Covid-19 em Pediatria: como os pacientes evoluíram em UTIs brasileiras?

Pesquisadores do Brasil realizaram estudo com o perfil, a evolução e o tratamento dos pacientes pediátricos com Covid-19 em UTIs Pediátricas.

Em agosto de 2020, um importante grupo de intensivistas pediátricos brasileiros, liderado por Arnaldo Prata Barbosa, publicou no Jornal de Pediatria um estudo prospectivo multicêntrico observacional com o perfil, a evolução e o tratamento dos pacientes pediátricos com Covid-19 internados em dezenove Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) Pediátricas (incluindo públicas e particulares) de março a maio de 2020. Neste artigo, destacaremos as principais contribuições geradas por esse estudo pioneiro na descrição dos casos pediátricos brasileiros de Covid-19.

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Paciente pediátrico espera atendimento durante a pandemia de Covid-19 com o risco de internação em UTI

Características e métodos

Esse estudo incluiu 79 pacientes de 1 mês a 19 anos de idade (média de idade 4 anos), 54% eram do sexo masculino, 58% eram brancos, 70% com apresentação de pneumonia ou bronquiolite e 12,6% com Síndrome Inflamatória Multissistêmica Inflamatória (MIS-C). Destaca-se que 41% tinham comorbidades prévias: doença neuromuscular (principalmente encefalopatia crônica não progressiva), pneumopatia, cardiopatia congênita, desnutrição e doença onco-hematológica. O artigo dividiu sua coorte em dois grupos de pacientes: com MIS-C e sem MIS-C.

O diagnóstico foi confirmado por reação em cadeia da polimerase via transcriptase reversa (RT-PCR) em 91% dos casos e os demais por sorologia. Houve detecção simultânea de outros em 15% dos pacientes (um caso de associação de parainfluenza com Bordetella pertussis, um caso de rinovírus humano e dois casos de vírus sincicial respiratório). Somente 40% tiveram com pessoa com suspeita de Covid-19.

Na admissão, os sinais e sintomas mais prevalentes foram os de acometimento sistêmico como febre (76%), prostração (24%) e recusa alimentar (21%), e os sintomas respiratórios como tosse (51%), taquipneia (50%), saturação periférica de oxigênio < 92% (29%), retração subcostal/intercostal/de fúrcula (23%), coriza (22%), batimento de asa de nariz (10%), gemência (9%), cianose (6%) e dor de garganta (4%). Os vômitos foram observados em 21% dos casos e hipotensão arterial só em 6% dos casos. É importante destacar que o grupo de pacientes com MIS-C teve sintomas mais graves na admissão.

Limitações

Uma limitação do estudo foi a ausência de padronização dos exames laboratoriais solicitados para os pacientes com exceção dos exames diagnósticos. Acreditamos que isso ocorreu provavelmente porque o acesso a determinados exames era diferente entre as UTIS, pois envolvia UTIs públicas e privadas. Além disso, as coletas de sangue em Pediatria são mais difíceis e devem ser restritas para evitar a espoliação de sangue. As alterações laboratoriais mais observadas foram linfopenia (36% no grupo sem MIS-C e 50% no grupo com MIS-C) e aumento de PCR, que é mais intenso no grupo com MIS-C. Pode ocorrer aumento de ferritina, troponina, creatinina fosfoquinase fração MB e procalcitonina, porém menos 20% dos pacientes tiveram marcadores de lesão miocárdica dosados.

Resultados

As principais alterações radiológicas encontradas foram: infiltrado intersticial difuso bilateral nas radiografias de tórax em ambos os grupos, derrame pleural predominante no grupo com MIS-C e opacidades em vidro fosco predominante no grupo sem MIS-C.

O tratamento da Covid-19 foi predominantemente de suporte, sendo que 76% receberam antibioticoterapia, 23% receberam corticoterapia e 43% receberam oseltamivir. O suporte ventilatório foi necessário em 65% dos casos, sendo que 6% precisaram de ventilação mecânica não invasiva e 18% de ventilação invasiva (VMI –n:14). Somente a presença de comorbidades foi associada ao risco de necessitar de ventilação mecânica invasiva. Para os pacientes em VMI, alguns necessitaram de posição prona intermitente (n=3), bloqueio neuromuscular (n=6) e manobra de recrutamento alveolar (n=4).

O tempo médio de internação em UTI foi cinco dias. A mortalidade foi de 3% envolvendo dois pacientes sem MIS-C, com comorbidades graves e uso crônico de corticoesteroide, uma adolescente de 14 anos com hepatopatia crônica e uma lactente de 1 ano com pneumopatia crônica e síndrome do intestino curto.

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Mensagem final

Esse importante estudo brasileiro de coorte mostra resultados semelhantes a coortes de outros países, entretanto teve letalidade mais baixa. É difícil observarmos estudos multicêntricos envolvendo diversas UTIs pediátricas aqui no Brasil e seus autores cumpriram esse desafio. O estudo contou com financiamento federal e estadual. É necessário maior investimento governamental para fomentar a pesquisa em nosso país e os estudos de coorte de longa duração para aumentar o conhecimento sobre a evolução da Covid-19 em Pediatria.

Referências bibliográficas:

  • Prata-Barbosa A, Lima-Setta F, Santos GR, Lanziotti VS, Castro VER, Souza DC, Raymundo CE, Oliveira FRC, Lima LFP, Tonial CT, Colleti Jr. J,  Bellinat APN, Lorenzo VB, Zeitel RS, Pulcheri L, Costa FCM, La Torre FPF, Figueiredo EAN, Silva TP, Riveiro PM, Mota ICF, Brandão IB, Azevedo ZMA, Gregory SC, Boedo FRO, Carvalho RN, Castro NAASR, Genu DHS, Foronda FAK, Ledo AJ, Magalhães-Barbosa MC. Pediatric patients with COVID-19 admitted to intensive care units in Brazil: a prospective multicenter study. Agosto de 2020: Jornal de Pediatria. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.07.002

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