GOLD 2019: quais as novidades na abordagem da DPOC?

A DPOC é uma doença comum, passível de prevenção e tratamento, que apresenta 3 sintomas cardinais: dispneia, tosse e/ou expectoração.

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Foi publicado recentemente o relatório GOLD 2019 – Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease – sobre uma patologia muito frequente nas enfermarias e ambulatórios, a Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). O GOLD foi um programa lançado em 1997, sendo uma parceria entre o National Heart, Lung and Blood Institute, dos EUA, e a OMS, e o relatório funciona na prática como uma diretriz da doença. Nosso objetivo nesta publicação é trazer os principais pontos de diagnóstico e tratamento, focando nas atualizações deste ano.

dpoc

1. Diagnóstico

A DPOC é uma doença comum, passível de prevenção e tratamento, que apresenta 3 sintomas cardinais: dispneia, tosse e/ou expectoração. O tabagismo (incluindo a exposição passiva) é o principal fator de risco. Devemos lembrar também de outros fatores, como os genéticos (incluindo deficiência de alfa-1 antitripsina), exposição a poluição, envelhecimento e desenvolvimento pulmonar prejudicado na infância.

A DPOC deve ser pesquisada em todo paciente com os três principais sintomas da síndrome, bem como nos pacientes assintomáticos com exposição aos fatores de risco.  Mais uma vez, o relatório destaca que não se caracteriza mais os pacientes com DPOC em “enfisematosos” (link puffer) ou “bronquíticos crônicos” (blue bloaters), pois a maioria apresenta características de ambos.

Avaliação clínica

Baseia-se na caracterização da dispneia, o quanto ela impacta na vida do indivíduo, e os sintomas associados. Para isso, temos disponíveis:

  • Escala mMRC: avalia intensidade da dispneia, indo de zero a quatro (tabela 1).
  • Questionário COPD Assessment Test (CAT).
  • St George Respiratory Questionnaire (SGRQ).

O relatório GOLD dá preferência ao SGRQ, considerado como “importante” quando > 25. No CAT, o equivalente é um escore > 10.

Espirometria

Considerada pelo GOLD como padrão-ouro para o diagnóstico da DPOC, cujo o parâmetro é o índice de Tiffenaud (VEF1/CVF) < 0,7. O relatório destaca ainda que um exame entre 0,6 e 0,8 deve ser repetido para melhor avaliação e desconsidera a resposta broncodilatadora, tanto para diferenciar DPOC vs asma, como para prever resposta ao tratamento com corticoide. Este ponto é importante, porque estas associações eram classicamente feitas. O GOLD orienta o seguinte:

VEF1/CVF < 0,7? –>Avalie os sintomas e decida pelo tratamento.

Classificação baseada na gravidade da limitação de vias aéreas na DPOC (baseado no VEF1 pós broncodilatador):

GOLD VEF1
1 – leve ≥ 80% do valor predito
2 – moderado 50-80% do valor predito
3 – grave 30-50% do valor predito
4- muito grave ≤ 30% do valor predito

Para a classificação completa do paciente, precisamos acrescentar além do GOLD 1,2,3 ou 4, o grupo A, B, C ou D. Veremos os grupos na tabela do tratamento.

2. Tratamento

A decisão de quando e como tratar depende predominantemente da avaliação individualizada dos sintomas e risco futuro de exacerbações. Ano passado, publicamos o GOLD aqui no portal e podemos ver que a proposta deste ano é bem diferente, pois estabelece-se uma terapia inicial separada da terapia de acompanhamento. Na diretriz anterior, era orientado um fluxograma diferente do que foi proposto este ano:

Tratamento farmacológico inicial
Exacerbações ≥ 2 GRUPO C   GRUPO D
ou ≥ 1 c/ hospitalização LAMA   LAMA ou
      LAMA + LABA*
      ou ICS + LABA**
       
0 (zero) ou uma exacerbação GRUPO A   GRUPO B
moderada sem internação Broncodilatador   LABA ou LAMA
       
  mMRC 0-1 CAT<10 mMRC ≥ 2 CAT≥ 10

LAMA, antimuscarínico de ação prolongada. LABA, beta-agonista de ação prolongada. ICS, corticoide inalatório.
* Considerar se muito sintomático (ex: CAT>20)

** Considerar se eosinófilos > 300

Além das medidas farmacológicas, são importantes ações complementares, com destaque para:

  • Interrupção do tabagismo
  • Fisioterapia / reabilitação respiratória
  • Vacinação para influenza e pneumococo

Após a implementação da terapia, os pacientes devem ser reavaliados para atingir os objetivos do tratamento, sendo necessário identificar barreiras para o sucesso do tratamento. Após a revisão do paciente da resposta ao início do tratamento, podem ser necessários ajustes no tratamento farmacológico.

