MiSight: a nova opção em controle de miopia no Brasil

Estudos recentes demonstraram que a MiSight, que serão introduzidas no mercado brasileiro, é efetiva em diminuir a progressão da miopia.

A miopia pode ser definida e classificada de várias formas, de acordo com a etiologia, idade de início, características anatômicas do olho, grau, padrão de progressão e complicações estruturais. Do ponto de vista óptico, a miopia é definida como um erro refrativo em que os raios de luz que entram paralelos no eixo óptico, se cruzam e formam a imagem na frente retina quando a acomodação está relaxada. Isso geralmente resulta de um comprimento do olho muito grande, mas pode ser causado também por uma córnea mais curva ou um cristalino com poder aumentado ou ambos. Dependendo da causa a miopia é dividida em axial (alongamento do olho), refrativa (relacionada a córnea ou cristalino) ou secundária a síndromes clínicas sistêmicas, medicações ou doenças de córnea. A miopia axial é muito estudada já que existem métodos de controle desse tipo de miopia que podem ser utilizados, além de ser a mais prevalente.

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A alta miopia é definida como uma condição em que o erro refrativo é maior que -5 dioptrias ou que o comprimento axial é maior que 26-27 dioptrias, o que em muitos casos é associado a degeneração miópica da retina. A miopia é uma condição multifatorial que resulta de fatores genéticos e ambientais. Apesar da grande associação genética, o aumento na prevalência de miopia nas últimas décadas não é explicado pelas causas genéticas isoladamente. O uso excessivo da visão de perto, a menos exposição solar, os aumentados níveis de educação estão associados a esse crescimento. O início do quadro precoce, ainda na criança escolar, é o principal fator que contribui para a rápida progressão miópica. Isso significa que o aumento da prevalência de altas miopias se deve ao início cada vez mais precoce da miopia com progressões cada vez mais rápidas. A miopia pode estar associada a um risco aumentado de patologias oculares como o descolamento de retina, a catarata, o glaucoma e a maculopatia miópica, que podem levar a déficit visual e cegueira.

Atualmente a miopia afeta mais de 30% da população mundial. Estudos recentes demonstram que em 2050 metade da população mundial será míope e em torno de 10% altos míopes. Nesses últimos, a principal causa de perda visual irreversível é a maculopatia miópica. O impacto socioeconômico das complicações da alta miopia é bastante significativo. Por esse motivo as estratégias de controle de miopia são temas cotados na oftalmologia. Diminuir a progressão da miopia é o um dos objetivos mais importantes das pesquisas relacionadas a miopia. Miopia parental, início precoce, asiáticos e rápida progressão são os principais fatores de risco para desenvolvimento de alta miopia. Os modelos predizem que uma estratégia de controle de miopia que consiga atrasar a progressão da miopia em 30-40% podem reduzir o risco de alta miopia e suas complicações.

Quais são os tratamentos para controle de miopia atuais? 

  • Controle ambiental: aumentar o tempo de atividade ao ar livre, reduzir tempo de atividade perto;
  • Tratamento farmacológico: colírio de atropina em baixa dose (0,01% e 0,05%) (eficácia entre 60 e 77%);
  • Ortoceratologia (eficácia entre 37 e 56%);
  • Lentes de contato modificadoras do defocus periférico (eficácia entre 25 e 79%);
  • Lentes oftálmicas bifocais ou progressivos (eficácia média de 19%);
  • Lentes oftálmicas com defocus periférico (DIMS) (progressão de miopia 52% menor em dioptrias e 62% menor em crescimento do comprimento axial);

Muitos estudos demonstraram que o defocus hiperópico na retina periférica causa miopia axial central, ou seja, o alongamento axial é dirigido pela retina periférica. Baseado nessa teoria, minimizar o defocus hiperópico periférico ou induzir um defocus miópico periférico poderia prevenir a progressão da miopia.  A Ortoceratologia utiliza lentes de geometria reversa durante a noite que remodelam o epitélio da córnea, induzindo um relativo shift miópico.

Como funcionam as lentes MiSight? 

