Inatividade física é fator de risco para a Covid-19 grave

Pesquisa avalia a hipótese do favorecimento das formas moderadas a graves de Covid-19 devido a inatividade física.

Diferentes fatores de risco para Covid-19 grave já foram descritos, incluindo > 60 anos, sexo masculino, a ocorrência de comorbidades como obesidade, doença pulmonar crônica, doença cardiovascular, doença renal avançada, neoplasias, anemia falciforme, imunodeprimidos por transplante de órgãos sólidos, diabetes tipo 2, síndrome de Down, tabagismo, pobreza e a gravidez. Porém, nas rotinas de atendimentos aos pacientes nesse período acima de 12 meses desde o surgimento da pandemia de infecções pelo vírus SARS-CoV-2, outra questão adicional têm sido ressaltada e chamado a atenção de diversos médicos e pesquisadores: a inatividade física

Com base nos critérios dos consensos mundiais sobre atividade física, considera-se que a prática de no mínimo 150 min a 300 min por semana de atividade física aeróbia, em intensidade moderada a vigorosa, deve ser definida como ideal para os benefícios à saúde de um indivíduo. Os benefícios incluem o funcionamento do sistema cardiovascular, a capacidade pulmonar, hipertrofia muscular, estrutura musculoesquelética, a saúde mental, e o favorecimento da homeostase e do funcionamento do sistema imune, com consequente menor taxa de incidência de diversas infecções virais, sintomas e mortalidade por doenças infecciosas, assim como menor ocorrência de doenças crônicas. A prática regular de atividades físicas reduz o risco de inflamação sistêmica, o que parece favorecer o melhor prognóstico da infecção pulmonar pelo SARS-CoV-2. 

Inatividade-física

Os efeitos da inatividade física

De forma a tentar avaliar a hipótese do favorecimento das formas moderadas a graves de Covid-19 devido a ausência da prática regular de atividade física, ou também chamada inatividade, Sallis et al. (2021) compararam as taxas de hospitalização, admissão em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI) e a mortalidade entre pacientes com Covid-19 categorizados como inativos fisicamente, com atividade física esporádica ou que atendiam consistentemente às recomendações de atividade física acima citadas, de acordo com o protocolo Exercise Vital Sign (EVS), como descrito abaixo: 

  • Inativo: EVS 0-10 min/ semana = Inativo; 
  • Prática esporádica de atividade física: EVS 11-149 minutos /semana;
  • Prática consistente de atividade física: > 150 minutos/semana. 

Através desse estudo observacional retrospectivo, conduzido pela Kaiser Permanente Southern California (KPSC), foram obtidos dados eletrônicos prévios sobre a saúde dos indivíduos residentes no sudeste californiano, assistidos em 15 centros médicos, com idade acima de 18 anos e com o diagnóstico de Covid-19 no período de 1 de janeiro de 2020 a 21 de outubro de 2020. Os dados retrospectivos sobre a saúde física dos pacientes abrangiam os dois anos anteriores a março de 2020 (período do início do lockdown em território americano). Foram incluídos 48.449 pacientes com teste positivo para Covid-19 prévio ou com diagnóstico da doença no período acima citado. Os pacientes assistidos pelas clínicas da KPSC e incluídos nesse estudo mantinham também a regularidade prévia de acompanhamento clínico, sendo submetidos a, no mínimo, três consultas ambulatoriais com a aplicação do questionário EVS entre 19 de março de 2018 e 19 de março de 2020, de forma que permitiu aumentar a acurácia de classificação dos hábitos / regularidade quanto a atividade física dos pacientes. Foram avaliados os dados demográficos, comorbidades, características clínicas e desfechos clínicos da Covid-19 para cada paciente, e comparado entre os grupos. 

