Lipoproteína a, ou Lp(a), e o escore de cálcio como preditores de risco cardiovascular

A Lp(a), é uma partícula de gordura de baixa densidade, a Lp(a) aumentada é considerada como fator agravante de risco cardiovascular.

A lipoproteína a, ou Lp(a), é uma partícula de gordura de baixa densidade que induz aterosclerose, inflamação e trombose. Lp(a) aumentada é considerada como fator agravante de risco cardiovascular e pode auxiliar na decisão terapêutica de pacientes assintomáticos em prevenção primária. Seu nível sérico é geneticamente determinado e os níveis adultos são alcançados a partir dos 5 anos de idade.

O escore de cálcio coronário, avaliado pela tomografia de coronárias, é um marcador altamente específico de aterosclerose estabelecida e quantifica a carga de doença subclínica. Também é um preditor de risco cardiovascular bem estabelecido.

Sabemos que esses dois parâmetros são marcadores de risco com relação a eventos cardiovasculares, porém sua avaliação conjunta ainda não havia sido realizada. Recentemente foi publicado um artigo que avaliou exatamente isso: a associação independente e conjunta da Lp(a) e escore de cálcio em relação a risco de eventos cardiovasculares em pacientes assintomáticos.

Lipoproteína a e escore de cálcio como preditores de risco cardiovascular 

Método do estudo e população envolvida

Foram incluídos pacientes de duas grandes coortes americanas: do estudo MESA (Multi-Ethnic Study Of Atherosclerosis) e do estudo DHS (Dallas Heart Study). Os pacientes incluídos eram livres de eventos cardiovasculares e foram excluídos os sem dosagem de Lp(a) e de escore de cálcio, os que usavam estatina no momento da inclusão e os que tiveram seguimento incompleto.

Os eventos cardiovasculares considerados no seguimento foram doença aterosclerótica coronária (DAC), que compreendia morte por DAC e infarto agudo do miocárdio (IAM) fatal ou não fatal, e acidente vascular cerebral (AVC) fatal ou não fatal.

Leia também: Avaliação do cálcio coronário ou escores de risco para predição de eventos cardiovasculares e indicação de estatina?

Os pacientes foram avaliados a partir dos valores de Lp(a) (os valores obtidos nestas populações foram agrupados em quintis) e do escore de cálcio, sendo divididos em seis subgrupos: quintis 1 a 4 dos valores de Lp(a) e escore de cálcio 0, quintil 5 dos valores de Lp(a) e escore de cálcio 0, quintis 1 a 4 dos valores de Lp(a) e escore de cálcio 1-99, quintil 5 dos  valores de Lp(a) e escore de cálcio 1-99, quintis 1 a 4 dos valores de Lp(a) e escore de cálcio ≥ 100, quintil 5 dos valores de Lp(a) e escore de cálcio ≥ 100.

Além disso, foram criados também outros quatro subgrupos com base no valor de Lp(a) considerado de risco pelas diretrizes (50 mg/dL): Lp(a) < 50 mg/dL e escore de cálcio < 100, Lp(a) ≥ 50 mg/dL e escore de cálcio < 100, Lp(a) < 50 mg/dL e escore de cálcio ≥ 100 UA, Lp(a) ≥ 50 mg/dL e escore de cálcio ≥ 100 UA.

Resultados

Foram incluídos 4.512 participantes do MESA, com seguimento médio de 13,2 anos, e 2.078 participantes do DHS com seguimento médio de 11 anos.

Em relação as características dos pacientes:

  • Coorte MESA: idade média 61,9 anos, 52,5% do sexo feminino, 36,8% brancos, 29,3% negros, 22,2% hispânicos e 11,7% chineses.
  • Coorte DHS: idade média 44,5 anos, 56,2% do sexo feminino, 34,4% brancos, 48,3% negros e 17,3% hispânicos.

A mediana do escore de cálcio e a proporção de pacientes nas três categorias desse escore foram semelhantes ao longo dos diferentes valores de Lp(a). Os fatores de risco tradicionais e a proporção de mulheres aumentou de acordo com o aumento do escore de cálcio, o que já era esperado. Assim como o achado de maiores níveis de Lp(a) na população negra.

Em relação aos eventos: na coorte MESA houve 476 eventos, sendo 267 DAC e 209 AVC e na coorte DHS houve 98 eventos, sendo 54 DAC e 44 AVC.

