Estrongiloidíase: aspectos do tratamento com ivermectina

Estrongiloidíase é uma helmintíase causada por Strongyloides stercoralis, com prevalência estimada de 30 a 100 milhões de casos no mundo.

Enquanto a maioria das infecções crônicas é assintomática, em imunossuprimidos a estrongiloidíase pode se tornar uma infecção disseminada e potencialmente fatal. Atualmente, o tratamento de escolha da estrongiloidíase é com ivermectina.

Em comparação ao albendazol, a ivermectina tem um perfil de segurança semelhante e eficácia superior. Esquemas terapêuticos envolvendo múltiplas doses já foram investigados, sem evidências científicas que corroborem qualquer um deles. Ao mesmo tempo, o melhor manejo de indivíduos com doença disseminada também é incerto.

médico prescrevendo mediamento para estrongiloidíase

Tempo de tratamento: dose única ou 4 dias?

Um estudo multicêntrico, realizado na Itália, Reino Unido e Espanha, procurou avaliar se múltiplas doses de ivermectina seriam um esquema terapêutico superior ao de dose única para o tratamento de estrongiloidíase não disseminada.

O estudo envolveu hospitais de referência para doenças parasitárias tropicais, considerados bem equipados e com grande experiência no diagnóstico laboratorial de parasitoses.

Os participantes elegíveis — adultos com diagnóstico de estrongiloidíase não disseminada — foram randomizados para receber ivermectina 200 mcg/kg (com dose máxima de 21 mg) em dose única no dia 1 ou na forma de um esquema com quatro doses nos dias 1, 2, 15 e 16.

No dia 17, todos os participantes tiveram sangue coletado para análise de hemograma e dosagem de enzimas hepáticas, além de pesquisa de sintomas ou eventos adversos. Exames laboratoriais e diagnósticos foram repetidos com 6 e 12 meses após o término do tratamento.

Leia também: Ivermectina: As atuais evidências científicas e controvérsias anti-Covid-19

Trezentos e nove participantes foram recrutados: 155 para o grupo de dose única e 154 no grupo que recebeu quatro doses. Embora o cálculo inicial fosse para inclusão de 400 participantes, o estudo foi interrompido prematuramente porque o comitê considerou que a probabilidade de os resultados serem alterados com aumento no número de participantes era menor do que 1%.

Resultados e conclusões

As características sociodemográficas dos dois grupos não diferiram de forma significativa. A proporção de pacientes com clearance da infecção por S. stercoralis após 12 meses foi de 86% (IC 95% 79 – 91) no grupo que recebeu dose única e de 85% (IC 95% 77 – 90) no grupo com quatro doses, o que não representou diferença estatisticamente significativa.

Na análise segundo o protocolo – quando se excluem os desvios do protocolo – os resultados foram semelhantes (87%; IC 95% 80 – 92% no grupo de dose única vs. 85%; IC 95% 77 – 90 no grupo com 4 doses). Em todas as subanálises realizadas, não houve diferença significativa entre os dois grupos.

Dos 289 participantes que tiveram amostras de sangue coletadas no dia 17, todos possuíam hemograma normal. Somente 11 pacientes apresentaram alterações nos valores séricos de transaminases, mas nenhum com significância clínica. O clearance de infecção após 12 meses foi associado com idade mais jovem, contagens > 400 células/mm³ de eosinófilos no início do estudo e ausência de rash cutâneo. Eventos adversos foram mais comuns no grupo de múltiplas doses, mas a maioria foi considerada leve.

Os resultados mostraram que um esquema com quatro doses não é superior ao esquema em dose única, além de ser menos tolerado. Valores mais altos de eosinófilos e idade mais jovem foram fatores associados com melhor desfecho de cura, o que pode sugerir que uma adequada resposta imune é necessária para uma resposta terapêutica satisfatória.

Saiba mais: O uso de ivermectina em crianças é recomendado? Entenda!

Ivermectina: outros aspectos

Gestação: há poucas informações na literatura sobre a segurança do uso de ivermectina por parte de mulheres grávidas. Uma revisão sistemática com meta-análise realizada por Nicolas et al. não encontrou maior proporção de eventos adversos neonatais e obstétricos – como aborto espontâneo, natimortalidade e anomalias congênitas – após exposição à ivermectina. Entretanto, como todos os estudos incluídos não apresentavam poder suficiente e os estudos caso-controle não foram desenhados especificamente para avaliar a segurança na gestação, o grau de certeza da evidência foi considerado muito baixo. Ivermectina é classificada como fármaco de categoria C.

Amamentação: ivermectina é excretada no leite humano em concentrações baixas, consideradas não deletérias para o recém-nato. Contudo, evidências em relação à segurança do uso de ivermectina por lactantes também são escassas. A Organização Mundial de Saúde somente exclui as lactantes da terapia com ivermectina na primeira semana pós-parto.

Crianças: a administração de ivermectina não é recomendada em crianças menores de 5 anos ou com menos de 15kg. Duas revisões sistemáticas — uma de 2018 conduzida por Wilkins et al. e outra de 2021, por Jittamala et al. — mostraram que o uso de ivermectina na população pediátrica seria bem tolerado, sem nenhum estudo relatando desenvolvimento de eventos adversos graves relacionados à droga.

Idosos: embora frequentemente excluídos de ensaios clínicos, não há evidências consistentes que apontem maior risco de eventos adversos graves na população geriátrica com uso de ivermectina.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Buonfrate D, Salas-Coronas J, Muñoz J, et al. Multiple-dose versus single-dose ivermectin for Strongyloides stercoralis infection (Strong Treat 1 to 4): a multicentre, open-label, phase 3, randomised controlled superiority trial. Lancet Infect Dis 2019 September 23, 2019. DOI: 10.1016/S1473-3099(19)30289-0
  • Buonfrate D, Rodari P, Barda B, Page W, Einsiedel L, Watts MR. Current pharmacotherapeutic strategies for Strongyloidiasis and the complications in its treatment. Expert Opin Pharmacother. 2022 Oct;23(14):1617-1628. DOI: 10.1080/14656566.2022.2114829.