Covid-19 pode ser considerada uma doença ocupacional?

O novo coronavírus vem gerando muitos debates no mundo jurídico e trabalhista, quando diz respeito à ser ou não doença ocupacional. Saiba mais.

É fato que a pandemia do novo coronavírus vem gerando muitas dúvidas e debates no mundo jurídico e trabalhista, quando diz respeito à sua caracterização como doença ocupacional.

Em março no ano passado, o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 927 de 22/03/20, onde em seu artigo 29 determina que os casos de contaminação pelo novo coronavírus não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal, ou seja, vinculada sua infecção ao ambiente de trabalho.

No entanto, o Superior Tribunal Federal (STF) suspendeu a validade do artigo 29, considerando que é de responsabilidade dos empregadores adotarem todas as medidas de prevenção contra a doença, assim como a atribuição do ônus probatório do empregado não seria medida adequada à redução dos riscos diante da Covid-19.

A MP nº 927 teve sua vigência encerrada sem a sua conversão em lei e a questão continuou a ser motivo de questionamentos.

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Já em dezembro de 2020, o Ministério da Economia emitiu a Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME, onde orienta que a Covid-19 pode ser reconhecida como doença ocupacional, quando resultar das condições especiais em que o trabalho é executado e como ele se relaciona diretamente; podendo se constituir ainda num acidente de trabalho por enfermidade equiparada, na hipótese em que a Covid-19 seja proveniente de contaminação acidental do empregado pelo vírus no exercício de sua atividade funcional.

Entretanto, considerou que a Perícia Médica Federal é quem deve caracterizar tecnicamente a identificação do nexo causal ou não. Todavia, o Ministério Público do Trabalho, em última revisão, igualmente emitiu Nota Técnica GT Covid-19 20/20, recomendando a emissão do Cadastro de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) para todos os funcionários que sejam contaminados, inclusive aqueles que estiverem apenas sob uma condição de suspeita por critério clínico-epidemiológico.

“Caso seja demonstrada a relação da doença com o meio ambiente do trabalho, somada à eventual negligência na adoção de protocolos e medidas preventivas à prevenção do Covid-19, a empresa pode ser responsabilizada. Assim, o empregado pode judicializar a temática e pleitear que sejam concedidas indenizações pelos danos (moral e/ou material) eventualmente ocorridos em razão da contaminação. E caso ocorra a necessidade de afastamento superior a quinze dias, o empregado receberá auxílio doença acidentário, além do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) relacionado ao período de afastamento, sendo certo ainda, que após o seu retorno, terá estabilidade de 12 meses”, esclareceu a advogada Aline Mattiazzo, que atua no Departamento Trabalhista da Covac Sociedade de Advogados, no Rio de Janeiro, em entrevista ao Portal de Notícias da PEBMED.

doença ocupacional

Adaptações necessárias nos ambientes de trabalho

“Se demonstrado o nexo de causalidade, a sentença judicial pode condenar a empresa, com o reconhecimento de doença ocupacional, ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, reintegração ao emprego caso tenha ocorrido a dispensa do trabalhador, além de ficar exposta à fiscalização por auditores e ainda investigação pelo Ministério Público (MPT) para averiguar as condições do ambiente de trabalho da empresa. No estado de São Paulo há diversas empresas que foram submetidas à fiscalização por auditores do trabalho, onde foram solicitadas diversas informações e documentos que demonstrem que há segurança sanitária na empresa”, ressaltou o advogado Wellington Roberto Ferreira, coordenador da área trabalhista de Loeser e Hadad Advogados, em São Paulo, em entrevista ao Portal de Notícias da PEBMED.

O especialista complementou que, conforme entendimento do STF, cabe às empresas esta comprovação. “Minha recomendação é aprimorar o contingente do Serviço Especializado de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) para que seja possível a aferição diária de temperatura, promover adaptações nos postos de trabalho e refeitórios para garantir o distanciamento pessoal, privilegiar o home office para profissionais do denominado grupo de risco e gestantes, além de reforçar a higienização dos ambientes de trabalho. Enfim, implementar medidas preventivas e protocolos e políticas internas para garantir a segurança sanitária da empresa”, pontuou Ferreira.

As decisões judiciais apontam que é obrigação do empregador promover um ambiente de trabalho seguro, o que inclui a segurança sanitária, livre de agentes biológicos como o Covid-19, podendo a empresa ser responsabilizada caso seja omissa ou negligente.

Na opinião da advogada Aline Mattiazzo o mais importante é manter um canal constante de comunicação, visando propagar informações sobre a prevenção ao contágio da Covid-19, com a edição de cartilha ou envio de e-mails informativos sobre as medidas de segurança que devem ser adotadas por esses funcionários em seu dia a dia de trabalho.  

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Casos julgados

Em recente decisão, a Justiça do Trabalho de Minas Gerais reconheceu como acidente de trabalho o óbito por Covid-19 de um motorista de caminhão. Com a decisão, a transportadora que o empregava foi condenada a pagar indenização de R$200 mil por dano moral aos familiares e pensão para a filha até que a menor complete 24 anos.

“O juiz da Vara do Trabalho de Três Corações entendeu que a empresa deveria ser responsabilizada de forma objetiva, tendo o dever de assumir o risco por eventuais infortúnios sofridos pelo empregado ao submetê-lo ao trabalho durante período agudo da pandemia, uma vez que o funcionário teria sido contaminado no exercício da função, durante uma viagem de dez dias de Minas Gerais a Pernambuco, estando vulnerável aos ambientes a que se submetia”, relatou a advogada Sylvia Maria de Filgueiras Cabete, especializada em Direito do Trabalho, que atua no escritório Aparecido Inácio e Pereira Advogados Associados, em São Paulo.

Entretanto, em outro caso recente, Sylvia Cabete destacou que o juiz da 36º Vara do Trabalho de São Paulo, negou liminar pretendida por trabalhador, decidindo que o enquadramento do contágio por Covid-19 como doença ocupacional não decorre de nexo causal presumido, sendo que seu reconhecimento como acidente de trabalho demanda a análise ampla do caso concreto.

“Percebe-se, portanto, que esse é um tema é bastante complexo, dependendo das circunstâncias de cada caso, que será analisado mediante a forma e as condições nas quais o empregado exerce seu trabalho, se o empregador adotou as medidas cabíveis para prevenção da contaminação e até mesmo através de realização de perícia técnica médica”, finalizou a advogada Sylvia Cabete.

*Esse artigo foi revisado pela equipe médica da PEBMED.

Referências bibliográficas:

 

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