As lentes MiSight, da CooperVision, que serão introduzidas no mercado brasileiro em breve, estão no grupo das lentes dual focus baseadas em um desenho de anel concêntrico. São lentes gelatinosas de descarte diário, de Omafilcon A, aprovadas pelo FDA para correção e controle de miopia em crianças com olhos normais, iniciando o tratamento entre 8-12 anos, com refração entre -0,75 e -4,00 de equivalente esférico com não mais que 0,75 de astigmatismo. A lente contém uma área central de correção de 3,36 mm circundada por zonas concêntricas que alternam poder de longe e perto. O poder óptico da zona corretora corrige o erro refrativo enquanto as zonas de tratamento produzem 2 dioptrias de defocus miópico simultâneo durante a visão de longe e perto. A área de correção central foi desenhada para dar boa visão para longe e o poder de perto é uma zona de tratamento que previne a progressão da miopia, impondo um defocus miópico na retina mais periférica como um estimulo a diminuir o crescimento ocular.

Estudos comprovando a eficácia das lentes MiSight

Estudos recentes demonstraram que a MiSight é efetiva em diminuir a progressão da miopia em relação aos grupos controles. A segurança e eficácia foram estudados num trial de 3 anos conduzido em 4 locais (Portugal, Reino Unido, Singapura e Canadá) e em um trial de 2 anos conduzido na Espanha. Os achados no trial de 2 anos de acompanhamento (46 crianças no grupo MiSight e 33 no grupo com óculos de visão simples) mostraram que a progressão diminuiu no grupo utilizando as lentes (0,45 D x 0,74 D, p < 0,001) e houve menor alongamento do comprimento axial (0,28 mm X 0,44mm, p < 0,001). No trial de 3 anos (53 no grupo MiSight e 53 no grupo controle) de acompanhamento, as mudanças na refração com cicloplegia foram no grupo com MiSight em média 0,40 D nos primeiros 12 meses, 0,54 D nos 24 meses e 0.73 D nos 36 meses. Isso foi significativo estatisticamente e representou redução na progressão da miopia de 69%, 59% e 59%.

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Entre os usuários de MiSight, 41% não tiveram alteração refracional (-0,25 ou menos) em comparação com 4% no grupo controle. 62% do grupo controle progrediu mais de 1 dioptria, comparado com 18% no grupo com MiSight. Em relação ao comprimento axial, no mês 12 a alteração tinha sido de 0,24 mm no controle versus 0,09 no grupo MiSight (diferença de 0,15 a menos). No mês 24 e 36 a diferença na alteração do comprimento tinha sido 0,24 e 0,32 a menos no grupo MiSight respectivamente. Essas diferenças representam controle da miopia de 63%, 53% e 52%. Chamberlein et al. continuaram o trial e o grupo controle original foi readaptado com MiSight 1 day. No ano 4, as crianças originalmente no grupo controle e que passaram a usar MiSight tiveram significativa redução na progressão miópica, indicando que a lente seria efetiva mesmo iniciando se numa idade maior. No curso dos estudos clínicos não houve evento adverso ocular em nenhum dos grupos de estudo, mostrando ser uma forma segura de correção da miopia.

Outras questões relacionadas a lente MiSight: 

  1. As lentes MiSight aumentaram a percepção de incômodo com a luz se comparadas com a correção com óculos de visão simples porém esse efeito diminuiu ao longo do follow up;
  2. As lentes MiSight não alteraram a função binocular e acomodativa em crianças;
  3. O uso das lentes de contato foi associado a melhor qualidade de vida se comparado ao uso dos óculos;
  4. O uso de lentes de descarte diário em crianças é uma excelente opção já que não necessita da rotina de limpeza e manutenção das lentes, diminuindo assim reações adversas e o risco de infecção;
  5. Utilizada dentro do protocolo de 8-12 anos, em pacientes com -0,75 a -4,00, é esperada uma redução na progressão de miopia entre 30 e 55%.

Atualmente a lente MiSight já é utilizada nos EUA, Reino Unido, França, Espanha, Portugal, Holanda, Bélgica, Alemanha, Austria, Suiça, Países Nórdicos, Chile, Israel, Singapura, Malásia, Hong Kong, Austrália e Nova Zelândia. E nos próximos meses no Brasil.

Referências bibliográficas:

  • Chamberlain P, Peixoto-de-Matos SC, Logan NS, Ngo C, Jones D, Young G. A 3-year Randomized Clinical Trial of MiSight Lenses for Myopia Control. Optometry and Vision Science. 2019 August;96(8):556-567.  doi: 1097/OPX.0000000000001410
  • Ruiz-Pomeda A, Villa-Collar C. Slowing the Progression of Myopia in Children with the MiSight Contact Lens: A Narrative Review of the Evidence. Ophthalmol Ther. 2020 Dec;9(4):783-795. doi: 1007/s40123-020-00298-y.

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