Cardiomiopatias arritmogênicas: você sabe como conduzir?

Cardiomiopatias arritmogênicas devem ser corretamente manejadas, pois têm alto risco de morte súbita e o tratamento pode melhorar a qualidade do paciente.

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Você já se deparou com um holter cheio de extrassístoles monomórficas e ficou na dúvida do que fazer? Já viu paciente ter uma queda na fração de ejeção inesperadamente e voltar tomando amiodarona pra “controlar” as extrassístoles?  Pois então, sabe-se que pra várias doenças existe uma lacuna entre o manejo preconizado pelas diretrizes e o que habitualmente se faz na prática. Para as cardiomiopatias arritmogênicas (CA) então, a confusão é ainda maior. Sem contar que o tratamento inadequado dessas doenças pode induzir uma taquicardiomiopatia e pode aumentar o risco de morte súbita dessas pessoas.

Pensando nisso, um grupo de pesquisadores ingleses publicou recentemente um artigo ampliando o leque de definições, que antes era restrito ao ventrículo direito. Em outras palavras, estudos já comprovaram que existem alterações genéticas que definem não só a conhecida Cardiomiopatia Arritmogênica do Ventrículo Direito (CAVD), mas também uma série de fenótipos relacionados ao ventrículo esquerdo, como cicatrizes não isquêmicas do miocárdio gerando arritmias e a cardiomiopatia dilatada arritmogênica do ventrículo esquerdo.

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Como investigar a cardiomiopatia arritmogênica?

A proposta do artigo é que investiguemos ativamente todos os pacientes com extrassístoles ventriculares monomórficas muito frequentes em mais de um holter ou monitor de eventos, associadas a taquicardia ventricular (TV) não sustentada ou sustentada sem causa conhecida. Atenção especial é recomendada quando se tem associado aos achados acima, uma ou mais das seguintes características:

  • História familiar de miocardiopatia arritmogênica, portadores de cardio-desfibrilador implantável (CDI) na família ou história familiar de morte súbita antes dos 50 anos (60% dos casos de CA são geneticamente codificados);
  • Pacientes recuperados de parada cardíaca sem causa conhecida;
  • Exames de imagem demonstrando cicatrizes miocárdicas em ambos ventrículos associadas ou não a disfunção sistólica sem causa conhecida;
  • Alterações de pele, cabelo e/ou de músculo esquelético ou ainda diagnóstico prévio pessoal ou familiar de síndromes genéticas como a doença de Naxos e a sua variante Síndrome de Carvajal (figura 1).
Cardiomiopatia Arritmogênica
Figura 1 – Cabelo tipo “lanugem” e ceratodermia estriada palmo-plantar, presentes na doença de Naxos e na Síndrome de Carvajal.

Do ponto de vista eletrocardiográfico, a CAVD tipicamente apresenta uma TV com morfologia de bloqueio de ramo esquerdo (BRE) com eixo cardíaco nos quadrantes superiores. Mas outras morfologias também podem acontecer nas CA, mormente em casos atípicos ou cicatriciais com morfologia de BRE com eixo nos quadrantes inferiores ou até mesmo com morfologia de bloqueio de ramo direito.

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Outros achados eletrocardiográficos como inversão de onda T de V1 a V3-4, onda épsilon e atraso final de condução intraventricular (>55ms) chamam a atenção para a possibilidade de CA. A monitorização e investigação pormenorizada das alterações elétricas são importantes pois normalmente essas últimas precedem a disfunção ventricular. Ademais, essas doenças podem se manifestar com morte súbita antes mesmo de qualquer sinal de disfunção.

Em relação aos exames de imagem, é sempre importante a investigação complementar com a ressonância magnética cardíaca. Como a CA é um diagnóstico de exclusão, podemos com esse método avaliar possíveis causas ainda não esclarecidas, além de quantificar fibrose, adiposidade e grau de disfunção do miocárdio de VD e VE. Mesmo não sendo um consenso para tipos mais raros de CA, de posse de todos esses parâmetros, deve-se aplicar os critérios maiores e menores para definição ou exclusão de casos suspeitos de CAVD e para estratificação de risco de morte súbita.

Tratamento

Antes de mais nada, esse paciente deve ser encorajado a não mais praticar atividade física de forma profissional ou amadora, de moderada ou alta intensidade. Além disso, os familiares devem ser investigados com pelo menos um eletrocardiograma.

O tratamento medicamentoso engloba a associação de antiarrítmicos, geralmente amiodarona, com um betabloqueador cardiosseletivo. A ablação é possível e tem mais sucesso em alguns padrões de TV, mas ainda apresenta alta taxa de recorrência. O transplante cardíaco pode ser um tratamento definitivo se preenchidos os critérios, mas reservado à casos intratáveis clínica ou invasivamente.

A profilaxia de morte súbita com CDI deve ser empregada sempre em pacientes com CA confirmada e com risco intermediário ou alto, segundo os critérios já consagrados para pacientes com CAVD, relatados acima.

Conclusão

Doenças com as CAs devem ser corretamente manejadas pois tem elevado risco de morte súbita e os tratamentos disponíveis podem melhorar a qualidade e a expectativa de vida desses pacientes.

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Referências:

  • Protonotarios A, Elliott PM. Heart 2019. doi:10.1136/ heartjnl-2017-311160
  • Protonotarios N, Tsatsopoulou A. Cardiovascular Pathology 13 (2004) 185–194
  • Pinto YM, Elliott PM, Arbustini E, et al. Proposal for a revised definition of dilated cardiomyopathy, hypokinetic non-dilated cardiomyopathy, and its implications for clinical practice: a position statement of the ESC working group on myocardial and pericardial diseases. Eur Heart J 2016;37:1850–8.

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