Doenças inflamatórias intestinais: quais são as manifestações dermatológicas?

Com objetivo de descrever alterações mucocutâneas em doenças inflamatórias intestinais, pesquisadores evidenciaram as lesões mais relevantes. Saiba mais.

As doenças inflamatórias intestinais (DII) são caracterizadas por seu caráter crônico, inflamatório e imunomediado de acometimento multissistêmico, e que afeta de forma predominante o trato gastrointestinal (TGI), os sistemas musculoesquelético, cutâneo e ocular em diferentes espectros. As principais DII são a doença de Crohn (DC) e a retocolite ulcerativa (RCU) em sua forma clássica. As complicações fora do TGI são denominadas extraintestinais, presentes entre 5% e 50% dos pacientes com DII

Doenças_inflamatórias_intestinais

Revisão 

Com o objetivo de descrever as alterações mucocutâneas presentes nas doenças inflamatórias intestinais , um grupo de pesquisadores da Itália, através de um artigo de revisão, evidenciaram as lesões mais prevalentes e relevantes, divididas nos seguintes grupos: 

Manifestações específicas com as mesmas características histológicas da DII ocorrendo apenas na DC:

  • DC metastática: 

– Manifestação  rara da DC que se caracteriza por alterações com substrato histopatológico semelhante ao encontrado na parede intestinal, localizada longe do TGI como, em casos extremamente raros, nas axilas. 

  • Lesões contínuas / contíguas:

– Caracterizadas por eritema perianal,  abscessos e fístulas, ocorrendo em até 50% dos pacientes.

Distúrbios cutâneos diretamente associados às doenças inflamatórias intestinais :

– Caracterizada por úlceras dolorosas redondas ou ovais com base pseudomembranosa e bordas eritematosas geralmente localizadas, presentes em cerca de 10% dos pacientes.

  • Eritema nodoso:

– É a manifestação cutânea mais comum das doenças inflamatórias intestinais , presente em até 10% dos pacientes com RCU e chegando a cerca de 15% nos pacientes com DC, sendo mais prevalente em pacientes do sexo feminino.Ocorre geralmente em concomitância com artrite e doença ativa.

  • Psoríase:

– É uma doença eritemato-escamosa que ocorre mais frequentemente na DC (11,2%) do que na RCU (5,7%). Pontos epidemiológicas principais: (1) maior incidência de psoríase em pacientes com DII; (2) predisposição para  DII pacientes com psoríase, e ( 3) alto risco de lesões psoriáticas iatrogênicas em pacientes com DII tratados com agentes antifatores de necrose tumoral (anti-TNF). As lesões estão presentes em cerca  de 7a 11% dos pacientes com DII. É importante ressaltar que não há relação entre a gravidade da psoríase e a atividade de doenças inflamatórias intestinais . 

  • Epidermólise bolhosa adquirida:

– Cerca de 30% dos pacientes com essa manifestação cutânea também são afetados por DII, principalmente DC. Clinicamente, é caracterizada por fragilidade da pele, formação de bolhas e cicatrizes, predominantemente localizadas em locais de fricção, como mãos, joelhos e pés.

Manifestações mucocutâneas reativas de DII:

  • Pioderma gangrenoso:

– É uma manifestação cutânea grave da DII, ocorrendo em cerca de 1–2% dos pacientes. Pode se manifestar antes, durante ou após o início das manifestações da DII e pode exibir um curso clínico independente. Está mais frequentemente associada à RCU, tendo  predomínio em pacientes do sexo feminino e afetando mais frequentemente os pacientes de origem negra africana. Cerca de 50% dos pacientes têm DII subjacente. Uma  base da úlcera é necrótica e pode ser afetada por infecção secundária.  As lesões inicialmente se apresentam como pápulas, pústulas ou nódulos, que rapidamente tendem a ulcerar, desenvolvendo uma ulceração dolorosa com bordas violáceas elevadas, desde isoladas a múltiplas. Sintomas sistêmicos, como febre e  artralgia também podem estar associados.

  • Síndrome de Sweet:

– É uma dermatose neutrofílica aguda, caracterizada por pápulas e placas eritematosas, envolvendo principalmente o rosto, pescoço e membros superiores. Essa associação com doenças inflamatórias intestinais é pouco frequente e é mais prevalente na DC do que na RCU.

