Dia Mundial das Crianças Vítimas de Agressão: como o enfermeiro deve agir?

Em 1982, a ONU criou o Dia Mundial das Crianças Vítimas de Agressão. A data é uma oportunidade para refletir acerca do problema. Saiba mais.

Em 1982, a Organização das Nações Unidas (ONU), criou o Dia Mundial das Crianças Vítimas de Agressão. A data não pode ser entendida como comemorativa, mas sim como uma oportunidade para a sociedade refletir acerca do problema. As razões da violência e abuso é tema de discussão de toda sociedade. Na história da sociedade, a criança era pouco valorizada, tendo pouco valor na estrutura familiar, muitas vezes sofria abusos e agressões como forma punitiva de suas ações.

O desconhecimento da criança e a necessidade de aprendizado para viver em sociedade era cobrado de forma violenta em muitas famílias. Essas sofriam diversos tipos de violência. Com a formação do Estado de direito, grupos de vulnerabilidade foram tomando notoriedade ao longo da história. Houve uma construção para que esse grupo pudesse ter um cuidado da sociedade. Dessa forma, zelar por crianças deixou de ser uma tarefa exclusiva dos pais ou parentes, mas se tornou dever do Estado e de seus representantes, como os profissionais de saúde, educadores, governantes e sociedade.

Os perfis das agressões

A maioria dos agressores é um membro da família. Esse é o maior problema neste tipo de violência, se esbarra com uma questão muitas vezes cultural da sociedade. O que desvela um problema pra sociedade pois não consegue evidenciar os maus tratos, muitas vezes se tornando casos midiáticos, muitas vezes quando o resultado final é a morte, como aconteceu com um menino de 4 anos, no Rio de Janeiro, o menino Henry. O caso chocou o país e apareceu nos maiores canais de comunicação. Os suspeitos eram os responsáveis pelo menino e viviam na mesma casa. O padrasto e a própria mãe, estão em investigação, uma vez que foi identificado agressões corporais severas que levaram Henry à morte. Essa relação de violência intrafamiliar, associada a vulnerabilidade da criança e muitas vezes a não possibilidade de defesa das mesmas,  faz com que a sociedade tenha que estar atenta a esse tipo de comportamento por diversas formas. Uma delas esta na avaliação de saúde que deve ser feita nas crianças pelos enfermeiros em todas as unidades de acolhimento, atenção, atendimento ou internação. 

Leia também: Violência doméstica: uma pandemia dentro da pandemia

  • Maus tratos físicos: é o uso da força física intencional e pretendida, geralmente praticado por pessoas próximas;
  • Síndrome do bebê sacudido: consiste em lesões causadas quando a criança é sacudida pelo adulto, as lesões são cerebrais e não visíveis em um primeiro momento;
  • Síndrome da criança espancada: refere-se a criança de baixa idade que apresenta ferimentos inusitados, lesões de fraturas ósseas, queimaduras, abrasões, escoriações, sem causa específicas com incoerência de explicações pelos pais;
  • Síndrome de Munchausen por procuração: quando a criança é levada ao serviço de saúde com sintomas criados ou provocados pelos responsáveis. é um comportamento considerado como violência uma vez que a criança acaba por passar por exames e procedimentos desnessários;
  • Maus-tratos psicológicos: são aquelas que se relacionam com toda forma de depreciação, punição exagerada, negociação exagerada, desrespeito, discriminação, rejeição, cobrança e outra relações não saudáveis com o adulto. Pela sutileza, muitas vezes não é identificada;
  • Negligência: Omissão dos responsáveis em prover as necessidades básicas ao desenvolvimento. Acontece em gerar a privação de cuidados, higiene, medicamentos, proteção, contra violências de terceiros ou a riscos físicos, falta de estímulo a escolarização etc. Essa identificação sempre é uma das mais difíceis devido as questões socioeconômicas que leva a dúvida quanto a intenção dos pais na geração desta violência;
  • Abuso sexual:  qualquer relação que com ato sexual, ou relação onde a criança esteja em situação de vulnerabilidade quanto a intenção de ser estimuada para satisfazer condições sexual do outro. Pode haver ou não o ato sexual em si, a prática erótica pode ser uma condição muitas vezes mediadas pelas redes sociais. Pode ter ou não contato físico, esses são compreendidos da seguinte forma;

Abuso sem contato físico

  • Assédio sexual: proposta ou intenção de realizar atos sexuais, com posição de poder sobre a crinça, com chantagem ou ameaça na maioria das vezes;
  • Abuso sexual: conversas sobre atividade sexual coma a crianças, com objetivo de despertar o interesse sexual da criança;
  • Exibicionismo: Ato sexual onde o agente mostra seus órgãos sexuais ou se masturba frente a ciança, ou em seu campo de visão;
  • Voyeurismo: Observação fixa aos órgãos sexuais de outra pessoa, quando este não as deseja, buscando dessa forma obter satisfação sexual com essa prática;
  • Pornografia: abuso sexual da criança com fins comerciais, onde, há venda e lucro com a criança como objeto de desejo.

