Conheça os cuidados ao se prescrever emla® em pediatria

O EMLA® é uma mistura de lidocaína e prilocaína em creme e deve ser usado com cuidado em circuncisões, pois pode provocar hiperemia e lesões bolhosas.

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Os anestésicos tópicos podem ser usados no manejo da dor aguda em pediatria, e seu principal efeito é a obtenção de anestesia local sem efeitos sistêmicos. Uma grande limitação à utilização é a necessidade de se esperar um tempo de contato do anestésico com a pele para que haja absorção. Por isso, este método de analgesia deve ser aplicado somente em procedimentos eletivos¹. O EMLA® é uma mistura eutética de 2,5% de lidocaína e 2,5% de prilocaína em creme.

O fármaco é aplicado na pele e depois coberto com um curativo oclusivo por 60 a 90 minutos, proporcionando anestesia local por, no mínimo, duas horas após a remoção. É usado para minimizar a dor antes de procedimentos percutâneos, como punções venosas e arteriais2,3,4. Alguns autores sugerem que o pré-tratamento com creme lidocaína/prilocaína sobre o hiato sacral antes do bloqueio caudal tenha vantagens significativas em aliviar a dor do procedimento em crianças5.

O medicamento deve ser usado com muito cuidado em circuncisões, pois pode provocar hiperemia e lesões bolhosas no pênis. Por isso, uma pequena área cutânea deve ser testada antes de um uso mais amplo da lidocaína/prilocaína. O EMLA® deve ser aplicado em pele íntegra6.

A lidocaína/prilocaína não é recomendadya para uso em bebês prematuros ou naqueles com menos de 12 meses de idade ou que estejam recebendo drogas indutoras de meta-hemoglobinas como, por exemplo, a fenitoína, pois a o-toluidina, uma amina metabólita da prilocaína, pode induzir meta-hemoglobinemia2,4. Cianose resistente ao tratamento com oxigênio e uma diferença entre as leituras de amostragem arterial e oximetria de pulso podem ser pistas diagnósticas7.

Em 2016, Kuiper-Prins et al. divulgaram o caso de um menino de 12 dias com meta-hemoglobinemia após circuncisão com anestesia local com infiltração de lidocaína (6 mL a 1%) e creme tópico EMLA® (2,5% lidocaína/2,5% prilocaína). O paciente não tinha problemas respiratórios, mas uma pele notavelmente escura e meta-hemoglobina elevada de 49,8% (normal: < 1,5%). O paciente foi tratado com administração de oxigênio, mas a concentração de meta-hemoglobina ainda era elevada (45%), mesmo após uma hora. Após a administração de duas doses de azul de metileno por via intravenosa (total de 0,7 mg/kg), a concentração de meta-hemoglobina diminuiu para 3,3% e normalizou para 1,3% no dia seguinte.

Leia mais: Lidocaína: pesquisadores testam novo método para diminuição da dor

Portanto, meta-hemoglobinemia grave pode ser observada após o uso de lidocaína/prilocaína local para a circuncisão, especialmente em recém-nascidos8. Outro caso interessante foi publicado por Larson et al. em 2013. Os autores relataram o caso de um lactente com malformações vasculares extensas tratada com creme EMLA® em excesso e que desenvolveu não somente meta-hemoglobinemia, mas também convulsões9.

Recente metanálise foi publicada na revista americana Pediatrics com o objetivo de determinar a eficácia e segurança da lidocaína/prilocaína em crianças com menos de três meses de idade que necessitam de punção venosa em comparação com intervenções não farmacológicas em termos de redução da dor. Neste estudo, foram selecionados ensaios clínicos randomizados em que os pesquisadores compararam o EMLA® com intervenções não farmacológicas.

Foram incluídos 10 ensaios clínicos randomizados, totalizando 907 lactentes. Os autores concluíram que o EMLA® possui benefícios mínimos em termos de redução da dor por punção venosa em comparação com placebo e nenhum benefício em comparação com a sacarose e/ou amamentação. Além disso, o fármaco produziu uma elevação nos níveis de meta-hemoglobina e branqueamento da pele. Estes resultados, no entanto, não são aplicáveis em crianças com mais de três meses de idade10.

