Conheça nova diretriz para manejo de infecções do vírus da influenza

Com potencial para causar epidemias, o vírus Influenza, ou gripe, é uma grande causa de mortalidade no mundo. Veja novas orientações para manejo da doença.

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Com potencial para causar epidemias e mesmo pandemias, a infecção pelo vírus Influenza – a famosa gripe – é uma grande causa de morbimortalidade no mundo. Estudos estimam que entre 291.243 a 645.832 mortes por causas respiratórias associadas às epidemias sazonais de Influenza ocorram anualmente em todo o mundo. Recentemente, a Infectious Diseases Society of America (IDSA) atualizou seu guideline sobre essa infecção, lançando novas recomendações em relação ao seu diagnóstico, manejo e prevenção.

Influenza-Gripe

Quando suspeitar?

A infecção pelo vírus Influenza pode variar desde uma infecção assintomática, à presença de sintomas inespecíficos ou ao desenvolvimento de doença grave e morte. Os sinais e sintomas variam de acordo com a idade, presença de comorbidades e status imunológico do hospedeiro. O vínculo epidemiológico também é importante, devendo aumentar a suspeição do médico assistente em relação a esse diagnóstico nas épocas do ano em que há maior circulação do vírus (outono e inverno) e em casos de surtos.

Em adultos saudáveis, a apresentação típica é de início abrupto de febre com tosse. Um estudo tailandês verificou que, durante as épocas de maior circulação do vírus, a combinação de febre e tosse foram os sinais e sintomas com maior sensibilidade para o diagnóstico de Influenza, enquanto febre, tosse e espirros foram os com maior especificidade.

Em extremos de idade, os sintomas podem ser ainda mais inespecíficos ou atípicos. Lactentes e crianças podem se apresentar com febre alta ou isolada, congestão nasal, rinorreia ou diarreia. Crianças mais velhas podem apresentar dor abdominal, enquanto adultos podem ter vômitos e, em idosos, a febre pode estar ausente.

Sinais e sintomas de infecção não complicada por Influenza

Gerais: febre, calafrios, astenia, fadiga

Otorrinolaringológicos: cefaleia, congestão nasal, rinorreia, rouquidão

Neuromusculares: mialgia, artralgia, fraqueza, dor torácica

Gastrointestinais: dor abdominal, vômitos, diarreia

Pulmonares: tosse não produtiva, dor pleurítica

Grupos de risco e complicações

Na maior parte dos casos, indivíduos acometidos por infecção não complicada por influenza recuperam-se sem maiores consequências. Entretanto, complicações graves podem ocorrer, incluindo comprometimento de outros sistemas que não o respiratório. Miocardite, miosite, encefalite, choque hipovolêmico e exacerbação de doenças crônicas, como DPOC, asma, coronariopatia ou insuficiência cardíaca, estão associados com quadros gripais causados pelo vírus H1N1. Estudos, como o publicado por Kwong et. al na New England Journal of Medicine em janeiro de 2018, mostram que a infecção pode servir como gatilho para infarto do miocárdio.

Crianças menores de cinco anos (e principalmente as com menos de dois anos), pessoas com 65 anos ou mais, imunocomprometidos, gestantes e puérperas, obesos mórbidos e portadores de doenças crônicas estão entre os grupos de risco para desenvolvimento de complicações e morte. Os idosos são o grupo de maior mortalidade, e imunocomprometidos, especialmente receptores de transplante de células hematopoiéticas, são considerados de risco muito alto para o desenvolvimento de complicações.

Pessoas sob maior risco de complicações associadas a Influenza

Crianças com menos de 5 anos, principalmente as com menos de 2 anos

Idosos com 65 anos ou mais

Portadores de doenças crônicas pulmonares, cardiovasculares, renais, hepáticas, hematológicas, endocrinometabólicas ou neurológicas, incluindo asma, anemia falciforme, DM, desordens do desenvolvimento, epilepsia, entre outras

Pessoas imunocomprometidas, incluindo as infectadas pelo vírus HIV ou medicações

Mulheres gestantes ou puérperas nas primeiras 2 semanas pós-parto

Crianças e adolescentes até 18 anos que estejam em uso de AAS ou outros compostos com salicilatos e que podem estar sob risco de desenvolvimento de síndrome de Reye

Indígenas

Obesos mórbidos (IMC ≥ 40)

Moradores de unidades de cuidados crônicos de saúde, como casas geriátricas

Como diagnosticar?

