Dieta vegana: estudo mostra que o metabolismo é remodelado em crianças

Estudo mostra que crianças adeptas a dieta vegana têm metabolismo notavelmente alterado e apresentam níveis mais baixos de vitaminas A e D.

A dieta vegana está ganhando cada vez mais popularidade entre as sociedades ocidentais, e um número crescente de crianças nasce de mães que adotam essa filosofia. No entanto, o conhecimento sobre as consequências metabólicas de uma dieta vegana estrita em bebês e crianças é escasso, o que atualmente pode levar a visões conflitantes entre os profissionais de saúde e as famílias. 

Recentemente, pesquisadores da Universidade de Helsinki, na Finlândia, observaram que crianças veganas têm metabolismo notavelmente alterado e apresentam níveis mais baixos de vitaminas A e D quando comparadas a crianças que não fazem essa dieta. O estudo Vegan diet in young children remodels metabolism and challenges the statuses of essential nutrients foi publicado na edição de janeiro de 2021 do jornal EMBO Molecular Medicine.

dieta vegana

Estudo da dieta vegana em crianças: metodologia

Foi realizado um estudo transversal em que foram recrutadas 40 crianças (sendo 21 meninos) de origem finlandesa das mesmas creches, com idade mediana de 3,5 anos. As crianças foram divididas em: veganas (6), vegetarianas (10) ou onívoras (24). Elas desfrutaram de refeições planejadas por nutricionistas na creche, e as dietas completas foram analisadas com questionários e registros alimentares. Todos os participantes veganos seguiram uma dieta vegana desde o nascimento e foram amamentados por 13–50 meses por mães veganas. Além disso, todos os participantes veganos haviam sido desmamados por um período superior a um ano antes do estudo, e nenhum deles estava sendo amamentado quando os dados foram coletados. Todas as crianças que participaram da pesquisa eram aparentemente saudáveis, sem relato de uso de medicação sistêmica, de acordo com os questionários. 

A Finlândia é um país de alta renda com creches públicas de excelente qualidade, disponíveis para as famílias durante os seis primeiros anos de vida das crianças. Até 75% das crianças finlandesas frequentam creches públicas, que oferecem refeições diárias planejadas e gratuitas por nutricionistas. Esse sistema uniforme oferece uma excelente oportunidade para estudar os efeitos da dieta vegana em crianças pequenas. 

Resultados

Os pesquisadores descreveram que não foram encontradas diferenças entre os grupos de dieta nos escores z de altura, índice de massa corporal (IMC) ou circunferência do braço. A avaliação dietética mostrou que os veganos ingeriram maior ingestão de folato e receberam menores proporções de energia de proteína e de ácidos graxos saturados do que os onívoros. A análise detalhada da metabolômica e de biomarcadores séricos indicou insuficiência de vitamina A e vitamina D suficiente, porém limítrofe, em todos os participantes veganos. Além disso, os resultados mostraram que os estados de transtirretina, aminoácidos essenciais, proteína ligante de retinol (responsável pelo transporte de vitamina A), ácido docosahexaenóico (DHA) e colesterol (incluindo total, LDL e HDL) de crianças veganas foram menores do que os de onívoros, ajustados por idade. Os padrões de ácido lipidômico e biliar dos veganos também eram distintos.

Todas as crianças veganas participantes usaram vitamina B12 regular e todas, exceto uma, usaram vitamina D regular e suplementação de iodo, indicando que as famílias veganas finlandesas estão bem familiarizadas com as necessidades nutricionais previamente conhecidas das dietas veganas. No entanto, as recomendações nutricionais atuais são baseadas em estudos conduzidos em veganos adultos, e não existem estudos prévios sobre os efeitos metabólicos das dietas veganas em crianças.

Conclusões

A abstenção de qualquer alimento de origem animal pode ser motivada por motivos ecológicos, éticos, de saúde ou religiosos. Os efeitos positivos das dietas veganas incluem IMC, colesterol não HDL e glicemia de jejum mais baixos, com base em estudos em adultos veganos ou conclusões extrapoladas de estudos com vegetarianos. 

