O futuro da valva aórtica: TAVI versus cirurgia

Patologia com taxas de mortalidade de até 50% em 2 anos, a estenose aórtica severa era tida como entidade de tratamento primordialmente cirúrgico.

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Já se vão 15 anos desde que o Dr. Alan Cribier realizou com sucesso o primeiro implante percutâneo transvalvar aórtico, procedimento conhecido como TAVI, e que mudou a história do tratamento na estenose aórtica sintomática em paciente de alto e muito alto risco cirúrgico.  Patologia esta com taxas de mortalidade de até 50% em dois anos quando sintomática, a estenose aórtica severa era tida como entidade de tratamento primordialmente cirúrgico até o início do século 21.

Com a publicação inicial da série de estudos PARTNER I-B demonstrando redução no risco absoluto de mortalidade de 20% ao final de 12 meses com TAVI em pacientes inoperáveis, tipo de benefício poucas vezes visto nos anais de medicina, iniciou-se uma vasta corrida científica em torno destes dispositivos. Atualmente com mais de 100.000 próteses implantadas em todo o mundo, no mercado nacional dispomos de três dispositivos de TAVI para acesso femoral– segunda geração da Corevalve Evolut R (Medtronic), terceira geração da Sapien 3(Edwards) e a primeira geração da Lotus (Boston), o procedimento alcançou indicação classe I naqueles pacientes inoperáveis (score STS >10) e IIa nos de alto risco cirúrgico nos consensos de valvopatia da American Heart Association (AHA) e da European Society of  Cardiology (ESC).

Porém, como todo procedimento invasivo, a TAVI enfrentou percalços iniciais importantes como uma maior taxa de complicaçōes vasculares e de refluxo para-valvar, com impacto direto no prognóstico de curto e médio prazo destes pacientes. Com o surgimento de dispositivos de menor perfil, saímos de 24 French (1 French = 0.33 mm) com a prótese inicial (Cribier-Edwards – 2002) para 14 French com a última geração da Corevalve Evolut R e Sapien 3, em 2013, além da redução nas taxas de refluxo para-valvar através da optimização das técnicas de implante e, principalmente, por meio de adequada avaliação pré-implante com métodos de imagem (ecocardiograma trans-esofágico e angiotomografia computadorizada) orientando a escolha do tamanho e do dispositivo que mais se adeque ao anel valvar do paciente, diminuíram de forma marcante tais complicaçōes. Outra complicação observada é a maior necessidade de implante de marcapasso definitivo pós TAVI (5-12% com Sapien e até 24% com Corevalve), números que se mantêm ainda com a nova geração dos dispositivos, mas sem impactar desfavoravelmente o prognóstico dos pacientes.

Veja também: ‘Já é possível trocar valvas cardíacas sem cirurgia’

Haja vista o menor risco transoperatório de eventos como morte e AVC frente ao tratamento cirúrgico tradicional com substituição valvar por prótese biológica ou mecânica, não tardou para que começassem a brotar na literatura estudos investigando o implante de TAVI em populações com perfil de risco mais baixo (score STS moderado). O estudo PARTNER IIa, recentemente publicado pelo New England Journal of Medicine1, traz resultados animadores para este grupo de pacientes (score STS 4-8) ao demonstrar numa grande coorte (n=2039 pacientes) diminuição no risco relativo de morte e/ou AVC ao final de 2 anos de 21% em favor do grupo TAVI por acesso transfemoral (razão de chance = 0.79;IC 95% = 0.62 to 1.00; p = 0.05) versus o tratamento cirúrgico tradicional.

No congresso do American College of Cardiology (ACC) 2017 deveremos ter os resultados iniciais de outro aguardado estudo, o SURTAVI, com o dispositivo Corevalve para este mesmo perfil de pacientes com risco moderado. Esta tendência em tratar pacientes com perfil de risco mais baixo já vem sendo observada no mundo real quando analisamos os números de grandes registros como o TVT que evidencia um score STS médio de 7% em pacientes tratados por TAVI de Novembro de 2011 a Março de 20132. Neste mesmo período, no registro alemão GARY, país com política de seguro de saúde e reembolso compulsórios responsável por 46% das TAVIs realizadas na Europa Ocidental no ano de 2011, o STS médio foi de 5.0, um claro indicativo de um perfil de risco intermediário3.

Seguindo esta tendência de ampliar a população candidata às TAVIs, poderia se imaginar que em breve a cirurgia cardíaca de troca valvar se tornaria obsoleta, mas ainda estamos longe disto. Uma questão temporal é crucial antes de se ampliar a indicação destes dispositivos numa população mais jovem; qual a durabilidade destes implantes?  Os resultados tardios mais longos reportados na literatura são de cinco anos, com um menor número de até nove anos de seguimento clínico sem evidências de disfunção protética significativa para a Sapien4, porém é prematuro extrapolar tais resultados para os outros tipos de próteses, haja vista os diferentes desenho e estrutura destas.

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No Brasil, por ação do Ministério Público Federal, desde 2013 o procedimento faz parte do rol da Agência Nacional de Saúde (ANS), mas existe um longo caminho para incorporação desta tecnologia pelo Sistema Único de Saúde (SUS), haja vista o alto custo para os padrões da nossa economia. A liberação de novas próteses ao nosso mercado (em 2017 deveremos ter a quarta válvula transfemoral disponível no mercado nacional – Portico/St Jude) traz expectativas para a redução do custo destes dispositivos, que vieram para ficar e talvez se tornar “padrão-ouro” numa gama ainda maior de pacientes.

 

Referências:

  • Leon, MB et al. Transcatheter or Surgical Aortic-Valve Replacement in Intermediate-Risk Patients. New Engl J Med 2016; (17):1609-20.
  • Mack MJ, Brennan JM, Brindis R, et al. Outcomes following transcatheter aortic valve replacement in the United States. JAMA 2013; 310:2069–2077.
  • Walther T, Hamm CW, Schuler G, et al. Perioperative results and complications in 15,964 transcatheter aortic valve replacements: prospective data from the GARY Registry. Am Coll Cardiol 2015;65:2173–2180.
  • Mack MJ, Leon MB, Smith CR, et al. 5-year outcomes of transcatheter aortic valve replacement or surgical aortic valve replacement for high surgical risk patients with aortic stenosis (PARTNER I): a randomised controlled trial. Lancet 2015;385:2477–2484.

 

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