HIV: rastreio para criptococo e reforço de adesão como estratégias para diminuir mortalidade

Mortalidade precoce por infecções oportunistas em pacientes com HIV ainda constituem um problema, principalmente em países em desenvolvimento.

O advento e disponibilização de terapia antirretroviral de alta potência (TARV) mudaram a história natural da infecção pelo vírus HIV, aumentando a sobrevida e melhorando a qualidade de vida de indivíduos infectados. Entretanto, mortalidade precoce por infecções oportunistas — notadamente tuberculose e criptococose — ainda se constitui um problema, principalmente em países em desenvolvimento.

Uma estratégia para diminuir essas mortes é o rastreio e tratamento de infecções oportunistas. Associado ao início oportuno de terapia antirretroviral e medidas de incentivo à adesão. Estudos realizados em países africanos mostraram resultados positivos com a adoção dessa estratégia tanto em termos de redução de mortalidade quanto em custo-efetividade.

médico laboratorista avaliando amostra de escarro de paciente com HIV

Estudo sobre HIV

Um ensaio clínico randomizado, aberto, foi conduzido em seis centros médicos públicos localizados na Tanzânia e na Zâmbia e incluiu paciente adultos infectados pelo vírus HIV, virgens de TARV, e com contagem de linfócitos T-CD4 < 200 células/mm³. Se não houvesse contraindicações, TARV era iniciada na segunda visita dos participantes às clínicas.

A todos os participantes foi oferecido rastreio para tuberculose por meio de realização de teste molecular em amostras de escarro, independente da presença ou não de sintomas. Para os participantes com diagnóstico de tuberculose, o início da TARV foi adiado por duas semanas se clinicamente possível.

Os participantes incluídos foram randomizados para receberem cuidado padrão — de acordo com os protocolos locais. Ou cuidado clínico e comunitário que, além dos cuidados padrão, incluiu rastreio para meningite criptocócica por pesquisa sérica de antígeno e tratamento caso o rastreio fosse positivo, visitas residenciais semanais durante 1 mês por profissionais não médicos treinados e, na Tanzânia, novo rastreio de tuberculose seis semanas.

Aos participantes com teste sérico positivo para criptococo, foi oferecida realização de punção lombar. E o tratamento foi realizado de acordo com os resultados (anfotericina B e fluconazol nos casos com evidências de meningite. Ou fluconazol somente nos casos com líquor negativo ou nos que não realizaram o exame).

Os profissionais que realizaram as visitas domiciliares foram treinados para entregar a medicação. Além de reforçar adesão e monitorar os pacientes em relação ao desenvolvimento de sinais e sintomas de toxicidade medicamentosa.

O desfecho primário foi mortalidade por qualquer causa 12 meses após a entrada no estudo. Os desfechos secundários foram custos das duas estratégias, adesão à TARV, necessidade de internação hospitalar e tuberculose ativa no segundo rastreio. Uma análise posterior determinou a custo-efetividade da estratégia de cuidado clínico e comunitário.

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Metodologia

Ao todo, 1.999 indivíduos foram randomizados para os braços do estudo. Sendo 1.001 no grupo com cuidado clínico e comunitário e 998 no grupo de cuidado padrão. A média de linfócitos T-CD4 foi de 52 células na Tanzânia e de 77 na Zâmbia. Não houve diferença na média de tempo para início de TARV entre os grupos. No geral, 16% dos participantes apresentavam tuberculose e já estavam em tratamento. Dos demais, 189 foram diagnosticados com tuberculose durante a avaliação inicial do estudo.

No grupo de cuidado clínico e comunitário, 38 dos 985 participantes que foram submetidos a rastreio para infecção por criptococo apresentaram teste positivo, a maior parte em indivíduos com contagem de linfócitos T-CD4 < 100 células/mm³. Apenas nove pacientes aceitaram realizar punção lombar e, com isso, somente três foram diagnosticados com meningite criptocócica.

Em relação ao desfecho primário, a taxa de mortalidade foi 28,4% menor no grupo de cuidado clínico e comunitário em comparação com o grupo de cuidado padrão. Dessa forma, alcança-se uma diferença estatisticamente significativa e foi um efeito consistente em ambos os países. Estratificando-se pela contagem basal de linfócitos T-CD4, os efeitos foram mais pronunciados nos com contagem mais elevada (mortalidade 19,8% menor nos com contagem < 50 células/mm³ vs. 35,3% nos com ≥ 50 células/mm³ no braço de intervenção quando comparado com o grupo controle). A mortalidade foi maior nos pacientes que testaram positivo no rastreio para criptococo. Não houve diferença na proporção de indivíduos que necessitaram de internação hospitalar ou na proporção de indivíduos com adesão adequada à TARV.

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Resultados

A análise complementar mostrou que a intervenção dos cuidados clínico e comunitário provavelmente é custo-efetiva, apesar de aumentar os custos em relação ao cuidado padrão. Um dos fatores que elevou o custo da intervenção foi a realização de visitas domiciliares. Entretanto, os autores ressaltam que, com a expansão das práticas, os custos possivelmente se reduziriam, uma vez que as visitas poderiam ser realizadas de forma mais otimizada.

Os resultados apoiam que o rastreio para infecção por criptococo em indivíduos com diagnóstico recente de HIV, associado a medidas de reforço de adesão e tratamento oportuno, pode ser uma intervenção com capacidade de reduzir mortalidade por infecções oportunistas nessa população.

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Referências bibliográficas:

  • Mfinanga S, et al. Cryptococcal meningitis screening and Community-based early adherence support in people with advanced HIV infection starting antiretroviral therapy in Tanzania and Zambia: na open-label, randomised controlled trial. The Lancet March 10, 2015. http://dx.doi.org/10.1016/ S0140-6736(15)60164-7
  • Kimaro GD, et al. Cryptococcal Meningitis Screening and Community-based Early Adherence Support in People With Advanced Human Immunodeficiency Virus Infection Starting Antiretroviral Therapy in Tanzania and Zambia: A Cost-effectiveness Analysis. Clinical Infectious Diseases 2020 doi: 10.1093/cid/ciz453

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