Hidrocefalia na criança: como manejar?

Hidrocefalia continua a ser uma das patologias mais comuns em unidades de neurocirurgia pediátrica, sendo a TVE e DVP as principais opções de tratamento neurocirúrgico.

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Hidrocefalia continua a ser uma das patologias mais comuns em unidades de neurocirurgia pediátrica, sendo a terceiro ventriculostomia endoscópica (TVE) e inserção de derivação ventriculoperitoneal (DVP) as principais opções de tratamento neurocirúrgico.

TVE apresenta a vantagem sobre a inserção do DVP, pois permite que os pacientes permaneçam livres de dispositivos. No entanto, sua eficácia é amplamente discutida na literatura. Entretanto, a DVP, apesar de muitos avanços nas ultimas décadas, continua sendo uma opção de alto risco, e sua falha gera altas taxas de morbidade. Atualmente, múltiplos dispositivos de derivação com vários modelos de válvulas estão disponíveis mas nenhum comprovou ser superior a outro.

Artigo publicado na JNS pediatric, visando discutir o manejo da hidrocefalia e seu resultado a longo prazo, avaliou os pacientes que foram tratados no Hôpital Necker Enfants Malades no período de 1985 a 1995. O estudo é um dos maiores em hidrocefalia infantil e tem um dos maiores períodos de seguimento, média de 11 anos. Os resultados demonstram o perfil epidemiológico e servem para a compressão da patologia para definição da conduta neurocirúrgica.

A população de estudo foi de 975 crianças menores de 18 anos. Predomínio do sexo masculino (54,6%). A idade mediana na primeira cirurgia foi de 195 dias (média de 3,2 anos).O seguimento médio de acompanhamento foi de 11 ± 7,4 anos (média ± desvio padrão) com um máximo de 28 anos, sendo 70% seguimento ≥ 5 anos e 60% tiveram seguimento ≥ 10 anos.

Com relação às etiologias, a causa mais comum foi relacionada ao tumor (32,3%), seguida das malformações (24,5%) e inflamatórias (20,9%). A idade gestacional ao nascer estava disponível em 694 pacientes e 30,5% dessas crianças nasceram prematuros. A mortalidade geral foi de 16,5%. A mortalidade por progressão do tumor foi de 12,5%. A taxa de mortalidade por hidrocefalia em si foi de 1%. Em 695 pacientes, a hidrocefalia foi tratada inicialmente com inserção de shunt, enquanto os restantes 280 pacientes foram submetidos a TVE, primeiramente.

Separando os pacientes e avaliando o tipo de procedimento neurocirúrgico, os 280 pacientes com obstrução ao nível da fossa posterior ou em quem a estenose aquedutal foi suspeita, o TVE foi realizado como o primeiro tratamento. Com predominância masculina (52,5%), a principal etiologia foi tumor em fossa posterior (155 pacientes). O TVE foi bem sucedido em 204 casos (72,8%), uma nova abordagem da TVE foi necessária em 8 casos (2,8%) e em 68 casos (24,3%) não teve sucesso a TVE e foi necessário a implantação de derivação convencional.

Análise de sobrevivência da TVE mostrou uma sobrevida global de 76,9% ao 1 ano e 70% aos 10 e 20 anos. A TVE é efetiva no controle de hidrocefalia devido a tumores de fossa posteriores e estenose arquedutal, e menos eficaz para hidrocefalia devido a hemorragia ou infecção intraventricular.

Durante o período de estudo, 695 crianças tiveram inserção inicial de derivação com prótese. A maioria tinha menos de 1 ano no momento da primeira implantação de shunt (69,2%). A idade mediana na primeira cirurgia foi de 127,5 dias e a idade média foi de 2,1 ± 3,8 anos. O seguimento médio foi de 12,5 ± 7,6 anos. As duas principais etiologias foram malformações (29,9%) e inflamatórias (27,3%).

O número máximo de falhas mecânicas de shunt em um mesmo paciente foi 8. A maioria dos pacientes cujos shunts falharam por razões mecânicas experimentou apenas uma falha de derivação (176 pacientes).

O sexo do paciente, idade gestacional ao nascimento e idade no primeiro implante de derivação (idade < 1 ano ou ≥ 1 ano) não foram significativamente associadas à falha do shunt. No entanto, a posição do cateter ventricular foi significativamente associada a uma maior tempo de uso do shunt quando o cateter foi colocado corretamente. As análises revelaram que apenas a posição do cateter ventricular foi significativamente associada a uma pior sobrevida de derivação quando colocado incorretamente.