Leia mais: DPOC: revefenacina é aprovada para tratamento da doença respiratória

O fluxograma de acompanhamento independe do grupo inicial do paciente. Devemos, durante o acompanhamento, fazer duas perguntas:

O paciente tem dispneia?

Para pacientes com dispneia persistente ou limitação ao exercício em uso de broncodilatador de ação prolongada em monoterapia, recomenda-se o uso de dois broncodilatadores.

  • Se a adição de um segundo broncodilatador de ação prolongada não melhorar os sintomas, sugere-se que o tratamento pode ser descalonado novamente à monoterapia. A troca de dispositivo inalatório pode ser considerada.

Para pacientes com dispneia persistente ou limitação ao exercício em uso de LABA / ICS, pode-se adicionar LAMA para escalonar a terapia tripla.

  • Alternativamente, a mudança de LABA / ICS para LABA / LAMA deve ser considerada se a indicação original de ICS foi inadequada (por exemplo, um ICS foi usado para tratar sintomas na ausência história de exacerbações), ou houve uma falta de resposta ao tratamento com ICS, ou há efeitos colaterais de ICS que garantem a interrupção.

Em todos os estágios, a dispneia por outras causas (não a DPOC) devem ser investigadas e tratadas adequadamente. A técnica de inalação e a aderência devem ser consideradas causas de resposta inadequada ao tratamento.

Ocorreu exacerbação?

Para pacientes com exacerbações persistentes em monoterapia com broncodilatador de longa duração, é recomendado escalonamento LABA/LAMA ou LABA/ICS.

  • O LABA / ICS pode ser preferido para pacientes com história ou achados sugestivos de asma. A contagem de eosinófilos no sangue pode identificar pacientes com probabilidade de uma resposta benéfica ao ICS. Para pacientes com uma exacerbação por ano, um nível sérico ≥ 300 eosinófilos / µl identifica pacientes com maior probabilidade de responder ao tratamento com LABA/ICS.
  • Para doentes com ≥ 2 exacerbações moderadas por ano ou pelo menos uma exacerbação grave que exija hospitalização no ano anterior, o tratamento com LABA/ICS pode ser considerado nas contagens de eosinófilos no sangue ≥ 100 células / µl, pois os efeitos do ICS são mais pronunciados em pacientes com maior frequência de exacerbação e / ou gravidade.

Em doentes que desenvolvem outras exacerbações na terapêutica com LABA/LAMA, são sugeridos dois caminhos.

  1. Se contagem de eosinofilos ≥ 100 células / µl considerar terapia com LABA/LAMA/ICS.
  2. Adicionar roflumilaste ou azitromicina se eosinófilos no sangue <100 células / µl.

Em doentes que desenvolvam outras exacerbações com o tratamento LABA/ICS, recomenda-se a escalada para terapia tripla, adicionando um LAMA. Alternativamente, o tratamento pode ser mudado para LABA/LAMA caso haja falta de resposta ao tratamento com ICS, ou se os efeitos colaterais de ICS justificarem a descontinuação.

Se o paciente com LABA/LAMA/ICS ainda sofrer exacerbações, as seguintes opções podem ser consideradas:

  • Adicionar roflumilaste, caso o paciente tenha VEF1 < 50% do predito e bronquite crônica, particularmente se eles tiveram pelo menos uma hospitalização por um exacerbação no ano anterior.
  • Adicionar um macrolídeo. As evidências indicam o uso de azitromicina, especialmente em aqueles que não são fumantes atualmente. Lembrar que isso pode culminar em germes resistentes.
  • Parar o ICS se houver efeitos adversos (como pneumonia) ou relatos de falta de eficácia. No entanto, uma contagem de eosinófilos no sangue ≥ 300 células / µl pode indicar maior probabilidade de sofrer mais exacerbações após retirada de ICS.

O GOLD 2019 traz como destaque:

  • Os algoritmos de tratamento foram atualizados. Nesta edição do GOLD, temos uma tabela para início da terapia, com base no Grupo GOLD de cada paciente
  • Um algoritmo separado é fornecido para a continuidade do tratamento, em que o gerenciamento ainda é baseado em sintomas e exacerbações, mas as recomendações não dependem do grupo GOLD.
  • Estas recomendações incorporam evidências recentes de ensaios clínicos e o uso de contagem de eosinófilos no sangue periférico como um biomarcador para orientar o uso de terapia com ICS para prevenção de exacerbações.
  • Com relação a exacerbações, budesonida nebulizada sozinha pode ser uma alternativa adequada para o tratamento de exacerbações em pacientes e fornece benefícios similares metilprednisolona intravenosa, embora a escolha entre essas opções possa depender de problemas relacionados ao custo.

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