Abuso com contato físico

 

  • Contato físico sexual coma  criança: São aqueles atos que se relacionam ao toque, carícias, ato sexual em si, masturbação, felação, sexo oral, penetração vaginal e anal;
  • Estupro: constranger a criança mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele pratique outro ato sexual;
  • Pedofilia: É um desvio no desenvolvimento da sexualidade, caracterizado pelo desejo sexual com comportamento compulsivo e obsessivo por crinças;
  • Exploração sexual: exploração da criança como mão de obra sexual, geralmente em locais específicos de prostituição sexual da criança, são relacionadas a venda do corpo, turismo sexual, shows eróticos, fotografias do corpo nú, vídeos, filmes pornográficos, e outras questões ligadas ao comércio;
  • Violência doméstica: Abuso sobre com poder sobre o vulnerável, no caso a criança que sempre será vulnerável, frente ao adulto.São tratadas como propriedade e compreendidas como sujeitos de direito. A maioria das violências acontecem no lar e são praticadas pelos pais ou responsáveis, inclui aqui profissionais cuidadores, pode ser materializada, como física, psicológica sexual entre outras;
  • Violência intrafamiliar: forma de violência física, psicológica ou sexual praticada por membros da família, não necessariamente necessita ser em ambiente domiciliar;
  • Trabalho infantil:  forma de violência materializada na exploração por meio do trabalho, pode estar relacionado a condição de pobreza. As condições sejam elas insalubres e perigosas reforçam a necessidade de atenção das equipes de saúde. è compreendida em conexão com a exploração sexual ou com a vulnerabilidade para o abuso;
  •  Bullying: são os maus tratos entre iguais ou violência entre iguais. Há a intencionalidade de gerar violência, por desequilibrio físico, psicológico ou social. Acontece de criança pra criança e deve ser observada pelo serviço de saúde para que não ocorra a continuidade do ato;
  • Violência institucional: Praticada pelas instituições de serviço público ou privado. Os locais que deveriam proteger as crianças podem gerar violência por ação ou omissão; 
  • Violência estrutural: é aquela que chega até a criança por meio de condicionamento hsitórico-econômico-social. Age na estrutura da sociedade, levando a criança ao adoecimento e até a morte;
  • Violência social: São as violências que consideram ações ou omissões realizadas por grupo, classe ou nações que geram danos a criança em todos os aspectos, são questões de preconceito e discriminação pela distinção de etnia, raça, gênero, condição socioeconômicas, limitações físicas ou deficiências etc.

Com a pandemia, a violência vem crescendo, de acordo com Marques (2020). Cerca de 1,5 bilhão de crianças e adolescentes em todo o mundo estão fora da escola, como consequência da pandemia da Covid-19. A erosão do suporte escolar é um dos indicadores de aumento da violência. Outro ponto é a diminuição dos serviços relativos à defesa dos direitos da criança, mais a questão do isolamento intradomicílio, dificultando o diagnóstico.

Mas o que pode ser feito?

O importante nesse processo é compreender melhor sobre as questões familiares e tentar de alguma forma popularização das informações, utilizando as redes sociais e a telenfermagem, nesse momento, onde a ida ao território tem sido cada vez mais restringida. Vamos apresentar algumas medidas de identificação de violência. Os profissionais da atenção básica podem utilizar a telenfermagem para fazer o acompanhamento das famílias.

Os profissionais de enfermagem precisam conhecer as formas de violência e identificá-las, muitas vezes as identificações passam por questões distantes das relacionadas e deve o profissional de enfermagem ficar atento a queixas da crinça, não negligenciar qualquer fala, atentar-se para o comportamento, por isso, é necessário levantar o comportamento social, coletivo, individual, escolar e familiar da criança. Muito embora seja dificultoso compreender a vulnerabilidade da criança em tempos de pandemia o profissional de enfermagem pode por meio de contato telefônico, ou mesmo pela teleenfermagem achar um canal de comunicação com todos os membros da família. Em situação convencional, sem a pandemia, a consulta de enfermagem a criança realizada na clínica da família pode abranger pergunta a criança e seus familiares que ajudem na identificação dos problemas. O contato com a escola também é importante, dessa parceria uma avaliação mais global da criança pode ser realizada.

