tão bem controlados há quase dez anos. Sabemos que são populações que se comportam diferente.

Os autores ressaltam ainda que, pela população diversificada adotada na coorte, muitas outras análises poderão ser feitas com base nesses dados.

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