Atestados e laudos na prática do médico generalista

Para muitos médicos estar diante de pacientes que desejem atestados ou laudos médico pode ser um momento de dúvidas. Confira como fazer.

Dúvidas sobre questões legais e éticas, sobre a maneira correta de preencher ou até sobre a real necessidade do paciente de receber os atestados e laudos podem surgir. Esses documentos extrapolam o âmbito médico-científico e abrangem esferas administrativas e judiciais. Para o médico que atua no pronto-socorro ou na Atenção Primária, no entanto, a abordagem desse assunto pode se dar de maneira bem prática. Um primeiro ponto importante é a diferenciação de atestado e laudo.

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Atestados e laudos na prática do médico generalista

Atestado x laudo

Atestados médicos são declarações feitas por autoridade médica, referentes a fatos médicos, que possuem o propósito de afirmar o estado de saúde ou o estado mórbido de um paciente. Podem ser feitos com o objetivo de atestar doença ou saúde, para fins trabalhistas, previdenciários, de uso de transporte coletivo, de concurso público etc. Ou seja, podem servir para atestar desde “aptidão para atividades físicas”, até necessidade de afastamento do trabalho por motivos de doença, por exemplo. Assim, o médico deve se lembrar de alguns pontos essenciais para a elaboração de atestados, que idealmente devem estar contidos em todos eles:

  1. Registro de todas as informações em letra legível, sob o risco de sanções éticas;
  2. Identificação do médico emissor do atestado (nome, sobrenome, endereço, número do CRM e assinatura);
  3. Discriminação do motivo do atestado (fins trabalhistas, para prática de atividade física, para concurso público etc). Não utilizar a expressão “para os devidos fins”;
  4. Informação de quem solicitou o atestado (o próprio paciente, pedido do Juízo, terceiros). Idealmente solicitar a assinatura do paciente ou da pessoa que solicitou o atestado no próprio documento, de modo a inibir o mau uso do mesmo;
  5. Identificação completa do paciente, com número de identidade (RG ou CPF). Idealmente solicitar ao paciente um documento oficial com foto para confirmar a identidade;
  6. Recomenda-se a expressão “Foi por mim examinado na data de hoje”;
  7. Informar a data de afastamento em numeral e por extenso, idealmente colocando um “0” à esquerda em casos de afastamentos inferiores a 10 dias (ex: 06 dias). Não orientar afastamento “por tempo indeterminado”;
  8. Datação do documento. Sua ausência anula o valor do mesmo.

Os médicos só podem incluir o código CID-10 nos atestados por motivos justificáveis, como dever legal ou solicitação do paciente ou seu representante legal. Nesses casos, a anuência do paciente ou representante legal deve ser expressa no atestado com a assinatura acompanhada da frase “autorizo a informação do código do CID-10”. É comum ver empresas solicitando que os atestados de seus funcionários contenham CID. No entanto, essa exigência só pode ser acatada em caso de autorização expressa do paciente.

Já o laudo médico é o documento que descreve, com o máximo de detalhes, o quadro clínico de um paciente. Ele é de enorme importância para casos de perícia médica, onde o paciente precisa comprovar a condição clínica que apresenta, e em casos de encaminhamentos de pacientes para colegas médicos que não os estavam tratando. A intenção é fornecer informações completas sobre o estado de saúde da pessoa, a fim de auxiliar na tomada de decisão por aqueles que não possuem conhecimento prévio sobre o paciente.

A comparação entre atestados e laudos é feita de maneira lúdica e simples pelo livro “Medicina ambulatorial: Condutas de atenção primária baseadas em evidências”, em seu capítulo sobre documentos médicos: enquanto o atestado é comparado a uma foto do casamento, onde o noivo e a noiva aparecem sorridentes cortando o bolo, o laudo é o vídeo do casamento, que mostra a cerimônia, os convidados e os detalhes de toda a festa. Assim, compara-se o conteúdo de cada um dos documentos na tabela abaixo:

Atestado Médico Laudo Médico
Nome do paciente
Tempo de afastamento
Pode conter o CID-10, se indicado
Nome do paciente

CID-10

Quando começou a doença?

