A trombose do sistema mesentérico/portal e também a síndrome de Budd-Chiari podem ser designadas como trombose esplâncnica (TE) que, apesar de infrequente (quando comparada a outros tipos de trombose), está associada a uma alta mortalidade.
Devido à raridade de eventos, não existem grandes séries com forte evidência de forma a orientar um tratamento uniforme nas diferentes apresentações. Este trabalho publicado tenta organizar condutas e utiliza o termo “recomenda” quando ocorre uma forte e concordância entre os especialistas e o termo “sugere” quando ainda há alguma divergência.
Diversos fatores estão associados à TE, sendo que as condições crônicas, como a cirrose, os tumores sólidos e as doenças mieloproliferativas, são os três principais fatores de risco e, também, estão associados a mais mortalidades.
Avaliação do tratamento de trombose esplâncnica
A anticoagulação é a base do tratamento da TE. Pacientes que são submetidos à terapia de anticoagulação apresentam menos complicações e maiores taxas de recanalização quando comparado com aqueles sem tratamento. No entanto, muitos desses pacientes desenvolvem ou possuem hipertensão portal, com variz esofagogástrica, e o início da anticoagulação poderia desencadear um evento hemorrágico.
Assim, nos casos de suspeita, a realização de endoscopia digestiva alta com ligadura de variz e início de betabloqueadores para profilaxia de sangramento permitem que o risco de sangramento desse tipo de paciente torne-se semelhante àquele sem variz. O ideal é começar a anticoagulação até duas semanas após o diagnóstico de trombose.
É importante salientar que a TE também pode estar associada a uma isquemia enteromesentérica. Nos casos de suspeita de isquemia é fundamental uma avaliação multidisciplinar, visto que um retardo no tratamento pode ter consequências catastróficas.
Infelizmente o diagnóstico de isquemia mesentérica é desafiador e quanto mais precoce for o diagnóstico maiores as chances de uma boa resposta do paciente. O uso da laparoscopia diagnóstica pode ser bastante útil nos casos de dúvida.
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Trombose aguda
A trombose aguda é definida quando não há sinais de degeneração cavernomatosa da porta ou circulação colateral portossistêmica, sendo a anticoagulação a modalidade terapêutica de escolha. O uso de trombolíticos sistêmicos ou diretamente posicionados por cateter obtiveram resultados promissores, porém apenas em pequenas séries e em centros especializados.
Diversas formas de anticoagulação podem ser prescritas, sendo a heparina de baixo peso molecular a mais largamente aceita e utilizada, mas em situações de plaquetopenia a mesma poderá ser substituída.
Infelizmente tanto os antagonistas da vitamina K quanto os novos anticoagulantes orais podem ser deletérios em pacientes com função hepática comprometida. Associado a isto, alguns trabalhos evidenciaram que o uso de edoxaban e rivaroxaban em pacientes com neoplasia gastrointestinal apresentavam maior risco de sangramento quando comparado a pacientes em uso de heparina de baixo peso molecular.
Também existe bastante controvérsia sobre a duração da terapia, sendo que a maioria dos estudos orientam a duração de, pelo menos, seis meses e alguns subgrupos de pacientes necessitam de terapias ainda mais longas.
Trombose crônica
Este grupo de paciente caracteriza-se por uma ampla circulação colateral do sistema porta e/ou degeneração cavernomatosa da porta. O uso de terapias anticoagulantes nesse tipo de paciente não é bem definido, devendo ser individualizado caso a caso.
Síndrome de Budd-Chiari
É a forma menos frequente de TE e pode afetar desde as pequenas vênulas até a veia cava inferior. A realização de endoscopia digestiva alta é necessária em todos os pacientes e o tratamento normalmente utiliza tanto a anticoagulação como procedimentos invasivos, que variam desde uma trombólise, angioplastia até o transplante hepático.
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Para levar para casa…
Pacientes com TE são complexos e necessitam de diversas modalidades terapêuticas, apesar da anticoagulação ser a base da terapia. De forma geral, a TE é consequência de uma condição crônica a qual também deve ser tratada.
Referência bibliográfica:
- Di Nisio M, et al. Anticoagulant therapy for splanchnic vein thrombosis: ISTH SSC Subcommittee Control of Anticoagulation. J Thromb Haemost 2020 Jul; 18:1562 (https://doi.org/10.1111/jth.14836).