Na maior parte dos casos, especialmente em épocas de epidemia, o diagnóstico de infecção por influenza é predominantemente clínico. Entretanto, existem métodos complementares que, se disponíveis, podem auxiliar no diagnóstico e tratamento precoces, gerando, por consequência, redução de hospitalização e redução no uso de antibióticos de forma inadequada.

O guideline recomenda que, em épocas de maior circulação de influenza, sejam testados os pacientes de alto risco para complicações, os que se apresentam com sintomas respiratórios e exacerbação de doenças crônicas ou com quadros que possam ser devido a complicações do vírus e todos os que necessitarem de hospitalização.

A recomendação é que as amostras clínicas sejam coletadas o mais precocemente possível, idealmente nos primeiros quatro dias de sintomas. Para aumentar a sensibilidade, amostras da nasofaringe são a preferência. Outras opções são o uso combinado de swabs nasal e de orofaringe ou swab nasal a nível de corneto médio. Em pacientes necessitando de ventilação mecânica, recomenda-se aspirado endotraqueal ou lavado broncoalveolar, mesmo que testes de amostras do trato respiratório superior tenham sido negativas.

Em relação aos testes utilizados, a recomendação é preferencialmente usar testes moleculares, idealmente RT-PCR. Painéis de RT-PCR multiplex são a recomendação principal para pacientes imunocomprometidos, uma vez que podem detectar a presença de outros vírus respiratórios e mesmo algumas bactérias. Testes sorológicos não são recomendados.

Quem e como tratar?

Tratamento antiviral está recomendado para adultos e crianças com casos confirmados ou com suspeitas para influenza, independente da história vacinal, nos seguintes casos:

  • necessidade de internação hospitalar;
  • pacientes ambulatoriais com doença grave ou progressiva;
  • pacientes ambulatoriais de alto risco, como os com comorbidades ou imunocomprometidos;
  • os com menos de dois anos ou com 65 anos ou mais;
  • gestantes e puérperas nas primeiras 2 semanas pós-parto.

Para pacientes que não estão sob maior risco de complicações, pode-se considerar tratamento nos que se apresentam em até 48h do início dos sintomas, nos que são contatos domiciliares de pessoas consideradas de alto risco de complicações e em trabalhadores da área de saúde que cuidem de pacientes de alto risco. Entretanto, o nível de evidência de benefício do tratamento nesses casos é menor.

Quando indicado, o tratamento deve ser feito com um inibidor de neuroaminidase. No Brasil, a opção disponível é o oseltamivir, cuja dose terapêutica é de 75 mg, 12/12h. O tempo de tratamento é de cinco dias, podendo ser estendido em alguns casos – como em pacientes imunocomprometidos – ou com doença grave do trato respiratório inferior – como os que desenvolvem SARA ou pneumonia. O uso de corticoides ou imunomoduladores como adjuvantes não está recomendado.

Leia mais: Novo fármaco mostra-se eficaz contra vírus e sintomas da Influenza

Pacientes que não respondem ao tratamento devem ser investigados para outras causas, principalmente infecções bacterianas concomitantes. Nos que se apresentam com doença grave inicial (pneumonia extensa, insuficiência respiratória, hipotensão e febre) e nos que pioram após melhora inicial, tratamento empírico para infecção bacteriana está recomendado. Streptococcus pneumoniae é o agente bacteriano mais frequentemente envolvido em coinfecções ou infecções secundárias, mas Staphylococcus aureus e Streptococcus pyogenes também já foram identificados. Assim, o tratamento empírico de casos graves deve incluir antibióticos com cobertura para esses agentes, incluindo MRSA.

Medidas preventivas

O melhor método de prevenção é a vacinação anual. Entretanto, a eficácia da vacina é variável, dependendo da idade, status imunológico do paciente e correspondência entre as cepas de vírus circulantes na comunidade e as cepas vacinais. Com isso, em algumas situações restritas, a profilaxia pré ou pós-exposição com oseltamavir pode ser utilizada.

