Dia Mundial da Tuberculose: quais as principais estratégias para controle da doença?

Tuberculose é uma das principais causas de morte no mundo. A OMS considera o dia 24 de março como Dia Mundial de Combate à Tuberculose.

Tuberculose é uma das principais causas de morte ao redor do mundo. A estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de que 10 milhões de novos diagnósticos de tuberculose sejam feitos anualmente no mundo.

Devido à sua importância epidemiológica e impacto na mortalidade, a OMS declarou a data de 24 de março como o Dia Mundial de Combate à Tuberculose, como forma de aumentar a conscientização em relação à doença.

médica avaliando raio X de paciente com tuberculose

Tuberculose

A Conference on Retoviruses and Opportunistic Infections (CROI) 2021, realizada nos últimos dias 10 a 14 de março, também tratou de estratégias para o controle da tuberculose no mundo. Algumas das novidades e destaques apresentados durante a conferência são os seguintes.

Fármacos injetáveis de longa duração

Uma das principais estratégias para o controle da transmissão de tuberculose é o tratamento preventivo ou quimioprofilaxia, que conhecidamente reduz a incidência e mortalidade da doença. Em pacientes com HIV, esse benefício ocorre inclusive independente do uso de TARV.

Estima-se que 25% da população mundial tenha TB latente e, por esse motivo, poderia se beneficiar de terapias preventivas efetivas. Entretanto, a longa duração do tratamento, a preocupação com eventos adversos e a dificuldade de adesão são barreiras para a implementação mais disseminada de quimioprofilaxia.

Atualmente, a Organização Mundial de Saúde recomenda cinco alternativas de esquemas para o tratamento de TB latente:

6 a 9 meses de isoniazida (6H ou 9H)
4 meses de rifampicina (4R)
3 meses de isoniazida e rifampicina (3RH)
3 meses de isoniazida em alta dose e rifapentina semanalmente (3HP)
1 mês de isoniazida e rifapentina (1HP)

Apesar da presença de esquemas mais curtos, todos os tratamentos aprovados até o momento têm duração de pelo menos um mês e são dependentes de rifamicinas. Formulações injetáveis de longa duração podem ser uma alternativa interessante para minorar as dificuldades observadas para o sucesso da quimioprofilaxia para tuberculose latente.

Veja mais: Quinolonas para infecção latente por tuberculose (ILTB-DR)

Considerando as características desejadas para uma formulação de longa duração (baixa solubilidade em água, clearance lento e alta potência), rifapentina, rifabutina, delamanide e bedaquilina seriam drogas com atividade contra Mycobacterium tuberculosis com potencial para esse tipo de uso.

Estudos in vitro e in vivo de farmacocinética e farmacodinâmica mostraram que injeções intramusculares de bedaquilina podem manter concentração plasmática considerada adequada por um mês, com atividade micobactericida por até 12 semanas.

Outros medicamentos em investigação, como TBAJ-876, parecem ter maior efetividade e menor risco cardiovascular do que a bedaquilina, sendo também uma potencial alternativa para uso de injeções de longa duração.

Tuberculose e gravidez

Um estudo de coorte britânico mostrou que o período de maior risco de desenvolvimento de TB ativa em mulheres é a janela de 90 dias após o parto. Sabe-se que algumas doenças são mais comuns em gestantes do que em mulheres não gestantes, como malária e listeriose, enquanto outras apresentam maior gravidade em gestantes, como Influenza e varicela. Os pesquisadores investigaram se a gestação influenciava de alguma forma as características e desfechos da tuberculose.

Estudos com gestantes com e sem infecção pelo vírus HIV mostram que os níveis de IFN-gama diminuem regularmente durante o avanço da gestação, chegando ao seu nadir no parto e depois aumentando rapidamente no período do puerpério. Mulheres com HIV apresentaram níveis significativamente menores de IFN-gama em todos os momentos da gravidez. A média de CD4 da coorte era > 400 células/mm³, sugerindo um efeito independente do nível de imunossupressão. Os coordenadores do estudo acreditam que esse fato possa estar associado a maior incidência de TB em indivíduos com infecção pelo HIV.

Mulheres grávidas que desenvolvem TB ativa apresentam maior risco de complicações e desfechos desfavoráveis maternos e fetais, como 2x mais risco de pré-eclâmpsia, eclampsia e sangramento vaginal, 12x mais risco de hospitalização e 10x mais risco de aborto. Para mortalidade, o aumento no risco é ainda mais importante, sendo de 25x em mulheres sem HIV e de 37x em mulheres com infecção pelo HIV.

Para prevenção de TB em gestantes, CDC e OMS recomendam como primeira escolha o esquema diário com isoniazida por seis a nove meses com coadministração de piridoxina. Para países considerados com baixa carga de TB, o CDC coloca o esquema de rifampicina diariamente por quatro meses como alternativa. O esquema semanal de isoniazida e rifapentina por três meses ainda não foi estudado em gestantes e não é recomendado nessa população.

O estudo TB APPRISE contou com 956 gestantes randomizadas para receber profilaxia com isoniazida durante a gestação ou 12 semanas após o parto. A incidência de TB ativa nos dois grupos foi semelhante, mas o grupo que recebeu isoniazida durante a gravidez apresentou maior frequência de eventos adversos, especialmente aborto espontâneo e baixo peso ao nascer. Outro achado foi que, em ambos os braços do estudo, os valores de TGP estavam elevados, com pico em 12 semanas após o pós-parto.