Houve associação linear e independente dos níveis de Lp(a) e do escore de cálcio com o risco cardiovascular. No grupo MESA o HR foi de 1,13 (IC 95% 1,03-1,23) e 1,19 (IC95% 1,14-1,24) e no grupo DHS de 1,34 (IC95% 1,09-1,65) e 1,31 (IC95% 1,19-1,45) para Lp(a) e score de cálcio respectivamente. Quando o Lp(a), escore de cálcio e fatores de risco tradicionais foram analisados em conjunto, as variáveis do estudo se mantiveram como variáveis independentes.

O maior risco foi para pacientes com Lp(a) aumentada (no quintil 5) e escore de cálcio ≥ 100 (22%, IC95%, 15,9%-28%) e o menor foi para Lp(a) baixa e escore de cálcio 0 (2,8%, IC95% 2,0%-3,6%). Entre os que tinham escore de cálcio 0 ou 1-99, o risco se manteve para os diferentes valores de Lp(a).

Quando utilizados valores de corte de Lp(a) de 50 mg/dL, a maior incidência de eventos foi observada quando Lp(a) ≥ 50 mg/dL e escore de cálcio ≥ 100 (23,2%, IC95% 17%-29,5%). Já a menor incidência foi com Lp(a) < 50 mg/dL e escore de cálcio < 100 (4,6%, IC 95%, 3,8%-5,4%). Quando o escore de cálcio era < 100, a incidência de eventos foi semelhante entre os dois grupos de Lp(a). Em relação ao tipo de evento, a associação de Lp(a) e escore de cálcio altos foi mais importante para a ocorrência de DAC que de AVC.

Comentários e conclusão

Esse estudo avaliou duas grandes coortes epidemiológicas de pacientes assintomáticos, sem eventos cardiovasculares prévios. Como resultado observamos que níveis elevados de Lp(a) e de escore de cálcio tiveram associação independente com eventos cardiovasculares.

Quando as duas variáveis foram analisadas em conjunto, encontramos que pacientes com escore de cálcio ≥ 100 e Lp(a) ≥ 50 mg/dL tinham risco muito aumentado de eventos, praticamente igual a pacientes em prevenção secundária. Esses pacientes têm indicação de estatina de alta potência e talvez mereçam outras intervenções, como uso de aspirina para prevenção primária. Um estudo randomizado com essa população poderia nos trazer mais informações e avaliar o benefício desta medida.

Saiba mais: Existe algum grupo de maior risco entre os pacientes com score de cálcio 0 na tomografia de coronárias?

Por outro lado, quando o escore de cálcio era < 100, o risco era semelhante para os dois grupos de Lp(a), alto ou baixo e quando o escore de cálcio era 0, o risco era baixo para qualquer valor de Lp(a). Isso se manteve independente de fatores de risco tradicionais, inclusive história familiar de DAC. Talvez nos pacientes que tenham Lp(a) aumentada, o escore de cálcio ajude na reestratificação e esses pacientes possam ser considerados como de risco mais baixo do que seriam com a análise isolada da Lp(a).

Mensagem prática

Esse estudo é bastante interessante e pode representar o início de algumas mudanças de conduta na prática clínica. Ao avaliarmos um paciente com Lp(a) aumentada, a complementação da avaliação com escore de cálcio pode ajudar a definir melhor a conduta e caso este seja 0, esse paciente se enquadra num risco baixo, diferente do que o considerado apenas com a Lp(a). Por outro lado, se um paciente apresenta escore de cálcio alto (≥ 100), a complementação da avaliação com a dosagem de Lp(a) estratifica este paciente para muito alto risco e este paciente necessita de cuidados mais intensivos para redução de risco cardiovascular.

Um estudo com aspirina nesta subpopulação de mais alto risco seria interessante para avaliar benefício da medicação em contexto de prevenção primária, além de estudos de tratamento com terapia alvo baseada em medicações que atuam na Lp(a).

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Mehta A, et al. Independent Association of Lipoprotein(a) and Coronary Artery Calcification With Atherosclerotic Cardiovascular Risk. Journal of the American College of Cardiology. 2022; 79(8):757-768. doi: 10.1016/j.jacc.2021.11.058.

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