Quais exames realizados e resultados?

Quais tratamentos realizados?

Qual a situação atual?

Qual o prognóstico?

Quais as limitações observadas?

Tempo de afastamento

Em exemplos práticos: um documento que descreva e defina o quadro de Insuficiência Cardíaca Congestiva de um paciente, com as medicações que usa, os exames que fez, a situação do paciente, o prognóstico etc., é considerado um laudo médico. Um atestado, por outro lado, se limitaria a dizer, por exemplo, a quantidade de dias que esse paciente necessita manter-se afastado do trabalho, sem necessariamente descrever o quadro clínico ou o diagnóstico.

Perícia, auxílio-doença e outros assuntos previdenciários

Em relação aos laudos, talvez as principais dúvidas girem em torno daqueles com finalidades de perícia, auxílio-doença e outros assuntos previdenciários. Dois pontos aqui são essenciais para fazer o médico generalista ficar à vontade no momento de atender um paciente com essa demanda. Primeiro é saber que quem define se um paciente receberá auxílio ou aposentadoria por doença, ou seja, se será “aprovado” na perícia, é o médico perito do INSS. É ele quem bate o martelo. O laudo feito pelo generalista (ao qual nos referimos nesses casos como “médico assistente”) serve para auxiliar o perito em sua decisão, que pode corroborar ou não as informações nele contidas. Não é necessário para o médico assistente determinar tempo de afastamento do trabalho ou sequer descrever se há essa necessidade. Essa definição fica por conta do perito. Se o médico assistente se sente seguro para sugerir esse afastamento, ele pode o fazer; entretanto, novamente, a decisão final será do perito.

Outro ponto importante é entender que o médico assistente só precisa (e só deve) descrever em um laudo aquilo que ele efetivamente vê em sua consulta, seja através da anamnese ou dos exames físico e complementares. Ou seja, em um exemplo hipotético, se um paciente deseja levar um laudo à perícia do INSS para tentar uma aposentadoria por invalidez devido a um simples quadro de diabetes compensada (que não justificaria uma aposentadoria), nada impede o médico assistente de fornecer um laudo com essa informação, sem sugerir afastamento ou descrever maiores limitações. O laudo dizendo que o paciente é portador de diabetes não servirá para ele conseguir a aposentadoria, contudo ao mesmo tempo não contém nenhuma informação inverídica.

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Uma situação que pode ser mais complicada é quando o paciente deseja um laudo com uma informação que não pode ser verificada claramente na consulta pelo médico, como por exemplo, atestar certos transtornos psiquiátricos em consultas de primeira vez. O médico não pode ser forçado a dar laudo sobre uma condição clínica que não possa ser constatada até o momento de seu fornecimento. Ou seja, se o paciente possui, por exemplo, uma perna amputada, o médico identifica isso rapidamente e pode fornecer laudo sobre essa informação. Contudo, em um único atendimento, o médico dificilmente conseguirá identificar que um paciente possui, por exemplo, déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), não devendo, portanto, fornecer laudo nesse momento. Idealmente, laudos nesses casos devem ser fornecidos por médicos que acompanhem longitudinalmente o paciente, após mais de um contato, nos quais pôde ser identificada a doença. É possível, por outro lado, fornecer um documento com informações da consulta que possam ajudar a esclarecer o diagnóstico. Por exemplo, no caso de TDAH, o médico pode descrever no laudo que “a criança se mostra agitada no consultório, não obedece à mãe, não colabora com o exame físico etc”, sem definir diagnóstico.

Finalizando, é importante pontuarmos que o médico que identifica pacientes com motivos para afastamentos ou para receber auxílios previdenciários por doença tem o dever ético de apontá-los. Se possuir segurança sobre o diagnóstico ou sobre as limitações que o quadro impõe ao paciente, o médico, mesmo generalista, pode e deve ajudar através do fornecimento de laudo, inclusive com sugestão de tempo de afastamento. Isso se aplica principalmente aos médicos que atuam no âmbito da Atenção Primária, dentro das unidades básicas de saúde, que são os responsáveis pela coordenação do cuidado do paciente e pela longitudinalidade de seu acompanhamento.

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