Resultados

Os resultados descreveram uma distribuição não linear do número de indivíduos nas categorias EVS. Observou-se do total de 48.440 pacientes estudados, e, de maneira geral, a seguinte distribuição: 

  • Inativo: 6.984 indivíduos (14,4%), mediana de idade 49 anos; 
  • Prática esporádica de atividade física: 38.338 indivíduos (79,2%), mediana de idade 47 anos; 
  • Prática consistente de atividade física: 3118 indivíduos (6,4%), mediana de idade 38 anos. 

A maior parte da população estudada era composta por mulheres (61,%). A média geral do índice de massa corporal foi de 31,2 kg/m2, e 51,4% dos indivíduos da coorte não apresentaram comorbidades, 17,4% exibiam apenas uma, e 31,3% duas ou mais, sendo que dentre os que exercem atividade física consistente, as taxas de doenças crônicas eram as menores. 

Considerando a apresentação de Covid-19, 8,6% dos pacientes foram hospitalizados, 2,4% admitidos em UTI e 1,6% faleceram. Os pacientes com prática regular de atividade física apresentaram menores índices de hospitalização, necessidades de oxigenoterapia ou prognóstico ruim. Os inativos apresentaram uma chance de hospitalização 2,26x maior (95% de intervalo de confiança, 1,18 a 2,83) quando comparada com os indivíduos com prática regular consistente, assim como outros fatores como idade avançada, gravidez, obesidade e histórico de transplante de órgãos também se mostraram associados a um maior risco de hospitalização. Para internação em UTI e morte, tal comparação foi semelhante com valores de odds para os inativos fisicamente de 1,73x e 2,49x maiores, respectivamente, em relação aos praticantes de forma regular. Outros detalhes interessantes podem ser vistos nas referências abaixo. 

Conclusão

Com base em todos esses achados importantes para a maior compreensão da fisiopatologia da Covid-19, esse estudo pioneiro traz evidências substanciais sobre a importância da atividade física de forma consistente e regular como um fator modificador do prognóstico da doença causada por SARS-CoV-2. Aparentemente, a inatividade física será um dos principais fatores de risco de pior prognóstico em comparação com os fatores de risco modificáveis comumente citados, incluindo tabagismo, obesidade, diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e câncer. Até mesmo os indivíduos em prática esporádica de atividade física apresentaram melhores resultados de sobrevida e menor taxa de internação do que os inativos. 

Autores: 

Andreia Pizarro [Pesquisadora do Centro de Investigação em Actividade Física, Saúde e Lazer (CIAFEL) / Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP), Porto, Portugal]

Referências bibliográficas: 

  • Coleman KJ, Ngor E, Reynolds K, et al. Initial validation of an exercise “vital sign” in electronic medical records. Med Sci Sports Exerc 2012;44:2071–6. 
  • da Silveira MP, da Silva Fagundes KK, Bizuti MR, et al. Physical exercise as a tool to help the immune system against COVID-19: an integrative review of the current literature. Clin Exp Med 2021;21:1–14. 
  • Katzmarzyk PT, Friedenreich C, Shiroma EJ, et al. Physical inactivity and noncommunicable disease burden in low-income, middle-income and high-income countries. Br J Sports Med 2021. doi:10.1136/bjsports-2020-103640. 
  • Nieman DC, Wentz LM. The compelling link between physical activity and the body’s defense system. J Sport Health Sci 2019;8:201–17.
  • Piercy KL, Troiano RP, Ballard RM, et al. The physical activity guidelines for Americans. JAMA 2018;320:2020–8. 
  • Sallis R, Young DR, Tartof SY, Sallis JF, Sall J, Li Q, Smith GN, Cohen DA. Physical inactivity is associated with a higher risk for severe COVID-19 outcomes: a study in 48 440 adult patients. Br J Sports Med. 2021 Apr 13:bjsports-2021-104080. 
  • World Health Organization. World Health organization 2020 guidelines on physical activity and sedentary behavior, 2020. Available: https://bjsm.bmj.com/content/54/24/ 1451

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