Os pacientes com alto risco de reações anafiláticas podem receber a vacina Pfizer-BioNTech?

As principais reações adversas à vacina Pfizer-BioNTech descritas em estudos preliminares foram dor no local da injeção, fadiga e cefaleia.

Em dezembro de 2020, a Food and drug Administration (FDA) dos Estados Unidos da América (EUA) autorizou o uso emergencial da vacina Pfizer-BioNTech (BNT162b2) para o tratamento da Covid-19. Trata-se de vacina a base de mRNA (ácido ribonucleico mensageiro) modificado e encapsulado em nanopartículas lipídicas que codifica a proteína Spike (S) do SARS-CoV-2. A administração ocorre em duas doses com intervalo de 21 dias, garantindo eficácia de aproximadamente 95% na prevenção da Covid-19. 

As principais reações adversas à vacina Pfizer-BioNTech descritas em estudos clínicos preliminares foram dor no local da injeção, fadiga e cefaleia, sendo que pacientes com histórico de reação alérgica a qualquer componente da vacina ou a outras vacinas ou com outras alergias foram excluídos destes testes. 

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Logo após a autorização de uso emergencial, a taxa relatada de casos de anafilaxia em pacientes que receberam a vacina foi 4,7-11,1 casos/milhão de doses (risco aumentado em até 10 vezes em relação ao risco de anafilaxia das vacinas comumente utilizadas). Destes episódios de anafilaxia, 90% ocorreram em pacientes do sexo feminino e 81% dos pacientes relataram reações alérgicas anteriores. O polietilenoglicol, lipídio usado para encapsular o mRNA, é um dos componentes suspeitos como fator causador destas reações. 

Devido a ocorrência de anafilaxia em proporção exacerbada, em 31 de agosto de 2021 foi publicado no JAMA (Journal of the American Medical Association) um artigo original, que se propôs a responder a seguinte pergunta: pacientes com alto risco de reações anafiláticas podem receber a vacina da Pfizer-BioNTech (BNT162b2) Covid-19?

Foi desenhado um estudo de coorte prospectivo no período de 27 de dezembro de 2020 a 22 de fevereiro de 2021. A amostra inicial de 8102 pacientes consistia em voluntários inscritos com histórico de reações alérgicas de qualquer natureza. Estes foram submetidos à avaliação de risco para reações alérgicas, sendo que 6883 indivíduos (85%) foram orientados a receber imunização em ambiente regular e 1219 foram selecionados para compor a amostra do estudo.

Uma equipe composta por imunologistas e alergologistas clínicos aplicou um questionário aos pacientes elegíveis para o estudo (1.219), classificando-os em grupos de baixo e alto risco para reações anafiláticas, além de determinar quais pacientes deveriam ser excluídos do estudo.

Os pacientes com alto risco de reações anafiláticas podem receber a vacina Pfizer-BioNTech?

Tabela 1. Classificação dos pacientes quanto ao risco de reação anafilática

Grupo Critérios (aos menos um dos seguintes)
Baixo risco (n = 785) Histórico de sensibilidade a aeroalérgenos, picadas de insetos, alimentos, látex ou meio de contraste, além de pacientes que tiveram reação não anafilática a um único grupo de drogas ou urticária
Alto risco (n = 429) Reação anafilática anterior a qualquer medicamento ou vacina; alergias a múltiplos medicamentos; alergias múltiplas; ou história de mastocitose/distúrbios dos mastócitos ou quando a equipe médica assistente adiou a vacinação destes pacientes devido à preocupação com o elevado risco de reação alérgica grave

Os pacientes classificados como baixo risco (785 pacientes) receberam o imunizante e permaneceram em observação por 30 minutos. Quaisquer efeitos colaterais deveriam ser informados pelo paciente ou seu médico assistente ao centro de referência. Apenas cinco pacientes foram considerados inelegíveis para o estudo (dois devido à sensibilidade conhecida ao polietilenoglicol e três com múltiplas reações anafiláticas a diferentes drogas).