Algumas ações que podem ser realizadas pelo enfermeiro na pandemia:

  • Faça o acolhimento da família e da comunidade;
  • Discuta a questão da violência a criança com as famílias e na escola;
  • Em tempos de pandemia, lembre-se que a telenfermagem pode ser um ótimo recurso;
  • Faça campanhas nas redes sociais e tenha atualizado o cadastro das famílias;
  • Reforce as informações de atendimento dos pontos de atenção pelos canais: Disque 100 (violação aos direitos humanos); aplicativo proteja Brasil (proteção infantil); Delegacias convencionais e de proteção a criança e adolescente; centro de referencia de assistência social e centros especializados de assistência social (CREAS e CRAS); Conselho tutelar; Ministério público e polícia civil e militar;
  •  Criar campanhas de alerta sobre os diferentes tipos de maus-tratos contra crianças e adolescentes. Vizinhos, parentes e amigos podem fazer toda a diferença em uma situação como essa;
  • Criar dispositivos na rede básica para o acolhimento de crianças e adolescentes em situação de violência, valorizando acolhimento e aconselhamento psicológico, socioassistencial, e saúde;
  • Faça a notificação, mesmo que seja as notificação de suspeita de violência;
  • Em casos graves que não haja possibilidade de intervenção de saúde, busque ajuda do apoio pelo matriciamento;
  • Faça o acompanhamento das crianças respeitando o calendário, mas no caso de possibilidade de violência, reduza o tempo e utilize a visita domiciliar (VD) em detrimento da avaliação do estado de saúde e da visualização da violência a criança;
  • Em caso de violência constatada, faça a notificação e informe aos órgãos competentes para proteção da criança;
  • Lembre-se que quando mantemos o contato com a comunidade temos mais chance de observar maus tratos nas crianças;
  • Observe os locais de vulnerabilidade e cuide das crianças em seu território.

Observe os seguintes sinais:

Relacionados aos maus tratos físicos: história não condizentes com as lesões, que são relacionadas a um fato acidental; lesão incompatível com a idade da criança; relatos discordantes; suposto acidente acontecido de forma repetida; socorro em lesão muito tempo depois do ocorrido; não comparecimento a consultas da criança; conflito familiar, alcoolismo; histórico familiar de violência a mulher; 

 

Relacionados aos maus tratos psicológico: doenças orgânica; distúrbios do sono; alergias; disfunções físicas ou relacionadas aos afazeres; Fragilidades emocionais; choro fácil; criança pode apresentar medo de ser punida;  Isolamento social; carência afetiva; auto estima baixa; dificuldades de aprendizado, automultipalação ou autocuplabilização; tendência suicida; falta de afeto; depreciação da criança; ato de desmerecimento ou aterrorizando.

Relacionada ao abuso sexual: observar o relato da vítima, avaliar lesões genitais ou anais após o diagnóstico de Infecção Sexualmente Transmissíveis (IST’s) ou gravidez, ou mesmo por queixa de dor ou incomodo; Sinais corporais, psicossociais e emocionais, legados ao medo, a toque, medo do escuro, de locais fechados, regressão de comportamentos infantis; tristeza e preocupação em agradar os outros; vergonha; culpa; interesse por questões sexuais; masturbação fora da idade considerada normal; relatos sexuais ou apresentação em desenhos.

Saiba mais: Como o isolamento social pela Covid-19 influencia a saúde mental das crianças?

Todo e qualquer comportamento na criança deve ser avaliado criteriosamente. O contato direto com a escola pode facilitar a compreensão dos episódios. Lembre-se esse problema é de todos nós. Enquanto enfermeiros devemos redobrar a atenção e cuidar de nossas crianças. O serviço de saúde também tem o dever de proteger as crianças em vulnerabilidade, por isso é importante o acompanhamento das famílias. Buscar medidas na comunidade pode ser um grande avanço assim como integrar a comunidade em uma campanha que possa modificar a violência estrutural ao vulnerável na sociedade. Na pandemia medidas atípicas terão que ser realizadas a fim de proteger as crianças. Fiquem atentos aos sinais!

Referências Bibliográficas:

  • Distrito Federal. Manual para Atendimento às Vítimas de Violência na Rede de Saúde Pública do Distrito Federal/ Laurez Ferreira Vilela (coordenadora) – Brasília: Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, 2008.
  • Londrina. Prefeitura do Município. Secretaria Municipal de Saúde Protocolo de atendimento as pessoas em situação de violência interpessoal, provocada/ Eni do Carmo de Souza,Jaqueline Dario Copobianco (col.)…[ et all] – Londrina : SMS. 2016.
  • Woiski Ruth Oliveira Santos, Rocha Daniele Laís Brandalize. Cuidado de enfermagem à criança vítima de violência sexual atendida em unidade de emergência hospitalar. Esc. Anna Nery  [Internet]. 2010  Mar [cited  2021  May  18] ;  14( 1 ): 143-150.
  • Platt Vanessa Borges, Guedert Jucélia Maria, Coelho Elza Berger Salema. Violência contra crianças e adolescentes: notificações e alerta em tempos de pandemia. Rev. Paul. Pediatr.  2021;  39: e2020267.
  • Marques Emanuele Souza, Moraes Claudia Leite de, Hasselmann Maria Helena, Deslandes Suely Ferreira, Reichenheim Michael Eduardo. A violência contra mulheres, crianças e adolescentes em tempos de pandemia pela COVID-19: panorama, motivações e formas de enfrentamento. Cad. Saúde Pública  2020;  36( 4 ): e00074420.

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