Dupla antiagregação plaquetária após angioplastia e risco de sangramento

Os principais guidelines atuais recomendam dupla antiagregação plaquetária por um ano após angioplastia pós-síndrome coronariana aguda (SCA).

Estudos randomizados demonstram a superioridade do stent farmacológico em comparação ao não farmacológico em pacientes com alto risco hemorrágico e em uso de dupla antiagregação plaquetária (DAPT) por um mês após a angioplastia. No entanto, uma questão importante é a duração ideal da DAPT após o implante de stent farmacológico, principalmente na presença de fatores de risco para sangramento. Análises sobre a terapia por um mês após a angioplastia sugerem que há redução do risco de sangramento, sem comprometimento da segurança. Mas vale ressaltar que a maioria delas foi não randomizada, incluiu indivíduos com baixo risco isquêmico e excluiu indivíduos com alto risco de sangramento, o que deve ser considerado quando os resultados são analisados.

Os principais guidelines atuais recomendam DAPT por um ano após angioplastia pós-síndrome coronariana aguda (SCA); se alto risco de sangramento, pode-se suspender a terapia após seis meses. Por outro lado, após angioplastia eletiva, recomenda-se DAPT por seis meses, sendo reduzida para três meses quando há alto risco hemorrágico.

Leia também: Manejo do paciente em uso de dupla antiagregação plaquetária e candidato à cirurgia não cardíaca

Em agosto de 2021, o estudo MASTER DAPT foi apresentado no European Society of Cardiology (ESC 2021), cujo objetivo foi avaliar a DAPT abreviada versus padrão após angioplastia com implante de stent farmacológico bioabsorvível eluído com sirolimus (ULTIMASTER™). Tratou-se de estudo multicêntrico (envolvendo trinta países), randomizado e aberto.

Dupla antiagregação plaquetária após angioplastia e risco de sangramento

Master DAPT

Depois de um período de 33-40 dias após angioplastia, 4.579 indivíduos foram randomizados: 2.295 no grupo de terapia abreviada versus 2.284 no grupo de terapia padrão. A mediana de idade foi de 76 anos, e cerca de 70% dos pacientes eram do sexo masculino. A estratificação foi feita de acordo com o sítio do estudo, história de infarto agudo do miocárdio (IAM) nos últimos doze meses e indicação de anticoagulação oral por doze meses.

Critérios de inclusão:

  • Doença arterial coronariana ou SCA;
  • Angioplastia de, pelo menos, um vaso;
  • Ausência de programação de nova revascularização;
  • Presença de, pelo menos, um critério para alto risco de sangramento.

Critérios de exclusão

  • Ocorrência de evento cardiovascular adverso no primeiro mês após angioplastia (recorrência de SCA, reestenose sintomática, trombose de stent, acidente vascular encefálico ou revascularização que exigisse DAPT prolongada);
  • Implante de stent que não o ULTIMASTER™ nos seis meses que precederam a angioplastia;
  • Implante de stent bioabsorvível prévio à angioplastia;
  • Necessidade de tratamento para reestenose intrastent ou trombose de stent.

Randomização

  • Grupo de terapia abreviada: a DAPT era feita por um mês. Em seguida:
    • Se não houvesse indicação de anticoagulação oral, era mantido um único agente antiplaquetário por, pelo menos, onze meses;
    • Se houvesse indicação de anticoagulação oral, era mantido um único agente antiplaquetário por cinco meses e era feita a anticoagulação oral por, pelo menos, onze meses.
  • Grupo de terapia padrão:
    • Se não houvesse indicação de anticoagulação oral, a DAPT era continuada por, pelo menos, seis meses. Em seguida, o inibidor P2Y12 poderia ser retirado, mantendo-se apenas o AAS, a fim de completar um ano de antiagregação;
    • Se houvesse indicação de anticoagulação oral, a DAPT era feita por três meses. Em seguida, a monoterapia antiagregante era realizada até completar um ano após a angioplastia. A anticoagulação oral era feita por, pelo menos, onze meses, iniciando no segundo mês após o procedimento.

A escolha do inibidor P2Y12 e o tipo de monoterapia antiplaquetária ficaram a critério do investigador. Clopidogrel foi o inibidor P2Y12 mais utilizado no grupo de terapia padrão e como monoterapia no grupo de terapia abreviada. 

