As síndromes hipertensivas acometem cerca de 10% de todas as gestações. Em 2019, estima-se um acometimento de 18 milhões de gestantes em todo o mundo.
A má assistência prestada a gestações complicadas pela hipertensão contribui para uma elevada morbidade e mortalidade materna e perinatal. Um diagnóstico precoce e um bom controle pressórico podem melhorar essa assistência, evitando algumas complicações.
Em adultos hipertensos não gestantes, recomenda-se o automonitoramento da pressão arterial (PA) como estratégia para um bom controle pressórico. Entretanto, não é claro se essa estratégia é superior a rotina de pré-natal habitual em gestantes hipertensas ou em gestantes com risco de desenvolver hipertensão.
Estudos
Diante disso, estudos publicados em maio de 2022, no JAMA Network, compara o automonitoramento da PA pela gestante com o cuidado habitual do pré-natal no diagnóstico precoce de hipertensão (HAS) e no bom controle pressórico.
Para a primeira avaliação, os autores realizaram um ensaio clínico randomizado e não cego que incluiu 2.441 gestantes com risco de pré-eclâmpsia. Foram recrutadas mulheres com 20 semanas de gestação em média e provenientes de 15 serviços hospitalares da Inglaterra. Os participantes foram randomizados para automonitoramento da PA (n = 1.223) ou apenas assistência pré-natal usual (n = 1.218).
Para a segunda avalição, os autores também realizaram um ensaio clínico randomizado e não cego que incluiu 850 gestantes. Foram recrutadas gestantes com até 37 semanas, provenientes dos mesmos serviços hospitalares e que tiveram diagnóstico de hipertensão arterial crônica ou gestacional. Os participantes foram randomizados para automonitoramento da PA (n = 430) ou apenas assistência pré-natal usual (n = 420).
O recrutamento ocorreu entre novembro de 2018 e setembro de 2019 e o acompanhamento final foi concluído em maio de 2020.
As participantes randomizadas para automonitoramento da PA continuaram com o pré-natal habitual e, além disso, receberam um monitor automatizado, treinamento e instruções escritas. Em seguida, foram matriculadas em um sistema de tele monitoramento baseado em ligações telefônicas e anotações em um diário de papel. Foi solicitado às participantes que monitorasse sua PA, fazendo duas leituras cada vez e enviando manualmente usando o aplicativo do estudo. Leituras elevadas desencadeavam uma solicitação do aplicativo para uma terceira leitura. Se a terceira leitura também fosse elevada, o aplicativo acionava uma mensagem para que a participante entrasse em contato com sua maternidade local. O pré-natal habitual consistiu em gestantes que frequentaram a clínica pré-natal, conforme exigido (≥7 vezes durante uma gravidez descomplicada).
O desfecho primário do primeiro estudo foi o intervalo de tempo entre o recrutamento e o registro de “hipertensão clínica”. A hipertensão clínica foi definida como PA sustentada de 140/90 mmHg ou superior registrada por um profissional de saúde. Já o desfecho primário do segundo estudo foi a diferença da pressão arterial média registrada por profissionais de saúde entre o recrutamento e o parto.
Resultados
No primeiro estudo, o diagnóstico de HAS foi realizado em 363 (15,5%) gestantes, dos quais 102 (4%) apresentaram pré-eclâmpsia: 179 (15,3%) no grupo de intervenção e 184 (15,7%) no grupo de atenção habitual. O desfecho não foi diferente entre as mulheres que se auto monitoraram ou receberam apenas o pré-natal habitual (média ± desvio padrão, 104,3 ± 32,6 dias vs 106,2 ± 32,0 dias, respectivamente; diferença entre as média, −1,6 dias [IC 95%, −8,1 a 4,9]; P = 0,64]).
Os resultados do segundo estudo mostraram dados disponíveis de 444 participantes com hipertensão crônica (média de idade: 36 anos) e 377 com hipertensão gestacional (média de idade: 34 anos). No primeiro grupo, não houve diferença estatística significativa na pressão arterial sistólica média entre os grupos de automonitoramento versus o grupo de cuidados habituais (133,8 mm Hg vs 133,6 mm Hg, respectivamente; diferença média ajustada, 0,03 mm Hg [IC 95%, -1,73 a 1,79]). No segundo grupo, mulheres com hipertensão gestacional, também não houve diferença na pressão arterial sistólica média (137,6 mm Hg em comparação com 137,2 mm Hg; diferença média ajustada, -0,03 mm Hg [IC 95%, −2,29 a 2,24]). Houve oito eventos adversos graves no grupo de automonitoramento e 3 no grupo de cuidados habituais, não apresentando significância estatística.
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Conclusão
Os autores concluíram que entre as gestantes com risco de pré-eclâmpsia, o automonitoramento da pressão arterial associado ao tele monitoramento, em comparação com o cuidado habitual, não levou à detecção mais precoce de hipertensão arterial, assim como, em gestantes hipertensas não levou a um melhor controle pressórico.