Mitos e verdades no tratamento da doença hepática gordurosa não alcoólica

Doença hepática gordurosa não alcoólica compreende espectro de alterações histológicas, que tem como denominador comum a esteatose hepática superior à 5%.

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O termo doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) compreende um amplo espectro de alterações histológicas, que tem como denominador comum a esteatose hepática superior à 5%. A prevalência de tal comorbidade gira em torno de 9-45% na população geral, podendo atingir até 70% dos pacientes obesos e já é o principal fator etiológico do carcinoma hepatocelular.

Sabe-se que sua fisiopatologia tem como pilar a resistência insulínica e, baseado nisso, diversas formas de tratamento já foram aventadas, muitas delas com resultados frustrantes. Sendo assim, faz-se necessário uma revisão do que há de novo e o que há de real benefício para o manejo destes pacientes.

  • Mudanças no estilo de vida

É, sem dúvidas, a intervenção com mais benefícios comprovados. A perda de 5% do peso corporal já parece reduzir a esteatose hepática e melhorar os parâmetros metabólicos, com redução ou remissão da esteatose em 64%. Perdas de peso superiores a 7%, elevam a redução da esteatose para 72%, gerando também redução da necro-inflamação hepática, e pacientes que conseguem reduzir mais de 10% do seu peso corporal têm 90% de remissão da esteatose e 45% de remissão da fibrose.

Além disso, a prática de atividades físicas, caracterizada como exercício aeróbico ou resistivo, gerou redução no acúmulo de gordura intra-hepática independente da perda de peso. Apesar de a maior parte dos estudos basearem seus dados em atividades aeróbicas, sabe-se que os exercícios resistivos são mais bem tolerados nos pacientes com capacidade funcional reduzida. Quando comparados, não há significância estatística que mostre superioridade de nenhuma modalidade de exercício.

  • Vitamina E

Pode ser considerada como primeira linha no tratamento farmacológico da DHGNA. Apesar de não ter efeito na perda de peso e na resistência insulínica, o uso de vitamina E comprovadamente reduz a inflamação hepática e, consequentemente, reduz o nível de transaminases. No entanto, não parece haver melhora significativa na fibrose.

  • Pioglitazona

A presença marcante da resistência insulínica na fisiopatologia da DHGNA fez com que as tiazolidinedionas surgissem como opção terapêutica. De fato, a pioglitazona mostra benefícios na redução de transaminases e, do ponto de vista histológico, reduz a esteatose e a inflamação lobular. Em comparação com a Vitamina E, a pioglitazona mostrou maior benefício na redução da fibrose, enquanto a Vitamina E se mostrou superior em reduzir inflamação. Entretanto, efeitos adversos como ganho de peso e retenção hídrica limitam significativamente o seu uso. Além disso, o uso prolongado de pioglitazona pode gerar uma piora na densidade óssea, predispondo à osteoporose.

  • Metformina

Por ser a grande droga do paciente diabético tipo 2, é inevitável pensar que os pacientes com DHGNA também se beneficiariam do seu uso. Porém, diversos estudos falharam em demostrar melhora na inflamação e fibrose hepática com a utilização da droga. Uma revisão sistemática de oito estudos controlados e randomizados mostrou não haver efeitos favoráveis da utilização de Metformina na histologia da DHGNA, embora possa ajudar a reduzir e resistência insulínica e otimizar a perda de peso. É importante ter o conhecimento de que a metformina vem sendo muito estudada fora do contexto de diabetes, principalmente na prevenção de doenças, e a mesma mostrou uma redução de até 56% no risco de desenvolver carcinoma hepatocelular, fazendo com que alguns autores recomendem seu uso na DHGNA apesar do fraco nível de evidência.

Estatinas

A hiperlipidemia está comumente associada à obesidade e ao diabetes mellitus tipo 2 e está presente em 20-80% dos pacientes com diagnostico de DHGNA. Tal fato nos leva a pensar que possivelmente as estatinas teriam benefício no tratamento destes pacientes. Contudo, estas drogas não foram capazes de reduzir inflamação ou fibrose hepática.

Todavia, cabe ressaltar que a dislipidemia por si só pode ser uma indicação para o uso de estatinas nestes pacientes, que por sua vez se mostrou seguro neste contexto. Ademais, a principal causa de morte nos pacientes com DHGNA são doenças cardiovasculares e o uso de estatina como estabilizadores de placa aterosclerótica poderia trazer benefícios.

  • Orlistat

Uma vez que a perda de peso se tornou um dos grandes pilares do tratamento da DHGNA, o uso de orlistat, um inibidor da lipase, passou a fazer parte de ensaios clínicos como forma de tratamento destes doentes. Porém, ao contrário do que se pensava, a utilização desta droga não gerou melhora significante nos níveis de transaminases, no peso corporal, na sensibilidade à insulina e na histologia hepática em comparação com placebo.

  • Agonista de GLP-1

Surge como uma possibilidade de terapia adjuvante nos pacientes que possuem diabetes tipo 2, uma vez que melhora o perfil glicêmico e reduz peso e o risco cardiovascular. Seu benefício na reversão da lesão hepatocelular parecer estar associado à perda de peso, porém são necessários estudos maiores para o esclarecimento do real papel deste medicamento na DHGNA.

Em suma, parece claro que a melhor forma de tratar o paciente com DHGNA é através de medidas não farmacológicas, priorizando redução de peso e pratica de atividades físicas, aeróbicas e exercícios resistivos. Vale lembrar que a maior parte destes paciente possui comorbidades de alto risco cardiovascular agregadas e o benefício das mudanças no estilo de vida seria imensurável neste contexto.

Como medidas farmacológicas, a primeira linha de tratamento é baseada no uso de Vitamina E e Pioglitazona. Porém, o uso de medicamentos só está indicados nos paciente com fibrose maior ou igual à F2 no fibroscan ou em pacientes F0/F1 com fatores predisponentes para a progressão da doença. A monitorização do tratamento deve ser feita com a dosagem periódica de transaminases.

LEIA MAIS: Testes não invasivos para avaliação da gravidade da doença hepática gordurosa não alcoólica do fígado

Referências:

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