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O tema cannabis medicinal ainda é polêmico no Brasil e é visto com ressalvas. Além disso, os canabinoides são cercados por considerável controvérsia na mídia e na sociedade. Entretanto, em países em que seu uso medicinal e adulto (recreacional) foi totalmente liberado (como Uruguai e Canadá), muito tem-se estudado sob seus possíveis efeitos benéficos.
Uma das explicações para o aumento do uso de canabinoides pode ser a chamada crise dos opioides, em que a dependência e mortes por overdose por uso abusivo destas medicações, tem gerado um grande impacto social.
O termo maconha medicinal é incorreto e deve ser evitado no meio científico, haja vista que os medicamentos utilizados são compostos de duas substâncias retiradas dos botões das flores das plantas femininas Cannabis sativa/indica/ou híbrida: o tetraidrocannabidiol (THC ) e cannabidiol (CBD).
O corpo humano produz, sob demanda, substâncias endocanabinoides, como, por exemplo, 2AG (glicerol 2-araquidonoil) e anandamida (ou etanolamina araquidonoil). Elas não seguem a via clássica dos neurotransmissores. São sintetizadas em neurônios pós-sinápticos e têm a função de modulação dos neurônios pré-sinápticos (principalmente via glutamato e GABA), através dos receptores pré-sinápticos canabinoides CB1 e CB2.
O CB1 está presente principalmente no sistema nervoso central e periférico e é responsável pela maioria dos efeitos neurocomportamentais, atuando na dor e transtornos do humor. O CB2 está presente principalmente no sistema imunológico e atua modulando resposta inflamatória e citocinas.
Os canabinoides são uma ferramenta na gestão do paciente com dor crônica, podendo diminuir até 30% as escalas de dor. Seus efeitos relatados são: diminuição de dor, aumento da tolerância a dor, melhora da qualidade de vida, retorno as atividades de vida diária. Aparentemente não tem efeito curativo da dor.
Os principais estudos em dor são: dores neuropáticas crônicas de qualquer etiologia; fibromialgia; dor (e espasticidade) em esclerose múltipla; dor em lesão medular; dor oncológica e como coadjuvante para melhora do humor e sono. Não é recomendado para dores agudas, episódicas ou pós-cirúrgicas.
A metanálise de J. Aviram, de 2017, relata que, apesar dos estudos selecionados para análise serem heterogêneos (ainda não há padronização de doses e formulações), sugere-se que os canabinoides podem ser eficazes no tratamento de dor crônica, principalmente para pacientes com dor neuropática.
Sugere-se referenciar o paciente a clinicas ou médicos especializados no uso de canabinoides. Existe uma lista de médicos prescritores no site da ONG AMA-ME (Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal).
Não é indicado como tratamento de primeira linha, mas como medicação coadjuvante. Além disso, deve-se pesquisar o antecedente pessoal, social e psiquiátrico, bem como, abuso de substâncias químicas.
Para o tratamento de dor, a via indicada é geralmente a oral (na forma de spray oral, óleos ou cápsulas). Essa via tem um pico de ação mais baixo, menores efeitos colaterais e duração mais prolongada em relação a via inalada. O metabolismo é hepático.
Nos casos de dor crônica, a formulação mais prescrita é a relação THC:CBD um para um.
Foi observado que as medicações com composição única de CBD ou THC geram muitos efeitos colaterais, chamados efeito entourage. Para eliminar isso, é necessário a mistura das duas substâncias. A dosagem de cada uma vai depender da patologia a ser tratada.
A dose de canabinoides deve ser individualizada, com objetivo de prescrever a menor dose possível com o máximo de efeitos benéficos e o mínimo de efeitos colaterais. O acompanhamento com o médico prescritor deve ser com retornos em curto período de tempo.
Dependem da dose e da quantidade de CBD e principalmente THC: boca seca, distúrbios neurovegetativos e psicológicos, tontura, dificuldade de dirigir, entre outros.
Estudos mostram que é um medicamento seguro, com baixas taxas de dependência (cerca de 9%) e baixo risco de morte por overdose.
É uma droga classe C, portanto, contraindicada na gravidez e amamentação. Por ser uma substância psicoativa, deve-se orientar cuidado para dirigir ou trabalhar com máquinas.
Podem ser prescritos para idosos. Todavia, sua prescrição deve ser evitada para adolescentes, pois nesta fase da vida, o sistema nervoso está mais susceptível a dependência ou desenvolvimento de doenças psiquiátricas, como esquizofrenia.
Deve-se ter cuidado ao prescrever para atletas, pois o THC pode fazer parte da lista antidopping. Nestes casos, deve-se indicar o cannabidiol purificado.
Veja também: Cannabis: heroína ou vilã?
Com o raciocínio que os receptores endocanabinoides estão presentes em quase todo o corpo, basicamente eles estão sendo estudados para diversas patologias: antiespasmódico, náuseas e vômitos, espasticidade, diminuição da motilidade intestinal, melhora do sono e apetite, tratamento de lesões de pele, efeito anti-inflamatório e analgésico, antipsicótico, antiepiléptico, ansiolítico, neuroprotetor, para demência e doenças neurodegenerativas, como doença de Parkinson. Estudos também estão sendo realizados para o tratamento com cannabinoides para dependência de substâncias ou de opioides.
Por sua vez, segundo o In the report The Health Effects of Cannabis and Cannabinoids: The Current State of Evidence and Recommendations for Research, de janeiro de 2017, existem evidências conclusivas ou substanciais de que os cannabinoides são eficazes para o tratamento da dor crônica em adultos, além de terem efeito antieméticos e melhorar a espasticidade na esclerose múltipla.
No Brasil, o uso medicinal é liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), desde 2015. O acesso se dá por cinco formas:
Apesar de ser um assunto polêmico e controverso, este texto tem o objetivo de mostrar um panorama geral sobre a cannabis medicinal. Cabe a nós da área da saúde estudarmos as evidências científicas e nos mantermos atualizados sobre essa opção terapêutica.
Sites indicados para leitura:
Regulamentação pela Anvisa:
Referências bibliográficas:
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