Conheça os preditores de falência de ventilação não invasiva na pediatria

A ventilação não invasiva tem sido utilizada no tratamento da insuficiência respiratória aguda em crianças. Veja como identificar a falha do procedimento.

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A ventilação não invasiva (VNI) tem sido amplamente utilizada no tratamento da insuficiência respiratória aguda (IRA) em pacientes pediátricos. No entanto, estudos realizados em pacientes adultos mostram que a manutenção desta estratégia de ventilação em pacientes que não respondem ao tratamento aumenta o risco de complicações e a mortalidade. Para suprir a necessidade de identificação dos fatores preditivos de falha da VNI em pediatria, Pons-Odena e colaboradores recentemente publicaram o estudo de coorte prospectivo ¿Cuáles son los factores predictores de fracaso de ventilación no invasiva más fiables en una unidad de cuidados intensivos pediátricos?, realizado em uma UTIP de 14 leitos de um hospital universitário em Valência, Espanha.

O estudo, realizado de janeiro de 2005 a dezembro de 2009, utilizou uma amostra consecutiva de todos os pacientes de 0 a 18 anos com diagnóstico de IRA internados na UTIP participante e que receberam VNI como tratamento inicial.

A VNI foi iniciada em pacientes com critérios clínicos de IRA com alta probabilidade de intubação nas  seis horas seguintes. A decisão foi tomada pelo médico responsável quando o paciente apresentava um dos seguintes sinais clínicos:

  • frequência respiratória (FR) maior que dois desvios padrão da normalidade,
  • necessidade de fração de oxigênio inspirado (FiO2) maior que 0,5 para manter a saturação da hemoglobina maior que 94%
  • e dispneia progressiva em repouso.

A IRA foi classificada como tipo I (alteração da ventilação/perfusão sem hipoventilação alveolar) ou tipo II (alteração com hipoventilação alveolar).

Os critérios de exclusão incluíram a presença de qualquer contraindicação para o uso de VNI, como parada cardiorrespiratória, instabilidade hemodinâmica com necessidade de suporte inotrópico, arritmias graves, pontuação < 10 na escala de coma de Glasgow, trauma ou cirurgia facial, paralisia de cordas vocais, pneumotórax não drenado e hemorragia digestiva alta ativa. Pacientes intubados no momento da admissão ou ventilados por traqueostomia, assim como os pacientes que receberam VNI pós-intubação ou como cuidado paliativo foram excluídos.

A decisão de aplicar pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) ou dois níveis de pressão positiva na via aérea (BIPAP) foi tomada pelo médico responsável. O CPAP foi usado em pacientes com apneia e/ou desconforto respiratório leve, e o BIPAP foi utilizado em pacientes com desconforto respiratório moderado-grave, trabalho respiratório significativo (segundo ausculta e incursões torácicas), apesar do uso de CPAP, baixo volume inspiratório ou hipercapnia progressiva.

Os critérios de seleção para interface e ventilador foram:

  • 0 a 6 meses:

Dispositivo e interface utilizados para CPAP – Benveniste com tubo nasofaríngeo (TN) / CPAP Bolha (Fisher & Paykel®) com cânula nasal.

Dispositivo e interface utilizados para BIPAP – <1 m: Giulia (Ginevri®) com cânulas nasais; 0-3 m: Servo-i (Maquet®) com TN; > 3 m: BiPAP Vision (Philips®) com interface nasal como buconasal (Profile®).

  • >6 meses: Dispositivo e interface utilizados para CPAP – BiPAP Vision (Philips®) ou Carina (Dräger®) com interface nasal (Comfort Classic®) ou nasal como buconasal (Profile®).

Dispositivo e interface utilizados para BIPAP – BiPAP Vision (Philips®)  ou Carina (Dräger®) com interface buconasal (Performatrak®, HansRudolph 7500®, Mirage®), nasal (Comfort Classic®) ou nasal como buconasal (Profile®).

O dispositivo Benveniste (usado na UTIP do estudo em 64% dos pacientes de 0 a 6 meses) é uma adaptação artesanal de um selo de água conectada à interface (geralmente um TN) por um anel aberto que permite diminuir o trabalho respiratório do paciente na fase de exalação.

