Benefícios do uso de medicação à noite para pacientes com hipertensão

Estudo testou de forma prospectiva se a ingestão de medicação para tratamento de hipertensão à noite teria benefícios para os pacientes.

Alguns estudos prospectivos já mostraram melhor controle pressórico quando o paciente toma a medicação à noite, antes de dormir. Isso seria decorrente de influência do ritmo circadiano na farmacocinética e farmacodinâmica das medicações e nos mecanismos de regulação da pressão arterial (PA). A PA média no sono é um marcador prognóstico de doença cardiovascular mais sensível que a PA medida em consultório ou a PA no período de vigília ou nas 24 horas, quando medida pelo MAPA (medida ambulatorial da PA). Baseado nisso, o estudo Hygia Chronotherapy foi desenhado para testar de forma prospectiva se a ingestão de uma ou mais medicações para tratamento de hipertensão antes de dormir teria benefício tanto no controle pressórico quanto em redução de risco cardiovascular, quando comparado a tomar a medicação pela manhã.

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Benefícios do uso de medicação à noite para pacientes com hipertensão

Características do estudo e população envolvida

Foi um estudo multicêntrico, prospectivo, controlado, randomizado, aberto, com desfecho cego. Os pacientes eram randomizados na razão 1:1 em dois braços, um grupo com tomada de medicação à noite e outro pela manhã. As medicações eram prescritas de forma livre pelos médicos da atenção primária, desde que fossem medicações de primeira linha para tratamento da hipertensão e, quando o paciente necessitava de duas ou mais medicações, era recomendado que fossem prescritas associações, visando melhor aderência.

Os critérios de inclusão eram: idade maior que 18 anos, diagnóstico de hipertensão pelo MAPA (PA sistólica média na vigília ≥ 135 mmHg, PA diastólica média na vigília ≥ 85 mmHg, PA sistólica média no sono ≥ 120 mmHg, PA diastólica média no sono ≥ 70 mmHg) e uso de anti-hipertensivos. O MAPA de 48 horas era realizado para confirmar o diagnóstico nos que ainda não estavam medicados ou avaliar o tratamento nos que já tomavam medicação. Os pacientes eram avaliados clinicamente e com MAPA no mínimo uma vez por ano. O desfecho primário foi infarto agudo do miocárdio (IAM), revascularização coronária, insuficiência cardíaca (IC), acidente vascular cerebral (AVC) e morte por causa cardiovascular.

Resultados

Entre 2008 e 2018, foram avaliados 19.084 pacientes, com idade média de 60,5 anos e 55% homens. Não houve diferença entre os grupos em relação a diabetes, apneia do sono, doença renal crônica, obesidade, história previa de eventos cardiovasculares, medidas antropométricas e variáveis laboratoriais. As medidas de PA no consultório, médias de PA e prevalência de padrão não dipping pelo MAPA também foram semelhantes.

O número de medicações prescritas para o grupo que tomava a medicação à noite foi menor que no grupo que tomava pela manhã (1,71 x 1,8; p < 0,001). Além disso, o grupo que tomava pela manhã teve maior prevalência de uso de diuréticos e menor de bloqueador de canal de cálcio (BCC). As medicações mais frequentemente prescritas em monoterapia foram bloqueadores do receptor de angiotensina (BRA), maioria valsartana ou telmisertana, seguido de inibidor da ECA (IECA), maioria enalapril ou ramipril, e BCC, maioria anlodipino. A combinação mais frequente era de IECA/BRA com diuréticos, principalmente hidroclorotiazida ou BCC e a tripla terapia mais comum consistiu de IECA/BRA com diurético e BCC.

Na análise final, os pacientes que tomavam a medicação à noite tiveram menor valor de creatinina e LDL e maior HDL que os que tomavam pela manhã, sendo que o uso de aspirina e estatinas foi semelhante entre os grupos. A última avaliação com MAPA mostrou menor média de PA no sono, mas não na vigília nos pacientes que tomavam a medicação à noite. Este grupo também teve maior queda da PA no sono e menor proporção de pacientes com padrão não dipper, que tem maior risco cardiovascular. Todas essas diferenças tiveram p < 0,05.

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Durante o seguimento médio de 6,3 anos houve 1.752 eventos cardiovasculares. Pacientes do grupo que tomava a medicação à noite tiveram menor taxa de eventos do desfecho primário, com HR = 0,55 (95% IC 0,50 -0,61; p < 0,001). Este benefício também foi significante para o desfecho secundário de AVC, eventos coronarianos e eventos cardíacos analisados separadamente. Houve maior redução de risco principalmente para morte cardiovascular (HR = 0,44 (95% IC 0,34 -0,56; p < 0,001), AVC hemorrágico (HR = 0,39 (95% IC 0,23 -0,65; p < 0,001), IC (HR = 0,58 (95% IC 0,49 -0,70; p < 0,001) e doença arterial periférica (HR = 0,52 (95% IC 0,41 -0,67; p < 0,001). É importante ressaltar que não houve diferença de efeitos colaterais relatados nem de aderência ao tratamento.

Conclusão e mensagem prática

Esse estudo mostrou que houve melhor controle pressórico quando a medicação era tomada à noite, sem perda da eficácia no controle da PA no período de vigília e com menor prevalência da ocorrência do padrão não dipping. Esses achados foram associados a importante redução de risco cardiovascular, sendo que a redução da PA média no sono foi o maior preditor de redução desse risco. O tratamento à noite se mostrou seguro, sem maior ocorrência de eventos adversos, e com a mesma taxa de aderência.

Esses achados precisam ser confirmados em outras populações, pois o estudo foi multicêntrico porém com pacientes apenas da Espanha. Caso esses benefícios sejam confirmados, a mudança do horário da tomada de medicação é algo que pode ser facilmente implementado na nossa prática diária, com grande benefício aos pacientes.

Referências bibliográficas:

  • Hermida RC, et al. Bedtime hypertension treatment improves cardiovascular risk reduction: the Hygia Chronotherapy Trial. European Heart Journal. 2020 Dec 21;41(48):4565–4576. doi: 10.1093/eurheartj/ehz754

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