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A diarreia é definida como a passagem de três ou mais fezes amolecidas ou líquidas em 24 horas. Pode ser classificado pelo tempo de início do quadro em:
- Aguda: < 7 dias;
- Prolongada: 7-14 dias);
- Persistente: 14-29 dias;
- Crônica: 30 dias ou mais.
Caracterizamos como disenteria, a presença de fezes escassas, sanguinolentas e/ou purulentas (muco ou pus).
Uma atualização recente das diretrizes de diarreia infecciosa da IDSA (Infectious Disease Society of America) foi publicada. Destacamos em 2 partes as principais recomendações da publicação.
CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS, DEMOGRÁFICAS E EPIDEMIOLÓGICAS (CDE)
Em pacientes com diarreia, quais características CDE influenciam no diagnóstico e abordagem da diarreia infecciosa (DI)?
- Proceder a anamnese detalhada, especialmente exposição de risco ou história de contactantes próximos (p. ex., familiares, exposição ocupacional) com sintomatologia compatível.
- Sugerem certas causas de DI, e que devem ser investigados na anamnese: consumo de frutos do mar, leite ou sucos não pasteurizados, carnes malcozidas, peixes, ovos ou frutas e vegetais contaminados; exposição à água contaminada; contato com animais ou suas fezes; terapia antimicrobiana recente; viagens internacionais; exposição institucional; prática sexual anal ou oral.
Em pacientes febris ou com disenteria, quais características CDE são relevantes?
- A identificação de alguns patógenos beneficia a instituição de antibioticoterapia compatível: incluindo Salmonella enterica spp., Shigella e Campylobacter.
- Histórico de viagem para regiões endêmicas deve levantar a suspeita de Febres tifoide ou paratifoide, especialmente em vigência de quadro compatível: febre com foco indeterminado e dor abdominal, acompanhada ou não de diarreia ou com focos extra-intestinais de infecção.
Quais características estão associadas com complicações ou doença grave?
- Desidratação, em qualquer paciente independente da faixa etária:
– Especialmente na Síndrome Hemolítico-Urêmico pós-diarreica, em que a desidratação está associada a um maior risco de diálise.
– Risco de distúrbios eletrolíticos, choque não-traumático e injuria renal aguda.
LEIA MAIS: Anti-histamínicos podem ajudar pacientes com diarreia crônica
DIAGNÓSTICO
Indicação de testes diagnósticos:
- Investigar infecção por Salmonella, Shigella, Campylobacter, Yersinia, C. difficile e E. coli produtora de toxina Shiga em pacientes com diarreia febril, com presença de muco ou sangue, dor e irritação abdominal ou sinais de sepse.
- Pesquisa para Yersinia entorocolitica em quadro de diarreia com dor abdominal persistente (especialmente em escolares com dor em quadrante inferior direito, simulando apendicite), e em vigência de febre e risco epidemiológico para yersinose, incluindo crianças com exposição direta ou indireta a carnes suínas cruas ou malcozidas. Lembrando que a yersinose pode estar associada a aneurismas micóticos em adultos e idosos.
- Considerar E. coli produtora de Shiga em pacientes com diarreia sanguinolenta, mesmo na presença de febre, mas principalmente na sua ausência. Nestes casos, é importante a realização de testes que identifiquem a toxina ou os genes que a codificam, e cultura para identificação de E. coli enterohemorrágica (O157:H7) ou outras produtoras de Shiga.
- Indicações de hemocultura:
– Menores de 3 meses de idade;
– Sinais de sepse;
– Suspeita de febre tifoide ou paratifoide;
– Manifestações sistêmicas de infecções;
– Imunocomprometidos;
– Risco aumentado para anemia hemolítica;
– Viajantes de áreas endêmicas de febre tifoide ou paratifoide com quadro compatível. - Em imunodeficientes, especialmente com síndrome da imunodeficiência adquirida com diarreia persistente, deve-se pesquisar por patógenos oportunistas, como:
– Cryptosporidium
– Cyclospora
– Cystoisospora
– Microsporidia
– Mycobacterium avium complex (MAC) - Cuidado com o diagnóstico diferencial: Diarreia secundária à terapia antirretroviral e à quimioterapia, são causas não infecciosas de diarreia persistente em imunocomprometidos.
- Se diarreia do viajante:
– Diarreia persistente por mais de 14 dias indica pesquisa de parasitoses intestinais;
– Pesquisa de C. difficile está indicada em viajantes com diarreia e história de uso de recente de antimicrobianos (últimos 2-3 meses).
– Considerar epidemiologia local da viagem.
– Considerar doença inflamatória intestinal e síndrome do intestino irritável pós-infecciosa como diagnósticos diferenciais.
Novo medicamento para tratamento da diarreia do viajante é aprovado
Diarreia Infecciosa por Clostridium difficile (C. diff)
- Suspeitar em pacientes com mais de 2 anos de idade e diarreia persistente seguida por uso de antimicrobiano nos últimos 28 dias.
- Antimicrobianos mais associados: cefalosporinas, beta-lactâmicos/inibidores da beta-lactamase, clindamicina e quinolonas.
- Considerar em diarreias iniciadas durante internações hospitalares (com mais de 72 horas após admissão).
- Colonização é comum em pacientes hospitalizados ou institucionalizados, não sendo recomendada a pesquisa em assintomáticos.
Relevância de exames complementares como leucócitos fecais, lactoferrina e calprotectina:
- Leucócitos fecais: pode diferenciar diarreia inflamatória de infecciosa, porém não recomendado para identificar a causa da diarreia infecciosa aguda.
- Lactoferrina: Substituto para os leucócitos fecais. Está presente em doenças inflamatórias não infecciosas, apresentando assim especificidade reduzida para diarreias infecciosas. Importante ressaltar que trata-se de componente normal no leite humano, podendo estar presente em fezes de lactentes em graus variados.
- Calprotectina fecal: Indicação não estabelecida.
Exames não miocrobiológicos:
- Na Síndrome Hemolítico-Urêmica, deve-se monitorar frequentemente: hemoglobina, plaquetas, dismorfismo eritrocitário, eletrólitos e creatinina, para detecção precoce de anormalidades hematológicas e renais.
- Em paciente com doença diarreica, queda na contagem de plaquetas nos primeiros 14 dias apresenta risco aumentado de síndrome hemolítico-urêmica.
- Endoscopia com biópsia de intestino delgado: útil para investigação de infecção por complexo Micobacterium avium e microsporidiose.
- Na suspeita de colite, sigmoidoscopia com biópsia de mucosa pode ser útil na diferenciação de colite infecciosa e inflamatória, infecção por CMV ou colite por C. diff.
- Proctoscopia: para investigação de proctite, especialmente em pacientes com prática sexual anal.
- Aspirado duodenal: diagnóstico de giardíase e estrongiloidíase em pacientes com diarreia persistente e pesquisa fecal indefinida ou negativa.
- Na SIDA, considerar endoscopia ou proctoscopia, na presença de diarreia persistente, sem causa definida.
- Exames de imagem (USG, TC, RM) para avaliação de complicações em infecções invasivas por Salmonella ou Yersinia, na presença de febre persistente ou bacteremia.
Leia a parte 2 aqui.
Autor:
Referências:
- SHANE L.A., et. al. Clinical Infectious Diseases, Volume 65, Issue 12, 29 November 2017, Pages e45–e80. Disponível em: https://doi.org/10.1093/cid/cix669