Estudos mostram que adultos que seguem uma dieta vegana têm um risco reduzido de diabetes tipo 2,  doença cardíaca isquêmica e todos os cânceres combinados, mas um risco aumentado de fraturas ósseas e hemorragias cerebrais. Os nutrientes considerados potencialmente críticos incluem proteínas, vitamina B12, iodo, vitamina D, cálcio, ferro, zinco, ácidos graxos n-3 de cadeia longa, riboflavina e vitamina A. Recomenda-se que uma dieta vegana completa seja sempre suplementada com vitamina B12, vitamina D e iodo e, com base na avaliação individual, a suplementação de cálcio, vitamina B2, ferro e zinco pode ser necessária.

As crianças requerem mais energia e nutrientes por unidade de peso corporal do que os adultos para garantir o crescimento e o desenvolvimento normal dos sistemas neural, endócrino e imunológico. Portanto, os pesquisadores destacam que as recomendações dietéticas para crianças não podem ser extrapoladas das conclusões dos estudos envolvendo adultos veganos. Além disso, estudos com crianças vegetarianas fornecem informações limitadas sobre veganos, pois a inclusão de alimentos de origem animal na dieta muda a ingestão de vários nutrientes e o perfil metabólico plasmático significativamente em relação aos onívoros. 

O estudo indica que crianças veganas apresentam diferenças metabólicas notáveis quando comparadas a crianças onívaras. Os dados demonstram que a dieta vegana estrita afeta o metabolismo de crianças saudáveis, mostrando a importância de realizar mais estudos longitudinais e transversais detalhados sobre os efeitos nutricionais e na saúde de uma dieta vegana, antes que ela possa ser recomendada para bebês ou crianças maiores.

Posicionamento da SBP sobre a dieta vegana em crianças

No Brasil, o Departamento de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) considera que uma dieta vegetariana é pouco segura para crianças e adolescentes, devido à necessidade de vitaminas e minerais contidos em produtos animais, em especial ferro, zinco e vitamina B12. Além disso, enfatiza a relevância do consumo de gordura saturada nos primeiros dois anos de vida da criança, para desenvolvimento e também mielinização neural. A SBP descreve que a dieta vegetariana é rica em fibras, e isso pode dificultar a absorção de várias vitaminas, principalmente as lipossolúveis (A,D,E) e de minerais (cálcio, zinco, ferro). Para a SBP, um indivíduo vegetariano pode ser classificado em: ovolactovegetariano (consome ovos, leite e laticínios na alimentação), lactovegetariano (não consome ovos, mas ingere leite e laticínios), ovovegetariano (não consome laticínios, porém ingere ovos), vegetariano (não consome quaisquer derivados de animais em sua alimentação) e vegano (não consome nenhum alimento que seja derivado de animais em sua alimentação, tampouco produtos ou roupas contendo estes alimentos, além de qualquer diversão que seja às custas de exposição animal, como aquários e zoológicos). Segundo a SBP, as classes que ocasionam menores riscos à saúde são ovolactovegetariano, lactovegetariano e ovovegetariano.

A SBP orienta que, para que a quantidade de calorias necessária para o crescimento ideal da criança seja atingida, é necessário aumentar o volume da ingestão, mas isso pode extrapolar a capacidade do estômago da criança. Pode-se adquirir proteínas por meio de leguminosas, mas é crucial que haja uma variedade dos alimentos para que os aminoácidos essenciais sejam consumidos. Em vegetarianos, o consumo de gorduras é reduzido, de uma forma geral. 

Além disso, o consumo aumentado de alimentos ricos em ômega-6 pode prejudicar a conversão de ômega-3 em DHA e ácido eicosapentaenoico, fundamentais para mielinização e formação da retina. O maior consumo de fibras pode reduzir a biodisponibilidade de vitaminas. Os fitatos existentes em leguminosas, fibras e os polifenois (chás), podem diminuir a absorção do ferro, zinco e cálcio. A vitamina B12, contida em produtos animais, deve ser suplementada. Por fim, na maior parte dos casos, a orientação nutricional isolada não é suficiente, havendo necessidade da suplementação de nutrientes em risco de deficiência. São eles: cálcio, ferro, zinco, vitaminas D, B1, B2, B6 e B12.

 

Referências bibliográficas:

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