Metformina versus insulina ou gliburida no controle do diabetes mellitus gestacional e desfechos neonatais

O diabetes mellitus gestacional é uma condição de extrema importância para os desfechos neonatais. Com prevalência de cerca de 18% no Brasil.

O diabetes mellitus gestacional (DMG) é uma condição de extrema importância para os desfechos neonatais. Com prevalência estimada em cerca de 18% no Brasil, atualmente é recomendado que todas gestantes tenham a glicemia de jejum (GJ) dosada no primeiro trimestre como parte do pré-natal. O diagnóstico do DMG, seguindo os critérios da IADPSG, validados e aceitos pela American Diabetes Association (ADA) e pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), requerem alteração em apenas um parâmetro no teste oral de tolerância à glicose 75 g (TOTG, ou GTT) entre a 24ª e 28ª semana de gestação (Jejum ≥ 92 mg/dL, 1ª hora ≥ 180 mg/dL e 2ª hora ≥ 153 mg/dL). Considerando tais valores, extrapola-se a glicemia de jejum para o primeiro trimestre, considerando DMG caso a GJ ≥ 92 mg/dL, uma vez que a tendência nessas pacientes é de haver um incremento glicêmico sobretudo na segunda metade da gestação, onde há um aumento dos hormônios contrarreguladores.

Desde o HAPO trial, publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) em 2008, é bem estabelecido que quanto maior a média glicêmica, piores são os desfechos neonatais, sobretudo quanto ao risco de feto GIG (maior que P90), hipoglicemia neonatal e maior risco de cesárea. É bem estabelecido que a hiperglicemia materna não controlada também se associa a maior risco de hiperbilirrubinemia neonatal, prematuridade, insuficiência respiratória e morte perinatal. 

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Já com relação ao tratamento, a principal medida eficaz na grande maioria das pacientes é a mudança do estilo de vida, com dietas equilibradas. Porém devido ao fato de vários antidiabéticos orais atravessarem a placenta e não apresentarem um perfil de segurança bem estabelecido, o tratamento padrão medicamentoso acaba sendo a insulinoterapia.

É sabido que a metformina atravessa a barreira hematoplacentária, mas os riscos associados ao uso durante a gestação e sobretudo a longo prazo são discutíveis. Considerando esses fatores, recentemente foi publicada uma metanálise de ensaios clínicos randomizados que buscou avaliar a eficiência e segurança no uso de insulina, metformina e gliburida (uma sulfonilureia) no diabetes mellitus gestacional, seus desfechos glicêmicos e perinatais.

Metformina versus insulina ou gliburida no controle do diabetes gestacional e desfechos neonatais

A metanálise

Foram incluídos 4.533 participantes de 23 trials. A análise quantitativa final considerou apenas estudos analisados na forma “intention to treat”. Foram excluídos trials que não estavam bem pareados quanto à glicemia inicial. Os desfechos analisados incluíram o controle do DMG (baseado na glicemia de jejum, 2 horas pós-prandial e HbA1c) e desfechos neonatais, destacando o risco de hipoglicemia neonatal, hiperbilirrubinemia, macrossomia, morte perinatal, feto GIG e prematuridade. Os resultados foram comparados como diferença média padronizada (SMD, ou “tamanho de efeito”).

Resultados

a) Comparada a gliburida: 

  • A metformina reduziu a glicemia pós-prandial (2 horas após): – 0,18  (SMD 0,01 – 0,34, IC 95%). Não houve diferenças quanto aos desfechos perinatais.

b) Comparada a insulina:

  • A metformina reduziu risco de hipoglicemia neonatal (diferença de risco – 0,07 (-0,11 a – 0,02, IC 95%), porém houve grande heterogeneidade nos trabalhos que avaliaram tal desfecho (I² 56%);
  • O grupo metformina teve menor peso ao nascer: -0,17 (SMD -0,25 a – 0,08; IC 95%). Houve uma tendência a menor incidência de macrossomia, mas sem significância estatística;
  • Menor ganho de peso materno: – 0,61 (SMD – 0,86 a – 0,35, IC 95%).

A metformina foi tão efetiva quanto a insulina no controle glicêmico, com bom potencial para controle da glicemia pós-prandial e com baixa prevalência de hipoglicemia neonatal, macrossomia e internações em UTI, além de levar a menor ganho de peso materno e fetal.

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Ainda, não foram encontradas diferenças em hiperbilirrubinemia neonatal, trauma obstétrico, morte perinatal, prematuridade, grandes ou pequenos para idade gestacional, o que sugere que a metformina parece ser segura a curto prazo.

Na prática

Esta metanálise traz informações favoráveis à metformina quanto aos desfechos fetais. Claro, devemos lembrar da metformina como uma medicação possível no tratamento do DMG. No entanto, o estudo analisou de forma exclusiva os efeitos gestacionais a curto prazo e há discussão sobre o papel da metformina ao longo da vida, se ela poderia aumentar por exemplo o risco de obesidade infantil. A ADA e a FEBRASGO ainda recomendam a insulina como tratamento inicial para o diabetes mellitus gestacional, sendo que a ANVISA libera para uso na gestação apenas caso a gestante assine um termo de consentimento livre e esclarecido (vale lembrar que a droga é categoria B na gestação). 

Desta forma, considerando a segurança no tratamento com insulina, a metformina pode ser considerada como uma segunda opção naquelas pacientes com extrema resistência insulínica, com necessidade de doses muito elevadas para melhor controle do diabetes. 

Referências bibliográficas:

  • HAPO Study Cooperative Research Group, Metzger BE, Lowe LP, Dyer AR, Trimble ER, Chaovarindr U, Coustan DR, Hadden DR, McCance DR, Hod M, McIntyre HD, Oats JJ, Persson B, Rogers MS, Sacks DA. Hyperglycemia and adverse pregnancy outcomes. N Engl J Med. 2008 May 8;358(19):1991-2002. doi: 10.1056/NEJMoa0707943
  • Yu, DQ., Xu, GX., Teng, XY. et al. Glycemic control and neonatal outcomes in women with gestational diabetes mellitus treated using glyburide, metformin, or insulin: a pairwise and network meta-analysis. BMC Endocr Disord. 2021;21:199. doi: 10.1186/s12902-021-00865-9

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