Insuficiência Cardíaca: revisão clínica PEBMED [vídeo]

Hoje, a insuficiência cardíaca é a causa mais comum de morte cardiovascular em países da Europa Ocidental e EUA e é um problema crescente no Brasil.

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A insuficiência cardíaca (IC) pode ser definida como a incapacidade do coração em manter o débito cardíaco adequado à demanda metabólica dos tecidos. Hoje, a IC é a causa mais comum de morte cardiovascular em países da Europa Ocidental e EUA e é um problema crescente no Brasil. O envelhecimento populacional, o aumento da prevalência de fatores de risco, como hipertensão, e a maior sobrevida a eventos antes fatais, como o IAM, têm levado a um maior número de pacientes com IC. Além disso, a ocorrência de IC em uma população mais velha leva a um cenário frequente de IC + comorbidades não cardiovasculares que podem exigir uma atenção especial no diagnóstico e tratamento.

Os ventrículos são a principal estrutura cardíaca responsável pelo esvaziamento cavitário e envio de sangue para o organismo. Desse modo, a classificação de IC leva muito em consideração como os ventrículos estão funcionando:

  • Direita x esquerda x biventricular: se predominam manifestações de congestão sistêmica (IC direita), pulmonar (IC esquerda) ou ambos (biventricular). Especificamente a IC direita tem peculiaridades no diagnóstico e tratamento que foram revistos por nós recentemente.
  • Sistólica x diastólica: na sistólica, há redução da fração de ejeção, com diminuição do volume sistólico e, por conseguinte, do débito cardíaco. Já na IC diastólica, há dificuldade no enchimento ventricular, havendo aumento das pressões de enchimento e congestão – pense como um “engarrafamento” progressivo no sistema venoso chegando no coração.
  • Anterógrado x retrógrado: menos utilizada, divide se predominam sintomas de baixo débito (anterógrado) ou de congestão (retrógrado).
  • Baixo débito x alto débito: a IC de baixo débito é a ICC tradicional, na qual o débito cardíaco está normal ou reduzido e não atende a demanda tecidual. Já a IC de alto débito ocorre em situações de maior metabolismo, no qual nem mesmo o aumento do DC dá conta das necessidades. É o caso do beriberi, hipertireoidismo, fístulas arteriovenosas e gravidez.

De todas as classificações, a mais moderna e a mais importante é a divisão entre ICFER e ICFEN, baseada na fração de ejeção. Na ICFEN, ou agora ICFEP, a fração de ejeção é normal. O paciente apresenta sintomas de IC (veja adiante, critérios de Framingham), pressões de enchimento elevadas (disfunção diastólica) e BNP alto, mas a FE é normal.

Essa diferenciação é muito importante para a decisão terapêutica: os betabloqueadores, iECA/BRA e espironolactona só mostraram benefício em reduzir a mortalidade na ICFER, ao passo que na ICFEN o tratamento é meramente sintomático!!!

  • ICFER: insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida
  • ICFEN ou ICFEP: insuficiência cardíaca com fração de ejeção normal ou preservada

A grande discussão do momento na cardiologia é qual o ponto da FE divide as duas formas. É certo que:

FE < 40% = ICFER
FE > 60% = ICFEN

40-60%: é a chamada gray zone, que tem sido área de muitos estudos. Será que estes pacientes se beneficiam, em termos de sobrevida, do mesmo tratamento da ICFER? Só saberemos mais à frente, quando novos estudos forem realizados. A última diretriz da ESC trouxe recomendações específicas para esta nova “classe” de IC e foram revistas por nossa equipe em reportagem recente.

As principais manifestações clínicas da IC são dispneia aos esforços, ortopneia e edema periférico em membros inferiores. Os critérios de Framingham são uma ferramenta importante para o reconhecimento e diagnóstico do paciente com IC.

Tabela 1: critérios de Framingham para IC

critérios de Framingham para IC

Para o diagnóstico de IC são necessários dois critérios maiores ou um critério maior e dois menores.

Frente à suspeita clínica, a próxima fase é dividida em duas etapas paralelas: confirmar o diagnóstico de IC e determinar a etiologia. A insuficiência cardíaca é uma síndrome e, portanto, um conjunto de sinais e sintomas comuns a várias doenças. As etiologias mais comuns em nosso meio são cardiomiopatia dilatada, hipertensiva, isquêmica, valvar, alcoólica e chagásica.