O grupo de alto risco, composto por 429 pacientes (sendo 304 do sexo feminino com média de idade de 56 anos [desvio padrão de 16 anos]), contava com pacientes com extensa história de reações alérgicas, como anafilaxia prévia (271 [63,2%]), múltiplas alergias (130 [30,3%]), alergias a múltiplas drogas (141 [32,9%]), usuários/portadores de seringas de adrenalina (95 [22,1%]), alergia alimentar (68 [15,9%]) e uso regular de anti-histamínicos (62 [14,5%]). Estes pacientes receberam a primeira dose da vacina e permaneceram sob observação pela equipe médica do estudo por duas horas. Não foi utilizada pré-medicação, entretanto pacientes que faziam uso crônico de medicamentos antialérgicos tiveram suas medicações mantidas. Os pacientes receberam a segunda dose da vacina no mesmo local e preencheram um questionário referente aos 21 dias de intervalo entre as vacinas.

Definiu-se como reações adversas precoces aquelas ocorridas até duas horas após a vacinação e se resolveram antes de 24 horas; as reações tardias tiveram duração maior do que 24 horas. Os dados foram comparados com os pacientes divididos em dois grupos (idade entre 16-55 anos e idade > 55 anos).

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Dos pacientes que apresentavam alto risco para reações anafiláticas, 97,9% (420 pacientes) não apresentaram nenhum tipo de reação alérgica. Nas duas horas de observação após a vacinação, nove pacientes do sexo feminino (2,1%) apresentaram algum tipo de reação alérgica, sendo que seis destas (1,4%) apresentaram reações alérgicas leves (exantema leve, edema de língua ou úvula ou tosse que se resolveram após administração de anti-histamínicos) e três pacientes (0,7%) apresentaram reação anafilática após 10-20 minutos da administração da vacina (todos os pacientes com broncoespasmo, exantema difuso com prurido e dispneia; dois com angioedema; e um com sintomas gastrointestinais), sendo tratados com adrenalina, anti-histamínicos e broncodilatador inalatório (um deles recebeu corticoterapia sistêmica), com resolução dos sintomas em duas a seis horas, sem necessidade de hospitalização, porém sendo contraindicados a receber a segunda dose do imunizante.

O evento adverso tardio mais comum foi dor no local da injeção, que foi menos frequente entre os participantes com mais de 55 anos do que entre os participantes mais jovens (108 de 127 [85,0%] vs 56 de 91 [61,5%]; p < 0,001). Os eventos adversos sistêmicos mais comuns foram fadiga, cefaleia e dores musculares em ambas as faixas etárias. O aparecimento de erupção cutânea, coceira ou urticária nos dias após a primeira dose foi de 14,7% (32 de 218).

Do total de 429 pacientes que pertenciam ao grupo de alto risco que recebeu a primeira dose, 218 receberam a segunda dose da vacina até a data de análise dos dados. Destes, 214 (98,2%) não apresentaram reações alérgicas, sendo que quatro pacientes apresentaram reações alérgicas leves (três destes apresentaram o mesmo tipo de reação após a primeira dose e somente um destes apresentou esse tipo de reação exclusivamente após a segunda dose).  

Mensagem prática

A vacina contra a Covid-19 da Pfizer-BioNTech apresenta risco aumentado para reações anafiláticas quando comparada aos outros imunizantes disponíveis. A ocorrência deste tipo de reação está intimamente relacionada ao histórico de reações alérgicas (e anafilaxia) do paciente. 

Enquanto médicos assistentes seremos consultados por nossos pacientes ou outros médicos sobre qual o risco de desenvolvimento de reação alérgica. Esse dado ainda não foi sedimentado e nenhum protocolo estruturado foi validado até o momento, entretanto com os dados deste estudo podemos acreditar que, mesmo para pacientes alérgicos classificados como de alto risco para ocorrência de anafilaxia (pelos critérios do estudo), é seguro serem vacinados, desde que em serviço preparado para observação médica por tempo reduzido (menor que duas horas) e atendimento a emergências clínicas. Lembrando que, frente à pandemia, o benefício da vacinação supera os riscos em muito, mesmo frente a esse subgrupo de população que seriam os pacientes com risco aumentado de reações alérgicas.

Referências bibliográficas:

  • Shavit R, Maoz-Segal R, Iancovici-Kidon M. Prevalence of Allergic Reactions After Pfizer-BioNTech COVID-19 Vaccination Among Adults With High Allergy Risk. JAMA Network Open. 2021;4(8):e2122255. doi:10.1001/jamanetworkopen.2021.22255.
  • Polack  FP, Thomas  SJ, Kitchin  N,  et al; C4591001 Clinical Trial Group.  Safety and efficacy of the BNT162b2 mRNA COVID-19 vaccine.   N Engl J Med. 2020;383(27):2603-2615. doi:10.1056/NEJMoa2034577.

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