  • Síndrome de artrite-dermatose associada ao intestino:

– É uma dermatose neutrofílica incomum, caracterizada por febre, artralgia, mialgia, dor abdominal e acometimento da pele. As lesões geralmente são polimórficas, mimetizando outras dermatoses. Sua patogênese exata não é clara, tem sido sugerido que pode ser devido a um crescimento excessivo de bactérias intestinais, gerando uma disbiose e levando à deposição de imunocomplexos na pele e nas articulações.

  • Síndrome de abscesso asséptico:

– Apresenta-se com febre, dor abdominal e abscessos neutrofílicos assépticos, que podem atingir diversos órgãos, sendo principalmente localizados no baço.

  • Piodermatite:

– Manifestação mucocutânea rara associada com DII, mais frequentemente com RCU. Ela é caracterizada por lesões vesiculares e papulopustulosas, principalmente no couro cabeludo, face, axilas e virilhas.

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Manifestações mucocutâneas secundárias ao tratamento:

  • A prevalência de reações cutâneas induzidas por antagonistas do TNF-α entre pacientes com DII varia de 5 a 10%. Os eventos adversos podem ser cutâneos, localizados ou generalizados. Reações locais podem ocorrer após a administração de adalimumabe, por exemplo, sendo uma das reações mais comuns (geralmente ocorrem no primeiro mês de tratamento como lesões eritemato-edematosas ou eczematiformes no local da injeção, associadas a prurido ou dor), e desaparecem, em geral, com cerca de  3–5 dias, sendo importante frisar que  não exigem a descontinuação do medicamento. 
  • As reações à infusão podem ocorrer com o infliximabe e são divididas em reações de hipersensibilidade imediatas e tardias. As tardias são as mais observadas, apresentando-se 1–2 semanas após a infusão, como erupção cutânea eritematosa, edema facial e nas mãos, febre e, até mesmo, artralgia e mialgia. Já as reações de hipersensibilidade imediata ocorrem nas primeiras duas horas após o início da infusão e são caracterizadas pelo aparecimento de lesões urticariformes, eritemas difusos e anafilaxia. 

Complicações infecciosas:

– Há um aumento da prevalência de infecções oportunistas bacterianas, virais e fúngicas em pacientes tratados com agentes anti-TNF-α. A reativação dos vírus do herpes, particularmente do vírus da varicela zoster (VZV), foi documentada em cerca de 3% dos pacientes, principalmente os que faziam uso de infliximabe e adalimumabe. Por isso, é recomendado não iniciar a terapia biológica durante uma infecção ativa e descontinuar o tratamento no caso de reativação dos VZV.

  • Câncer de pele:

– O aumento da incidência de câncer de pele em pacientes tratados com agentes anti-TNF-α ainda é controverso. Há autores que relataram um risco aumentado para cânceres de pele não melanoma, particularmente carcinomas basocelulares.

Manifestações secundárias à má absorção nutricional:

  • Lesões comumente associadas a deficiências:

– Estomatite, glossite, queilite angular (vitamina B), pelagra (niacina), acrodermatite enteropática (zinco), escorbuto (vitamina C) e púrpura (vitamina C e K). Em menor proporção, dermatite seborreica e anormalidades nos cabelos e nas unhas também podem ser encontradas. 

Conclusão 

Através desse artigo de revisão, é possível evidenciar e reafirmar sobre as múltiplas possibilidades de manifestações mucocutâneas presentes nos pacientes com DII, sendo assim, de fundamental importância e indispensável uma avaliação do médico dermatologista experiente das lesões de pele apresentadas por esses pacientes.  Em algumas situações, a avaliação concomitante do reumatologista é imprescindível para melhor elucidação diagnóstica.  Nos pacientes candidatos a terapias biológicas, uma avaliação  dermatológica pré-início da instituição do tratamento deve ser ponderada. 

Referência bibliográfica:

  • Antonelli, E., Bassotti, G., Tramontana, M., Hansel, K., Stingeni, L., Ardizzone, S., Genovese, G., Marzano, A. V., & Maconi, G. (2021). Dermatological Manifestations in Inflammatory Bowel Diseases. Journal of clinical medicine, 10(2), 364. https://doi.org/10.3390/jcm10020364
  • Kafity, A. A., Pellegrini, A. E., & Fromkes, J. J. (1993). Metastatic Crohn’s disease. A rare cutaneous manifestation. Journal of clinical gastroenterology, 17(4), 300–303.

 

 

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