Sessenta pacientes inicialmente receberam uma Válvula de pressão variável (VPV) por causa da preferência do cirurgião. A análise de sobrevida do shunt foi de 60% ao 1 ano, 37% aos 10 anos e 29% aos 20 anos.

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A maioria da nossa população (635 pacientes) recebeu uma Válvula Regulada por Fluxo (VRF) como a primeira derivação. A análise mostrou uma sobrevida de shunt global de 70% ao 1 ano, 58% aos 10 anos e 49% aos 20 anos. A causa mais comum de falha de derivação mecânica foi obstrução (50,7%).

Embora a comparação dos grupos de derivação VRF e VPV seja interessante, estamos conscientes de que o número de VPV é pequeno em comparação com os números VRF e é escolhido pela preferência do cirurgião. Portanto, os resultados devem ser interpretados à luz dessas limitações. Não houve diferenças estatísticas entre os grupos VRF e VPV em relação ao sexo, idade no primeiro tratamento, idade gestacional ao nascimento e etiologia da hidrocefalia.

A sobrevida geral do shunt foi estatisticamente diferente entre os dois modelos de válvula. Análises com ajuste para sexo, idade gestacional ao nascimento e idade na primeira implantação de shunt (idade <1 ano ou ≥ 1 ano), revelaram que as derivações de VPV estavam associadas com significante pior sobrevida de shunt do que as derivações de V. no VRF. Além disso, o tempo de início da disfunção era amplamente variável independentemente do tipo de válvula; por exemplo, a obstrução do cateter ventricular ocorreu muito mais tarde no grupo VRF, enquanto a obstrução valvar ocorreu de forma precoce.

Dessa forma, melhoria no cuidado da hidrocefalia é um dos muitos objetivos do neurocirurgião. Apesar do desenvolvimento de mecanismos de derivação ter se iniciado década de 1950, permanecem até hoje associados a múltiplas complicações. Assim, quando o TVE surgiu como arsenal neurocirúrgica, rapidamente obteve aceitação no tratamento da hidrocefalia.

A TVE inicialmente utilizada para hidrocefalia induzida por estenose arquedutal, teve suas indicações expandidas para incluir hidrocefalia devido a outras etiologias. Os resultados com o uso TVE são dependentes da etiologia da hidrocefalia. Especificamente, o sucesso é baixo nas etiologias inflamatórias, como hidrocefalia pós-hemorrágica ou pós-hemorrágica e alta em estenose arquedutal congênita ou adquirida.

O estudo é o primeiro a relatar uma diferença significante a favor da VRF em relação à sobrevivência de shunt de longo prazo. As VRF têm sido usado quase que exclusivamente desde a década de 1980. Além disso, as complicações relacionadas à hiperdrenagem foram significativamente menos frequentes, embora a obstrução valvar ocorreu anteriormente (<1 ano pós-implantação) do que no grupo de derivação por VPV.

Ao analisar as diferentes curvas de sobrevida de derivação em diferentes séries, o padrão similar de falha de derivação, independentemente do tipo de válvula. Há uma alta incidência inicial de falha ou infecção durante os primeiros meses após a implantação do shunt, principalmente relacionadas à complicações cirúrgicas (colocação inadequada, localização da ponta do cateter ventricular questionável, desconexão, etc), em vez do tipo de válvulas.

No estudo em questão, 13,7% dos cateteres ventriculares estavam em posição “questionável” e representavam 8% de todas as complicações de derivação. Além disso, a posição do cateter ventricular estava significativamente associada a uma melhor sobrevida do shunt quando o cateter foi colocado corretamente. A colocação inadequada pode ser evitada usando técnicas estereotáxicas ou guiadas por ultrassonografia.

Conforme mencionado acima, este estudo tem um dos períodos de seguimento mais longos em uma população pediátrica com hidrocefalia. E os dados citados podem servir de escopo para avaliação e tomada de decisões no paciente com hidrocefalia.

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Referencia:

  • P. A. Beuriat et al. J Neurosurg Pediatr April 21, 2017 http://thejns.org/doi/10.3171/2017.2.PEDS16491

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