O esquema de isoniazida e rifapentina semanal foi estudado em gestantes com e sem HIV no IMPAACT 2001, mas ainda como estudo de fase 1 e 2. Os resultados mostraram que mulheres com HIV apresentaram um clearance de rifapentina 30% maior do que as sem HIV em todos os momentos da gestação e no pós-parto. Ao mesmo tempo, mulheres sem HIV apresentaram maior clearance durante o período de puerpério do que durante a gravidez.

Entretanto, as análises de farmacocinética e farmacodinâmica sugerem que nenhum ajuste e dose seja necessário.

Tuberculose na população pediátrica

O diagnóstico de TB na população pediátrica pode ser desafiador e a doença tem um grande potencial de mortalidade em crianças, principalmente nas com infecção pelo HIV. Crianças com imunossupressão grave têm um risco 5x maior de tuberculose ativa e TARV é reconhecidamente protetor de desenvolvimento de TB e de mortalidade associada à TB em crianças.

Os métodos microbiológicos para diagnóstico apresentam sensibilidade limitada na população pediátrica, com exames de escarro apresentando uma sensibilidade de 10%, cultura para micobactérias, uma sensibilidade de 40% e o teste molecular Xpert/ULTRA, uma sensibilidade de 30%.

Poucos estudos avaliaram a interação da TARV e tratamento anti-TB em crianças. Sabe-se que a rifampicina diminui os níveis de nevirapina (NVP) e que a exposição a efavirenz (EFV) pode ser subótima em pacientes que são metabolizadores rápidos e não é indicado em crianças < 3 anos.

A possibilidade de uso de dolutegravir (DTG) pode facilitar o tratamento de TB em crianças em uso de TARV, já que o ODYSSEY mostrou exposição adequada dos fármacos em crianças com seis anos ou mais em uso de rifampicina e DTG em dose dobrada. Até o momento, as recomendações da OMS para o tratamento de crianças com HIV e com coinfecção TB/HIV são:

População pediátrica Tratamento preferencial Tratamento preferencial quando com coadministração com esquemas com rifampicina
Neonatos (< 4 semanas) AZT + 3TC + RAL Sem dados para o RAL em crianças < 4 semanas
Crianças < 20kg ABC + 3TC + DTG FDA/OMS recomendam aumentar a dose de DTG para 2x/dia
Crianças > 20kg ABC + 3TC + DTG Aumentar a dose de DTG para 50mg, 2x/dia

Enquanto comprimidos dispersíveis e o tratamento com DTG em crianças não se tornam disponíveis, os ajustes recomendados na terapia são:

População pediátrica Ajustes de dose
Crianças em uso de LPV/r Booster de LPV/r com RTV em proporção 1:1


Uso de esquemas baseados em EFV


Uso de terapia tripla com inibidores de transcriptase reversa enquanto durar o tratamento de TB

Crianças em uso de RAL Aumentar a dose de RAL para 12mg/kg 2x/dia em crianças com 4 semanas ou mais

O TBTC 31/ACTG A5349 é um estudo randomizado, aberto e multicêntrico que avaliou a eficácia de rifapentina em alta dose com ou sem moxifloxacino em uma população de indivíduos com 12 anos ou mais, incluindo pessoas com HIV com CD4 > 100 e em uso de efavirenz. A combinação de rifapentina e moxifloxacino foi não-inferior ao esquema padrão de rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol (RHZE). Contudo, os mesmos resultados não foram encontrados com monoterapia com rifapentina em alta dose, que foi considerada inferior ao esquema padrão.

Leia também: Uso de IGRA no diagnóstico de tuberculose em crianças HIV positivas

O estudo SHINE é um estudo aberto e randomizado que procurou avaliar a não inferioridade de um tratamento de quatro meses de RHZE em comparação com o esquema padrão de seis meses em crianças com TB sensível minimamente sintomática. O estudo incluiu 1204 crianças com < 16 anos, sendo 11% com infecção pelo HIV, e encontrou que tratamento por quatro meses de tratamento foi não inferior a seis meses.

Entre as opções atuais de esquemas para TB latente de curta duração, o uso diário de isoniazida e rifampicina por três meses é o preferencial em crianças < 25 kg, uma vez que possui formulações de mais fácil administração para crianças, sendo equivalente ao esquema clássico de seis a 12 meses de isoniazida. Entretanto, possui um potencial de interações medicamentosas com antirretrovirais utilizados na população pediátrica, como lopinavir/ritonavir, nevirapina e dolutegravir.

Outra opção, rifapentina e isoniazida semanalmente por 12 semanas, também se mostrou não inferior a nove meses de isoniazida em crianças com dois anos ou mais, com maior taxa de tratamentos completos e menor de hepatoxicidade. Contudo, gosto amargo e indisponibilidade de comprimidos dispersíveis são barreiras para a adesão e aplicabilidade desse esquema na prática.

A interação entre rifapentina e isoniazida e dolutegravir vai ser avaliado no estudo DOLPHIN Kids, com resultados esperados para 2023.

Referências bibliográficas:

Palestra sobre tuberculose realizada na Conference on Retoviruses and Opportunistic Infections (CROI) 2021. Alguns dos estudos podem ser encontrados nos links abaixo:

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