Crise aguda de sinovite por depósito de pirofosfato de cálcio aumenta o risco de eventos cardiovasculares

A doença por depósito de pirofosfato de cálcio é uma artropatia inflamatória microcristalina que pode se manifestar de diferentes formas.

A doença por depósito de pirofosfato de cálcio (CPPD) é uma artropatia inflamatória microcristalina que pode se manifestar de diferentes formas, como crise aguda de sinovite (historicamente conhecida como pseudogota), sinovite crônica por CPP (historicamente conhecida como pseudoartrite reumatoide), osteoartrite com condrocalcinose e casos assintomáticos com condrocalcinose isolada.

Durante as crises agudas de doença por depósito de pirofosfato de cálcio, existe importante liberação de IL-1ß, citocina inflamatória que foi implicada na fisiopatogênese de eventos cardiovasculares. Além disso, os pacientes com CPPD apresentam maior presença de calcificações arteriais do que pacientes sem CPPD, o que aumenta o seu risco cardiovascular. De maneira análoga à artrite reumatoide, artrite psoriásica e espondiloartites, apenas recentemente um estudo demonstrarou que a CPPD (se referindo ao grupo de manifestações como um todo) também está implicada em um aumento no risco cardiovascular (incremento de 25% no risco de eventos não fatais), após controle para os fatores de risco cardiovascular tradicionais.

Com base nisso, Tedeschi et al. desenvolveram um estudo para avaliar se existe um risco aumentado de eventos cardiovasculares em pacientes com crise aguda de doença por depósito de pirofosfato de cálcio.

pirofosfato de cálcio

Métodos

Trata-se de um estudo de coorte pareada que utilizou dados de um repositório que agrega informação de mais de cinco milhões de pacientes em acompanhamento no Mass General, Brigham and Women’s Hospital (vinculado à Universidade de Harvard) e locais afiliados.

Os casos de crise aguda de CPPD foram caraterizados utilizando um algoritmo baseado em machine learning, que foi desenvolvido para ser aplicado em formulários eletrônicos de dados (capaz de buscar informações em relatórios radiográficos, informações de prontuário, sinovianálises e cobranças hospitalares). Esse algoritmo foi previamente estudado e apresenta um valor preditivo positivo para o diagnóstico de crise aguda de CPPD de 81%. O episódio índice de crise aguda de CPPD (a partir do qual o tempo foi contabilizado) foi o primeiro relato de sinovianálise positiva ou o primeiro relato em linguagem natural contendo o termo pseudogota (‘pseudogout’).

Os comparadores foram obtidos a partir dos casos não classificados como crise aguda de CPPD e foram pareados na proporção de um caso para quatro controles. A data índice dos comparadores foi aquela na qual houve uma consulta médica com até 30 dias do episódio índice dos pacientes com crise aguda de CPPD.

A idade selecionada para análise foi ≥50 anos, visto que os casos de crise aguda de doença por depósito de pirofosfato de cálcio são muito raros antes dessa idade.

Os desfechos primários analisados foram eventos cardiovasculares maiores (que incluiu eventos não fatais – infarto agudo do miocárdio, síndrome coronariana aguda, revascularização miocárdica e acidente vascular encefálico – e mortes por todas as causas. Os eventos foram identificados através de códigos do CID-10 ou códigos de procedimentos de cobrança hospitalar.

A análise de sensibilidade foi realizada com três cenários diferentes:

  • Pacientes com crise aguda de CPPD durante visitas ambulatoriais;
  • Dados do Medicare;
  • Pacientes pareados por fatores de risco cardiovascular.

Resultados

Foram encontrados 1200 casos de crise aguda de CPPD, que foram pareados com 3.810 controles. A taxa de incidência de eventos cardiovasculares maiores entre os anos 0 e 2 foi de 91 eventos por 1.000 pessoas-ano nos casos e 59 por 1.000 pessoas-anos. Já entre os anos 2 e 10, essas taxas foram de 58 e 53, respectivamente.

O risco relativo para eventos cardiovasculares maiores em pacientes com crise aguda de CPPD foi de 1,32 entre os anos 0 e 2 (IC95% 1,01-1,73). Já o risco relativo de eventos não fatais entre os anos 0 e 2 foi de 1,92 (IC95% 1,12-3,28); entre os anos 2 e 10, esse valor foi de 2,18 (IC95% 1,27-3,75).

A análise de sensibilidade demonstrou resultados semelhantes, exceto para a análise apenas de pacientes ambulatoriais (risco de eventos não fatais foi maior entre os anos 2 e 10, mas não entre os anos 0 e 2).

Leia também: ASAS atualiza as definições de lesões de espondiloartrite axial na RM de coluna

Comentários

Esse estudo, apesar das limitações intrínsecas aos métodos utilizados, nos revela dados interessantes a respeito do risco aumentado de eventos cardiovasculares em pacientes com crise aguda de CPPD. Os pacientes com crise aguda de CPPD apresentaram, de maneira geral, uma maior chance de eventos cardiovasculares maiores e de eventos cardiovasculares não fatais.

Esse dado é interessante porque existem estudos que sugerem a participação da IL-1ß no processo fisiopatogênico relacionado às síndromes coronarianas agudas. Com isso, é possível pressupor que esse seja o ponto de ligação entre essas duas entidades clínicas, o que reforça a possibilidade de relação causal, que deve ser explorada de maneira mais detalhada em estudos com desenhos de melhor qualidade metodológica para responder essa questão.

Como mensagem final, assim como fazemos para outras artropatias inflamatórias, devemos nos atentar para o risco cardiovascular dos pacientes com crise aguda de CPPD. Os dados apresentados por esse estudo, aliados ao fato de a CPPD predominar em pacientes mais idosos, reforçam essa necessidade e podem resultar em melhor sobrevida nesses casos.

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo

Selecione o motivo:
Errado
Incompleto
Desatualizado
Confuso
Outros

Sucesso!

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo.

Você avaliou esse artigo

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Baixe o Whitebook Tenha o melhor suporte
na sua tomada de decisão.
Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Tedeschi SK, Huang X, Yoshida K, et al. Risk of cardiovascular events in patients having had acute calcium pyrophosphate crystal arthritis. Ann Rheum Dis 2022;0:1–7. doi: 10.1136/annrheumdis-2022-222387
  • Bashir M, Sherman KA, Solomon DH, et al. Cardiovascular disease risk in calcium pyrophosphate deposition disease: a nationwide study of Veterans. Arthritis Care Res 2021. doi: 10.1002/acr.24783