Os principais exames complementares são:

  • Hemograma
  • Bioquímica com função renal e eletrólitos
  • BNP*
  • Eletrocardiograma
  • Radiografia de tórax
  • Ecocardiograma**

*O BNP tem papel no diagnóstico e no prognóstico. Contudo, estudo mostrando o uso do BNP como guia do tratamento não mostrou vantagens em relação ao tratamento usualAlém dos tradicionais BNP e troponina, outros biomarcadores têm sido estudados, com destaque para o ST2, como preditor de risco tanto na ICFEN como na ICFER.
**Apesar dos avanços da ressonância, o ECO ainda é o padrão-ouro para determinar a função ventricular e avaliação valvar. É etapa fundamental no diagnóstico e acompanhamento.

As principais etiologias e os exames disponíveis para o diagnóstico são:

Doença Método
Cardiomiopatia dilatada Ecocardiograma

Ressonância magnética

Hipertensiva Ecocardiograma

Ressonância magnética

Isquêmica Teste ergométrico

Cintilografia do miocárdio

Ecocardiograma de estresse

Ressonância magnética

AngioTC de coronárias

Coronariografia

Valvar Ecocardiograma
Chagásica História epidemiológica

Sorologia

A gestação tem como peculiaridade a ocorrência de cardiomiopatia periparto, mais comum no parto e puerpério imediato. A gravidez e a amamentação trazem desafios para os métodos diagnósticos e a necessidade de ajuste em parte das medicações e foram tema de revisão clínica recente.

No paciente que se apresenta com IC aguda, além de determinar a etiologia da IC, é importante a pesquisa e correção do fator descompensador. Ele pode ser o mesmo da etiologia – exemplo: paciente coronariopata que infarta – mas eventualmente é diferente – miocardiopatia dilatada que descompensa com pneumonia. Em reportagens recentes, resumimos para vocês os principais exames no cenário de IC aguda e quando o paciente está apto para alta!

O tratamento da IC é dividido em três partes, exemplificadas na tabela abaixo.

 

Medidas não-farmacológicas Dieta hipossódica. Quer uma notícia boa? Ao contrário de mitos anteriores, o café não parece trazer malefícios ao paciente com IC!
Restrição hídrica: apenas se houver hiponatremia
Exercício físico (reabilitação cardíaca) e perda de peso. A cirurgia bariátrica, inclusive, parece ser benéfica neste grupo de pacientes!
Educação por equipe multiprofissional
Aumento sobrevida iECA/BRA
Sacubitril/valsartana: nova droga que mostrou aumento de sobrevida se comparadas com monoterapia com enalapril
Betabloqueadores: apenas carvedilol, nebivolol, metoprolol de liberação prolongada, bisoprolol
Espironolactona
Alívio dos sintomas Diurético de alça (furosemida)
Nitrato*
Hidralazina*
Digoxina: tema controverso**.

*Em negros, a associação hidralazina + nitrato melhora desfechos clínicos e é a principal opção em pacientes com síndrome cardiorrenal.
**Há dois cenários para a digoxina: (1) controle de FC em pacientes com FA permanente; (2) melhora sintomática em pacientes com classe funcional III/IV a despeito de terapia clínica otimizada, função renal normal e manutenção de nível sérico entre 0,5-0,9 ng/ml.
Obs: apesar de ser um cenário bom para uso do digital, em pacientes com ICFER e fibrilação atrial os betabloqueadores continuam como primeira opção para controle de FC. É importante avaliar o tempo de FA, o tamanho do átrio esquerdo e a repercussão clínica para decidir entre reversão x controle da FC. Pacientes mais jovens, sintomáticos e com átrio pequeno são os que mais se beneficiam da reversão para sinusal. Neste cenário, a ablação tem ganhado destaque, por maior eficácia com menor riscos que os antiarrítmicos.

Outro cenário especial é o paciente coronariopata. É fundamental a pesquisa de isquemia residual. Mas em pacientes com teste funcional negativo e ICFER, avalie também a viabilidade miocárdica! Quando presente, há benefícios na estratégia de revascularização.

Não se esqueça também do tratamento das comorbidades. Pacientes com IC com frequência são idosos e fazem uso de vários fármacos, sendo a polifarmácia um risco real. A AHA, inclusive, divulgou texto sobre as principais medicações a serem evitadas no paciente com IC. Das comorbidades, esteja atento à depressão, causa de mau prognóstico na evolução e resposta ao tratamento.

Recentemente, a AHA e a ACC atualizaram sua diretriz para diagnóstico e tratamento de IC. Resumimos os principais pontos no vídeo abaixo:

 

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