Cultivando a noção prognóstica em cuidados paliativos

Os cuidados paliativos são uma abordagem que alivia sintomas de familiares e pacientes, portadores de doenças ameaçadoras da vida. Saiba mais.

Os cuidados paliativos são uma abordagem que alivia sintomas de familiares e pacientes, portadores de doenças ameaçadoras da vida. Isso não é novidade. Talvez seja novidade saber que, quando bem executada e indicada precocemente, essa abordagem reduz taxas de depressão, aumenta qualidade de vida, e até mesmo prolonga a sobrevida dos pacientes. 

Dentre as frentes de atuação dos cuidados paliativos, as técnicas de comunicação sobre diagnóstico e prognóstico se destacam, contudo, esse processo nem sempre ocorre de forma linear. Como componente chave da abordagem dos cuidados paliativos precoce (em estágios menos avançados na trajetória de doença), vamos falar hoje sobre o cultivo da noção prognóstica.

Saiba mais: Sexualidade nos cuidados paliativos: os desafios para os profissionais de saúde

cuidados paliativos

Noção prognóstica

O conceito de noção prognóstica é definido pela capacidade da pessoa entender seu prognóstico e o(s) curso(s) mais provável(is) de sua doença. Com isso, objetiva-se que o paciente possa adaptar-se psicologicamente, participando da forma mais autônoma possível no processo de decisão compartilhada em saúde, incorporando assim seus objetivos, desejos e valores aos planos de cuidado.

Segundo Jacobsen, no artigo “Misunderstandings about prognosis: An approach for palliative care consultants when the patient does not seem to understand what was said”, os médicos clínicos presumem que os pacientes não tenham integrado informações por duas principais razões: a) forma de comunicar pouco clara; b) o paciente simplesmente não entende. Devemos fugir desse pensamento dilemático!

Perceber-se portador de uma doença grave, limitante e ameaçadora à vida, rompe com planos, expectativas, desejos, e esperanças. Sendo assim, inexoravelmente exigirá uma adaptação psíquica que nem sempre se encaixa nos tempos de consulta. Guardemos então um mantra: os pacientes integram a informação prognóstica ao passo que conseguem preservar sua habilidade de funcionar no mundo.

Dito isso, é comum observarmos um mecanismo pendular de “coping” (ou enfrentamento) em pessoas portadoras de doenças graves, onde o pêndulo transita entre cenários mais realísticos / integrados com as informações fornecidas, e outros cenários menos realísticos. Com o cultivo da noção prognóstica, o paciente se sente cada vez menos impelido a transitar tão drasticamente entre os dois pólos, passando a se acomodar mais confortavelmente com o cenário prognóstico mais provável.

Como cultivar a noção prognóstica?

Baseado no artigo “The cultivation of prognostic awareness through the provision of early palliative care in the ambulatory setting: A communication guide”, publicado em 2013 na revista Journal of Palliative Medicine, vamos ao passo-a-passo:

  • Passo 0: Preparação

Antes de acessar o paciente, é essencial munir-se de informações a respeito do curso natural de sua doença, assim como a provável sobrevida.

  • Passo 1: Acessar a noção prognóstica

Nesse passo, além de percebermos o quanto a pessoa sabe sobre sua doença, podemos medir a sua disponibilidade para discussão de cenários mais difíceis. É sempre importante lembrar que o paciente tem o direito de não querer saber ou discutir sobre sua doença.

De forma prática, sugere-se questionamentos abertos, como:

  • “Como você imagina que será daqui para frente?”
  • “O que os médicos falaram sobre sua doença? E o que esperar dela?”

 

  • Passo 2: Contemplação de um estado de saúde agravado

Aqui, iremos testar diretamente a abertura do paciente para discutir cenários futuros de piora clínica. Uma forma de transmitir esperança e ser realista ao mesmo tempo é usar frases como “eu espero que” ou “me preocupa”, conforme abaixo:

  • “Eu espero que o tratamento X corra bem, mas me preocupo caso isso não aconteça”
  • “Já imaginou se as coisas não andarem bem?”

 

  • Passo 3: Disponibilidade, necessidade e ação

 

  • O paciente se demonstra disponível para discutir prognóstico, independentemente do status clínico: oferecer informações mais detalhadas, partindo sempre das expectativas do paciente (ex: “O que o seu corpo tem te falado?”).
  • O paciente se demonstra indisponível / resistente à discussão, mas ainda se encontra clinicamente estável: repetir os passos 1-2 pode ser uma opção, objetivando deixar o paciente mais confortável para discutir sobre sua saúde / doença em um futuro próximo.
  • O paciente se demonstra indisponível / resistente, e se encontra em declínio clínico: “nomear o dilema” pode ser uma técnica bastante útil nesse cenário. Essa estratégia consiste em validar e acolher a dificuldade do paciente em falar no assunto, mas também expor algumas desvantagens em não fazê-lo. Por exemplo, “percebo o quão difícil é falar sobre ficar ainda mais doente, mas entendo que possa ser uma boa forma de garantir o cuidado que faça mais sentido para você”.

Leia também: Cuidados paliativos na atenção primária à saúde

Mensagem final sobre os cuidados paliativos

Os cuidados paliativos devem fazer parte do cuidado de todos os pacientes com doença grave que limite a sobrevida, seja a curto ou longo prazo. A comunicação é uma parte fundamental deste cuidado, sendo uma habilidade fundamental para todo médico. Dentro deste cuidado, a conversa acerca de noção prognóstica, em conjunto com o paciente, deve ser implementada precocemente.

Referências bibliográficas:

  • Jackson VA, Jacobsen J, Greer JA, Pirl WF, Temel JS, Back AL. The cultivation of prognostic awareness through the provision of early palliative care in the ambulatory setting: A communication guide. J Palliat Med. 2013;16(8):894–900. doi10.1089/jpm.2012.0547
  • Jacobsen J, Thomas JD, Jackson VA. Misunderstandings about prognosis: An approach for palliative care consultants when the patient does not seem to understand what was said. J Palliat Med. 2013;16(1):91–5. doi10.1089/jpm.2012.0142
  • Gaertner J, Wolf J, Voltz R. Early palliative care for patients with metastatic cancer. Curr Opin Oncol. 2012;24(4):357–62. doi10.1097/CCO.0b013e328352ea20

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