Gonorreia: em busca de alternativas de tratamento

A gonorreia é a 2ª doença bacteriana sexualmente transmissível mais prevalente no mundo, estando atrás apenas da sífilis.

A gonorreia é a segunda doença bacteriana sexualmente transmissível mais prevalente no mundo (em primeiro lugar está a sífilis) e, em 2012, a OMS estimou em 78 milhões os novos casos globais da doença em adultos (entre 16 e 49 anos). Desses casos, acredita-se que 11 milhões tenham sido diagnosticados nas Américas.

Nos últimos anos, a Neisseria gonorrhoeae vem ganhando espaço no meio científico não só pelo aumento assustador de novos casos, mas também pela sua capacidade de se tornar resistente aos antimicrobianos utilizados em seu tratamento desde os anos 70-80, como: sulfas, penicilinas, macrolídeos e quinolonas. O aparecimento de resistência in vitro e in vivo, resultando em falha de tratamento, também com as cefalosporinas de espectro estendido (como ceftriaxona), vem causando preocupação mundial. Dessa forma, a OMS iniciou um plano de contingência de ação global incentivando a pesquisa de alternativas de tratamento para gonorreia.

medico segurando na mao opcoes de tratamento para gonorreia

Alternativas para o tratamento da gonorreia

Esse ano foi publicado na Lancet o estudo G-ToG, um ensaio clínico randomizado de não inferioridade comparando o uso de gentamicina ao de ceftriaxona (ambos associados a 1g de azitromicina) para o tratamento da gonorreia. O estudo G-ToG, que foi feito no Reino Unido, contou com participantes do sexo masculino e feminino (entre 16 e 70 anos) que tinham diagnóstico de gonorreia genital, faríngea e/ou retal não complicadas.

O estudo contou com 720 participantes que foram randomizados (1:1), sendo 362 no braço da ceftriaxona e 358 da gentamicina. Foi realizado o teste de amplificação de ácido nucleico (NAAT) e cultura de diversos materiais clínicos, a saber: apenas uretra em homens heterossexuais, uretra, faringe e reto em homens que fazem sexo com homens e cérvice, faringe e reto em mulheres. O desfecho primário avaliado foi a quantidade de pacientes que apresentaram teste de amplificação de ácido nucleico (NAAT) negativo após 14 dias do tratamento.

Ao final, o estudo foi ineficaz em concluir que a gentamicina é não inferior a ceftriaxona e, além disso, a falha de tratamento no braço da gentamicina foi maior nos pacientes com infecção extragenital (faríngea e retal). A taxa de cura nos pacientes que apresentavam apenas infecção genital foi próxima. Dessa forma, a gentamicina não é apropriada como primeira linha de tratamento para gonorreia, mas pode ser considerada uma opção em pacientes alérgicos à ceftriaxona ou que possuam resistência bacteriana isolada a ela e que tenham infecção genital restrita.

É importante ressaltar que os pacientes submetidos ao tratamento com gentamicina relataram mais dor no sítio da injeção, provavelmente pelo maior volume intramuscular aplicado (6 ml para gentamicina contra 2 ml para ceftriaxona) e pelo efeito local anestésico causado pela lidocaína que é utilizada para dissolver a cefalosporina. Além disso, a gentamicina é uma droga potencialmente ototóxica, ainda que a maior parte dos estudos que tenham caracterizado esse efeito adverso tenham considerado cursos prolongados de tratamento. No G-ToG esse achado foi raro e semelhante em ambos os braços considerados.

Estudos no Brasil

No Brasil existem poucos estudos que avaliam a resistência bacteriana da N. gonorrhoeae principalmente pela falta de diagnóstico etiológico da doença, visto que desde 1993 foi implementado o tratamento principalmente através do diagnóstico sindrômico.

No ano de 2016, o Ministério da Saúde, em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina, realizou estudo de vigilância da resistência in vitro do gonococo – o Projeto Sengono. Participaram da Rede de Monitoramento da Resistência Antimicrobiana do Gonococo 7 diferentes localidades no país e constatou-se resistência emergente e em expansão ao ciprofloxacino, com taxas superiores a 50% em todas as regiões do país. No entanto, as amostras de N. gonorrhoeae apresentaram alta suscetibilidade as cefalosporinas de terceira geração. Dessa forma, ceftriaxona e azitromicina são as medicações preconizadas, hoje, para o tratamento de gonorreia no Brasil.

O diagnóstico etiológico da doença é importante antes de iniciar o tratamento, dessa forma, evitamos a utilização indevida de antimicrobianos. O método atual de escolha para a infecção genital e extragenital em homens e mulheres é o teste de amplificação de ácido nucléico (NAAT), que também diferencia a C. trachomatis, um patógeno frequentemente associado. É um teste que fornece um resultado rápido, tem elevada sensibilidade e pode ser coletado pelo próprio paciente. A desvantagem é que ele não determina a suscetibilidade antimicrobiana. Por isso, quando há suspeita de resistência deve-se solicitar a cultura do material em meio Thayer-Martin.

Referências bibliográficas:

  • BAZZO, M. L. et al. First nationwide antimicrobial susceptibility surveillance for Neisseria gonorrhoeae in Brazil, 2015-16. The Journal of Antimicrobial Chemotherapy, v. 73, n. 7, p. 1854–1861, 01 2018.
  • NEWMAN, L. et al. Global Estimates of the Prevalence and Incidence of Four Curable Sexually Transmitted Infections in 2012 Based on Systematic Review and Global Reporting. PloS One, v. 10, n. 12, p. e0143304, 2015.
  • ROSS, J. D. C. et al. Gentamicin compared with ceftriaxone for the treatment of gonorrhoea (G-ToG): a randomised non-inferiority trial. Lancet (London, England), v. 393, n. 10190, p. 2511–2520, 22 2019.

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