Desfechos primários

  • Net adverse clinical events (NACE) = morte por qualquer causa, IAM, acidente vascular encefálico (AVE) e sangramento maior (BARC tipo 3 ou 5). Feita avaliação de não inferioridade;
  • Eventos adversos maiores cardíacos ou cerebrais = morte por qualquer causa, IAM e AVE. Feita avaliação de não inferioridade;
  • Sangramento maior ou clinicamente relevante (BARC tipo 2, 3 ou 5). Feita avaliação de superioridade.

Observa-se que os desfechos primários englobam os desfechos de eficácia (risco de trombose) e de segurança (risco de sangramento).

A escala de Barc (Bleeding Academic Research Consortium) é utilizada para classificar os sangramentos:

  • Tipo 1: sangramento de pequena monta que não demanda atendimento médico ou internação hospitalar;
  • Tipo 2: qualquer sinal de hemorragia, que não preencha critérios dos tipos 3, 4 ou 5, mas com, pelo menos, um dos seguintes critérios: necessidade de intervenção médica não cirúrgica; necessidade de internação hospitalar ou aumento do nível de cuidados; ou necessidade de avaliação clínica imediata;
  • Tipo 3: sangramento associado à queda de hemoglobina ou com necessidade de hemotransfusão, associado a tamponamento cardíaco, ou com necessidade de controle cirúrgico (exceto dentário, nasal, cutâneo e hemorroidário) ou de drogas vasoativas;
  • Tipo 4: sangramento relacionado à cirurgia de revascularização (sangramento intracraniano perioperatório dentro de 48 horas, reoperação após fechamento de esternotomia para controle de sangramento, transfusão de, pelo menos, cinco concentrados de hemácias em um período de 48 horas, sangramento pelo dreno torácico de, pelo menos, dois litros em 24 horas);
  • Tipo 5: sangramento fatal.

Os desfechos secundários foram: morte por qualquer causa, IAM ou AVE; morte cardiovascular ou por causas não cardiovasculares; trombose de stent presumida ou confirmada; e qualquer evento de sangramento.

Saiba mais: AVC isquêmico: mono ou dupla antiagregação plaquetária?

Achados

A interrupção da DAPT após angioplastia com 34 dias foi não inferior (primeiro e segundo desfechos primários) e superior (terceiro desfecho primário), em comparação com a manutenção da DAPT por 193 dias.

A incidência de sangramento maior ou clinicamente relevante foi de 6,5% no grupo de terapia abreviada versus 9,4% no grupo de terapia padrão, sendo principalmente devido à baixa ocorrência de sangramento BARC tipo 2.

Os desfechos secundários foram semelhantes entre os grupos.

O estudo difere de análises prévias que excluíram pacientes com SCA e limitaram número, sítio ou complexidade das lesões. Por ser mais abrangente, seus resultados podem ser generalizados com maior facilidade. No entanto, deve-se ter cautela ao extrapola-los para a população que não apresenta alto risco de sangramento ou que foi submetida a implante de outros tipos de stent.

Algumas limitações do estudo podem ser destacadas. Por exemplo, o tempo de DAPT foi heterogêneo no grupo de terapia padrão, e o grupo de terapia abreviada apresentou grande variabilidade do esquema de monoterapia. Além disso, a duração da DAPT em ambos os grupos foi maior do que é atualmente recomendando para pacientes com indicação de anticoagulação oral.

Conclusão

A descontinuação da dupla antiagregação plaquetária 34 dias após angioplastia com implante de stent farmacológico bioabsorvível eluído com sirolimus em pacientes com alto risco de sangramento reduz incidência de morte por qualquer causa, IAM, AVE e sangramentos maiores ou clinicamente relevantes (BARC tipo 2, 3 ou 5).

Referências bibliográficas:

  • Valgimigli M, et al. Dual antiplatelet therapy after PCI in patients at high bleeding risk. New England Journal of Medicine. 2021. doi: 10.1056/NEJMoa2108749.
  • Rao SV, Mehran R. Evaluating the bite of the BARC. Circulation. 2012;125:1344–1346. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.112.093856

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