Um estudo publicado em 2011 comparou três diferentes técnicas de aplicação do EMLA® em creme. A técnica padrão A (TA) consistiu na aplicação de penso adesivo impermeável que acompanha o produto. A técnica B (TB) consistiu na aplicação de pequeno quadrado de plástico não adesivo por cima do creme e proteção com adesivo de tecido perfurado. Já a técnica C (TC) baseou-se na aplicação de uma base de tetina no interior da qual se colocou o creme tapado com um pequeno quadrado de plástico não adesivo, e envolvido com três voltas de ligadura elástica.

Neste estudo, os autores relatam que o tempo requerido para a execução das técnicas foi semelhante, demorando cerca de dois a três minutos em média. Para a remoção do penso, nenhum produto foi utilizado na TA, mas foi usado álcool na TB. Os autores excluíram crianças cujo tempo de aplicação do creme não se enquadrou no intervalo entre os 60 e os 90 minutos antes da punção venosa. A TC mostrou-se indolor. A TA foi a mais dolorosa.

Os pacientes, pais e os profissionais de enfermagem foram unânimes quanto à predileção pela TC. No entanto, os autores nomeiam o artigo como “Dor para não ter dor” e sugerem a futuros estudos para verificar a efetividade do uso de álcool ou água na remoção de adesivos e a associação entre a idade da criança e a autoavaliação da dor, tanto na remoção do penso quanto em punções venosas11.

Concluímos que o EMLA® em creme deve ser visto como qualquer outro medicamento, isto é, as doses não devem exceder as recomendadas e deve ser utilizado com cautela7. Em pediatria, muitos serviços têm substituído o uso deste fármaco por creme de lidocaína 5%2,4.

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Referências:

  1. Araujo, C. M., Oliveira, B. M., & Silva, Y. P. (2012). Avaliação e tratamento da dor em oncologia pediátrica. Revista Médica de Minas Gerais, 22 (Suppl 7), S22-31.
  2. Scott-Warren, V. L., & Morley, R. B. (2015). Paediatric vascular access. BJA Education, 15(4), 199-206.
  3. Stoltz, P., & Manworren, R. C. B. (2017). Comparison of Children’s Venipuncture Fear and Pain: Randomized Controlled Trial of EMLA® and J-Tip Needleless Injection System®. Journal of Pediatric Nursing, 37, 91-96.
  4. Zeltzer, R, L. N.; Krane, E. J., & Palermo, T. M. (2017). Tratamento da Dor em Pediatria. In: Kliegman, R., Stanton, B. M. D., St Geme, J., Chor, N. F., & Behrman, R. E. Nelson Tratado de Pediatria. Tradução da 20ª edição. Recuperado de: https://www.evolution.com.br/product/nelson-tratado-de-pediatria-20ed.
  5. Choi, E. K., Ro, Y., Park, S. S., & Park, K. B. (2016). The use of EMLA cream reduces the pain of skin puncture associated with caudal block in children. Korean journal of anesthesiology, 69 (2), 149-54.
  6. Silva Junior, C. A (2008). Analgesia pós-operatória em crianças. In: Manica, J. e colaboradores. Anestesiologia: Princípios e técnicas, 3ª edição, Capítulo 78, 1271-1276. Porto Alegre: Artmed.
  7. Shamriz, O., Cohen-Glickman, I., Reif, S., & Shteyer, E. (2016). Methemoglobinemia Induced by Lidocaine-Prilocaine Cream. Israel Medical Association Journal, 16, 250-254.
  8. Kuiper-Prins, E., Kerkhof, G. F., Reijnen, C. G., & van Dijken, P. J. (2016). A 12-Day-Old Boy with Methemoglobinemia After Circumcision with Local Anesthesia (Lidocaine/Prilocaine). Drug safety – case reports, 3(1), 12.
  9. Larson, A., Stidham, T., Banerji, S., & Kaufman, J. (2013). Seizures and methemoglobinemia in an infant after excessive EMLA application. Pediatric Emergency Care, 29(3), 377-379.
  10. Shahid, S., Florez, I. D., & Mbuagbaw L. (2019). Efficacy and Safety of EMLA Cream for Pain Control Due to Venipuncture in Infants: A Meta-analysis. Pediatrics, 143(1), e20181173.
  11. Batalha, L. M. C., Carreira, M. C. G., & Correia, M. M. M., (2011). Dor para não ter dor: aplicação de anestésico tópico. Revista de Enfermagem Referência, III (5), 203-209.

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