A estratégia de ventilação foi aplicada de acordo com o protocolo do Grupo Respiratório da Sociedade Espanhola de Terapia Intensiva Pediátrica. Para o modo CPAP, os parâmetros iniciais eram 4-5 cm H2O. Em pacientes em que não houve uma melhora do trabalho respiratório ou das apneias, o CPAP foi aumentado até 8 cm H2O. Para o modo BIPAP, utilizou-se pressão inspiratória positiva nas vias aéreas (IPAP) ou pressão inspiratória máxima de 6-8 cm H2O e pressão expiratória positiva em via aérea (EPAP) ou pressão positiva no final de expiração de 4 cm H2O. A IPAP foi ampliada em 2 cm H2O até 22 cm H2O quando foi detectado volume inspiratório inadequado, pouca melhora no trabalho respiratório ou hipercapnia. A EPAP foi aumentada para 8 cm H2O para melhorar o recrutamento e oxigenação alveolar. Nenhuma FiO2 máxima foi limitada.

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Na presença de qualquer sinal de falha do tratamento, a VNI foi removida e o paciente foi intubado e conectado à ventilação mecânica invasiva convencional. Os sinais considerados de falha foram: SpO2 <85% e pressão parcial de gás carbônico (pCO2) maior que 65 mmHg, apesar da aplicação de parâmetros máximos de VNI, aumento do trabalho respiratório, apneias ou o surgimento de critérios de exclusão. O desmame da VNI foi realizado de forma progressiva, diminuindo gradativamente a IPAP em 2 cm H2O e a EPAP em 1 cm H2O quando era observada uma diminuição na FR e no trabalho respiratório e com FiO2 inferior a 0,4. Uma sonda nasogástrica foi colocada para evitar a distensão gástrica e administrar a alimentação enteral.

Todos os pacientes foram monitorados continuamente em relação à frequência cardíaca (FC), FR e SpO2. As gasometrias eram colhidas apenas quando o médico responsável considerava necessário.

Quando as medidas não farmacológicas eram insuficientes para manter o paciente adaptado, os seguintes medicamentos foram usados como sedativos (sozinhos ou combinados): levomepromazina oral (1,0 mg/kg/dose), midazolam em infusão contínua (0,05-0,1 mg/kg/h) ou propofol (1-2 mg/kg/h) por menos de 24 horas.

A falha da VNI foi definida como a necessidade de intubação ou de resgate com BIPAP no grupo inicialmente tratado com CPAP. A relação saturação da hemoglobina/fração inspirada de oxigênio (S/F) foi calculada e utilizada retrospectivamente, para ser avaliada como preditor de falha da VNI. A relação S/F foi previamente calculada no início da VNI e às 2, 4, 8, 12 e 24 horas de tratamento com VNI, excluindo os valores de SpO2 superiores a 97%.

No total, 282 pacientes receberam VNI, com 71 recebendo CPAP e 211 com BIPAP. A taxa de sucesso global foi de 71%. Pacientes recebendo BIPAP versus CPAP, pacientes com maiores relações S/F a 2 horas (odds ratio [OR] 0,991, IC 95% 0,986-0,996, P = 0,001], e pacientes com mais de seis meses (Razão de risco [RR] 0,375 , IC 95% 0,171-0,820, P = 0,014], também foram mais propensos a falhar. Os pacientes com maiores FC às 2 horas (OR 1,021, 95% CI [1,008-1,034], P = 0,001) e maior pressão positiva inspiratória nas vias aéreas (IPAP) em 2 horas foram mais propensos a falhas (HZ 1,214, 95% CI [1,046-1,408], P = 0,011).

Uma menor relação S/F e o aumento da FC foram identificados como preditores independentes para falhas na VNI  2 horas após o início do tratamento, tanto na coorte geral quanto no grupo BIPAP, embora esse risco fosse mínimo. No grupo de pacientes que recebeu BIPAP em algum momento de sua evolução, foi ainda identificado que, quanto maior a IPAP 2 horas após o início do tratamento, e quanto menor a idade (principalmente em pacientes com menos de seis meses), maior é o risco necessidade de intubação traqueal.

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Referências:

  • Pons-Òdena M, et al. ¿Cuáles son los factores predictores de fracaso de ventilación no invasiva más fiables en una unidad de cuidados intensivos pediátricos? An Pediatr (Barc). 2019. https://doi.org/10.1016/j.anpedi.2019.01.013

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