A recomendação principal de profilaxia pré-exposição é para prevenção de surtos intra-hospitalares ou outras unidades de cuidados de saúde com populações de risco, como casas geriátricas. Para casos comunitários, profilaxia pode ser considerada em adultos e crianças a partir de três meses de idade nos seguintes casos:

  • os que estão sob alto risco de complicações e que, por algum motivo, não poderão ser vacinados contra Influenza ou quando se espera que a vacina tenha baixa eficácia, como pacientes gravemente imunocomprometidos
  • os que têm o maior risco de desenvolvimento de complicações, como receptores de transplante de células hematopoiéticas nos primeiros seis a 12 meses pós-transplante ou receptores de transplante de pulmão
  • nos que não foram vacinados e que são contatos de indivíduos em alto risco de desenvolvimento de complicações quando tais indivíduos não podem ser vacinados e não podem tomar profilaxia
  • de forma conjunta com vacinação nos que apresentam alto risco de complicações, mas que ainda não foram vacinados, quando circulação viral for detectada na comunidade de forma significativa. Nesses casos, a profilaxia tem duração menor do que nas outras situações

A dose profilática é menor do que a terapêutica – 75 mg, 1x/dia – e a profilaxia deve ser feita durante todo o período em que houver circulação do vírus. Pacientes que estejam sob profilaxia e que desenvolvam sintomas respiratórios devem ser testados para H1N1 e ter a dose de oseltamivir ajustada para dose terapêutica.

Nos casos de exposição ao vírus por parte de pacientes não vacinados de risco muito alto assintomáticos ou indivíduos não vacinados que são contatos de pacientes nessa situação, pode-se considerar profilaxia pós-exposição. Nesses casos, o uso de oseltamivir está indicado somente se iniciado nas primeiras 48 h após a exposição e durante os sete dias seguintes.

É importante destacar que as evidências do uso profilático de antivirais para prevenir o desenvolvimento de infecção sintomática pelo vírus Influenza são limitadas. Estudos mostram reduções modestas no risco absoluto e um número necessário para tratar (NNT) elevado. Assim, pacientes em uso de profilaxia pré ou pós-exposição devem ser monitorados rigorosamente para o desenvolvimento de sintomas.

Considerações adicionais:

  • Além do risco de complicações e de morte, a gripe também tem um grande impacto econômico, sendo uma das maiores causas infecciosas de absenteísmo de atividades laborativas.
  • Idosos podem se apresentar sem febre e com sintomas mais brandos de Influenza, mas – mais comumente do que pacientes jovens – apresentam alteração do estado mental. Pacientes imunocomprometidos também frequentemente não apresentam sintomas típicos de Influenza.
  • A dose de oseltamivir deve ser ajustada de acordo com a função renal e com a idade.
  • Ao atender pacientes com sintomas gripais fora dos períodos de risco, importante questionar sobre viagens recentes em que possa ter ocorrido exposição ao vírus Influenza.
  • Pacientes internados com suspeita ou com infecção confirmada por Influenza devem ser mantidos em quarto privativo e em precaução respiratória por gotículas durante todo o período de tratamento. Durante a realização de procedimentos que gerem aerossóis, incluindo intubação, medidas de precaução correspondentes devem ser realizadas, incluindo o uso de máscaras N-95.

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Referências:

  • Uyeki, TM, Bernstein, HH, Bradley, JS, Englund, JA, File Jr., TM, Fry, AM, Gravenstein, S, Hayden, FG, Harper, SA, Hirshon, JM, Ison, MG, Johnston, BL, Knight, S, McGerr, A, Riley, LE, Wolfe, CR, Alexander, PE, Pavia, AT. Clinical Practice Guidelines by the Infectious DIseases Society of America: 2018 Update on Diagnosis, Treatment, Chemoprophylaxis, and Institutional Outbreak Management of Seasonal Influenza. Clinical Infectious Diseases. Dec 2018
  • Kwong, JC, Schwartz, KL, Campitelli, MA, Chung, H, Crowcroft, NS, Karnauchow, T, Katz, K, Ko, DT, McGeer, AJ, McNally, D, Richardson, DC, Rosella, LC, Simor, A, Smieja, M, Zahariadis, G, Gubbay, JB. Acute Myocardial Infarction after laboratory-Confirmed Influenza Infection. The New England Journal of Medicine 378; 4. Jan 2018
  • Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Protocolo de tratamento de Influenza: 2017 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. – Brasília: Ministério da Saúde, 2018. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_tratamento_influenza_2017

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