Como avaliar o paciente com queixa de inchaço e distensão abdominal?

Inchaço e distensão abdominal são queixas frequentes no consultório. Neste post, Fernanda Azevedo dá dicas de como fazer o diagnóstico.

As queixas de inchaço (bloating) e distensão abdominal são cada vez mais relatadas pelos pacientes. Recentemente, o periódico American Journal of Gastroenterology publicou um artigo de cunho prático elucidando como essas queixas devem ser abordadas e tratadas.

Inchaço é um sintoma, ou seja, a percepção de aumento de gases abdominais, enquanto a distensão abdominal é um sinal, e pode ser avaliada no exame físico, através do aumento objetivo da circunferência abdominal.

Leia também: Refluxo laringofaríngeo refratário pode estar relacionado a ansiedade e/ou depressão? 

No geral, essas alterações predominam em pacientes com constipação crônica, do sexo feminino, sendo causa frequente de encaminhamento ao gastroenterologista.

Pode ocorrer devido a aumento da tensão da parede intestinal pelo gás luminal, aumento da percepção da tensão da parede intestinal ou reflexo viscerossomático anormal.

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Causas e diagnóstico

Na prática, podemos dividir as causas de bloating e distensão em cinco grandes grupos: relacionados a alimentos fermentáveis, constipação intestinal, supercrescimento bacteriano do intestino delgado (SIBO), hipersensibilidade visceral e reflexo viscerossomático anormal.

Na prática, foi proposto um algoritmo diagnóstico envolvendo cinco perguntas.

  1. O paciente apresenta sinais de alarme?
    Anemia, perda inexplicada de peso, aumento das enzimas hepáticas, hematoquezia, náuseas e vômitos persistentes, história familiar de câncer do trato gastrointestinal ou ginecológico, doença inflamatória intestinal e/ou doença celíaca.
    Nesses casos, o paciente deve ser submetido a investigação adequada, incluindo exames endoscópicos e de imagem.
    No geral, os pacientes com doenças orgânicas apresentam um início recente dos sintomas associado a sinais de alarme em comparação aos pacientes com doenças funcionais, que apresentam uma história arrastada.
  2. Os sintomas estão relacionados a fatores na dieta?
    Existem grupos de alimentos fermentáveis, principalmente quando há intolerância alimentar: lactose, frutose, rafinoses e polióis.
    O paciente pode ser testado para intolerâncias, sendo as mais comuns à lactose e à frutose. Deve receber também orientações nutricionais a fim de evitar alimentos ricos em FODMAPs.
  3. O paciente apresenta história de constipação intestinal?
    Se não identificamos associação com fatores na dieta, devemos nos questionar se a constipação intestinal é o motivo desses sintomas.
    15% da população apresenta constipação crônica idiopática. Além disso, o paciente também pode se apresentar com SII do subtipo constipação, constipação com trânsito normal ou lento e disfunção de assoalho pélvico. Todas essas formas podem estar associadas a bloating e distensão abdominal.
    Pacientes com disfunção do assoalho pélvico, por exemplo, podem ter dificuldade em eliminar flatos, o que agrava essas queixas.
    Esses pacientes se beneficiam de medicações secretagogas (ex: lubiprostona) e procinéticas (ex: prucaloprida).
  4. Existe fator de risco para SIBO? 
    Pacientes com bloating e distensão abdominal, devem ser submetidos à avaliação com teste respiratório para pesquisa de SIBO.
    Situações que comprometam os mecanismos protetores da microbiota intestinal são fatores de risco para SIBO, tais como:
    – aumento do pH gástrico: acloridria, gastrite atrófica, uso crônico de IBP;
    – alterações da motilidade do TGI: SII, doenças do colágeno, gastroparesia diabética;
    – alterações da integridade do trato GI: cirurgias com alças cegas (ex. bariátrica), divertículos de intestino delgado, estenoses e fístulas pela doença de Crohn;
    – redução dos mecanismos de imunidade: Imunodeficiência comum variável, deficiência de IgA, doença celíaca, AIDS, diabetes descompensado, cirrose hepática;
    – redução das enzimas pancreáticas: pancreatite crônica, insuficiência pancreática exócrina.
    Os substratos para o teste respiratório podem ser glicose ou lactulose e um aumento do H2 expirado em 20 ppm do valor basal em 90 minutos ou do metano expirado em 10 ppm do valor basal em qualquer momento indicam SIBO.
    Nesses casos, o paciente deve receber tratamento com antibióticos durante 7 a 10 dias, sendo a rifaximina a primeira escolha, visto sua ação local e menor toxicidade.
  5. Os sintomas são relacionados à hipersensibilidade visceral? 
    Quando excluídas as alterações supracitadas, deve-se questionar se os sintomas estão relacionados ao aumento de percepção sensorial da distensão pelo paciente. Esses pacientes têm alterações no eixo cérebro-intestino, beneficiando-se de neuromodulação.
    Ao abordar esses pacientes, devemos evitar falar sobre medicações ansiolíticas ou antidepressivas, pois isso pode reduzir a adesão ao tratamento. Nesses pacientes, geralmente as doses necessárias para neuromodulação são inferiores às doses para tratar depressão e/ou ansiedade.
  6. Os sintomas são relacionados a um reflexo abdominovisceral anormal? 
    Caso o paciente não responda às medidas anteriores, deve-se pensar numa resposta anormal do diafragma e músculos da parede abdominal ao aumento luminal de conteúdo gasoso. Normalmente, o diafragma relaxa (sobe) e a musculatura abdominal contrai, fazendo que o aumento gasoso não cause distensão abdominal. Nesses pacientes, o reflexo está alterado e o diafragma contrai (desce) e a musculatura abdominal relaxa, fazendo com que o aumento do conteúdo gasoso leve a aumento da circunferência abdominal e distensão.
    Esses casos têm difícil tratamento, e deve-se explicar ao paciente que se trata de uma condição benigna. Existem relatos de melhora com tratamento com biofeedback.

Mensagens práticas

Apesar de muito frequente na prática médica, muitas vezes nos deparamos com pacientes com queixas crônicas de bloating e distensão abdominal. Esses pacientes frequentemente já estiveram em vários especialistas e foram submetidos a investigação, porém muitas vezes mantêm as queixas e se preocupam com elas. Na ausência de sinais de alarme, devemos primeiramente acolher esses pacientes e tranquilizá-los.

Seguir um algoritmo diagnóstico auxilia na condução desses casos.

Adaptação do algoritmo proposto na referência

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Lacy BE, Cangemi DJ. A Pragmatic Approach to the Evaluation and Treatment of Abdominal Bloating. Am J Gastroenterol. 2022;117(5):701-705. doi:10.14309/ajg.0000000000001665

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