ADA no diagnóstico de tuberculose pleural: Quais fatores podem interferir na interpretação?

A tuberculose pleural que, além de poder ser confundida com tantas outras doenças, nem sempre tem resultados laboratoriais confiáveis.

A tuberculose é uma doença altamente prevalente no Brasil e distribuída por praticamente todas as suas regiões. Apesar do diagnóstico clínico muitas vezes ser altamente sugestivo, a confirmação só vem através de testes (frequentemente essenciais) que confirmam a infecção, considerando a grande quantidade de diagnósticos diferenciais que podem causar confusão.

Um caso especialmente desafiador é o da tuberculose pleural (TBP) que, além de poder ser confundida com tantas outras doenças, nem sempre tem resultados laboratoriais confiáveis. A estimativa de sensibilidade para a pesquisa e cultura de BAAR no líquido pleural (LP) é de apenas 36%. A chance de diagnóstico pode ser aumentada com a biópsia pleural (que consegue uma sensibilidade de 90%), porém a coleta exige procedimentos mais invasivos aos quais nem sempre o paciente tem condições de ser submetido.

tuberculose

Diagnóstico

Como uma alternativa, a dosagem de adenosina deaminase (ADA) surgiu para auxílio no diagnóstico de tuberculose nesses casos de pesquisa bacteriana mais difícil. A enzima, em si, é importante na diferenciação de linfócitos T CD4 e, portanto, seus níveis estão aumentados em secreções biológicas quando a imunidade adaptativa e crônica está em maior atividade. Apesar de isso abrir brecha para outras doenças que alterem os níveis de ADA, a enzima continua sendo um marcador com boa sensibilidade e mesmo especificidade para tuberculose. No líquido pleural, especificamente, a sensibilidade e a especificidade chegam a 100% em alguns estudos.

Assim como outros vários exames laboratoriais, porém, os níveis de ADA podem ser alterados em determinadas condições clínicas. O próprio líquido pleural pode variar em composição (de um simples transudato a um empiema franco) e, logo, isso despertou algumas dúvidas nos pesquisadores. Seria possível que os níveis de ADA no líquido pleural seja falseado com algum elemento da sua composição? Ou seriam os níveis também variáveis de acordo com idade ou sexo?

Estudo sobre o tema 

Para sanar essa dúvida, um estudo de Singapura publicado no periódico BioMed Central Infectious Diseases pesquisou especificamente se características demográficas, bioquímica do líquido pleural e a leucometria de sangue periférico poderiam interferir no valor de corte da ADA. O estudo foi retrospectivo, envolvendo 80 pacientes com diagnóstico de tuberculose pleural e 80 com outras causas de derrame pleural. O diagnóstico de tuberculose em todos esses casos foi confirmado com pesquisa de BAAR positiva no líquido, cultura de BAAR do líquido positiva, anatomopatológico compatível ou cultura de biópsia pleural positiva para BAAR.

Conforme esperado, os níveis de ADA no líquido de pacientes com diagnóstico de TBP foi significantemente maior que nos de pacientes sem esse diagnóstico e, nesse segundo grupo, os valores de ADA foram mais ou menos os mesmos entre os diferentes diagnósticos identificados (ICC, malignidade, parapneumônico e outros). A dosagem de ADA teve valores diretamente proporcionais aos de proteína no líquido pleural, porém foi praticamente indiferente aos níveis de DHL e lactato no líquido e à leucometria do sangue periférico. Os níveis também não tiveram diferença significativa na comparação entre os sexos, porém foi percebido que pacientes com idade maior ou igual a 55 anos tinham valores de ADA no LP consideravelmente menores que os mais jovens.

Quando os valores foram analisados globalmente (sem a separação dos grupos em idades), o valor de corte do ADA em 45UI/L gerou uma sensibilidade (S) de 93,8% e uma especificidade (E) de 82,5%. Quando a análise foi quebrada entre os grupos etários, porém, foi necessário estabelecer valores mais altos para os pacientes menores de 55 anos e valores mais baixos para os acima dessa idade. No grupo de menores que 55 anos, o valor de corte de 72UI/L gerou uma S de 95,1% e uma E de 87,5%, com valor preditivo positivo (VPP) de 95,1% e um valor preditivo negativo (VPN) de 87,5%. Em outras palavras, isso quer dizer que, usando esse valor de corte nessa faixa etária, a chance de um resultado de ADA positivo no LP fechar o diagnóstico de TBP é de 95 em cada 100 pacientes. Já no grupo de 55 anos ou mais, o valor de corte de 26UI/L gerou S de 94,7% com uma E relativamente baixa de 80% (apesar do VPP e VPN ambos de 97,8%). Para aumentar um pouco mais a especificidade do teste, o uso do valor de 46UI/L gerou uma E de 92,9% (o que automaticamente aumenta o VPP e, portanto, aumenta as chances de se fechar o diagnóstico com um resultado positivo), mas às custas de redução na S para 78% (reduzindo as chances do resultado vir positivo mesmo nos pacientes que têm, de fato, TBP).

Conclusões

Vários outros estudos já estudaram as variações na composição do líquido pleural no contexto da TBP, porém este foi um dos primeiros a analisar especificamente valores de corte para a ADA. A conclusão foi sugerir o uso dos valores de corte de 72UI/L (para pacientes com menos que 55 anos) e 46UI/L (para os de 55 anos ou mais), que foram os que geraram as melhores sensibilidades e especifidades dos testes. Não foram sugeridos valores de corte relacionados aos níveis de proteína identificados na bioquímica do líquido pleural, porém fica o alerta de que pacientes com alta quantidade de proteína no LP tendem a ter maiores níveis de ADA e isso pode falsear o resultado. Como sempre, a análise caso-a-caso e de acordo com as suspeitas clínicas levantadas é essencial para o diagnóstico.

Leia também: Tuberculose: qual é a sua relevância para a pediatria?

O estudo cita ainda a necessidade de maiores pesquisas relacionadas à etnia. Muitos dos participantes da pesquisa de base para esse artigo eram chineses e, aparentemente, eles apresentavam níveis de ADA naturalmente mais baixos que os demais (mesmo na vigência de TBP). Isso levantou a dúvida quanto à possibilidade da genética e da raça estarem envolvidas também como influenciadores nos valores de corte de ADA a serem usados. Porém, a prevalência de TBP na população chinesa, em si, já é mais baixa, o que provavelmente explica esse resultado. Porém, ainda assim é importante investigar mais a fundo essa e outras hipóteses.

Referência bibliográfica:

  • TAY, Tunn Ren; TEE, Augustine. Factors affecting pleural fluid adenosine deaminase level and the implication on the diagnosis of tuberculous pleural effusion: a retrospective cohort study. Bmc Infectious Diseases, [S.L.], v. 13, n. 1, p. 1-7, 16 nov. 2013. Springer Science and Business Media LLC. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2334-13-546. 

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