Perda visual monocular em paciente com Covid-19

Artigo reportou o primeiro caso de paciente com oclusão da artéria central da retina como manifestação inicial da infecção por Covid-19.

O impacto exato da Covid-19 na incidência de doença cerebrovascular aguda ainda não foi determinada mas algumas publicações recentes correlacionam a Covid-19 a grandes oclusões vasculares. Um artigo publicado esse ano na Clinical Neurology and Neurosurgery reportou o primeiro caso de paciente com oclusão da artéria central da retina como manifestação inicial da infecção por Covid-19.

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Perda visual monocular em paciente com Covid-19

Características do caso

O caso reportado era de um paciente na quinta década de vida avaliado na emergência do Wills Eye com início agudo de perda visual indolor a direita. O paciente negava episódios prévios de perda visual transitória, diplopia, cefaleia, alterações sensoriais, fraqueza ou perda de fala. A história patológica pregressa era significativa para hipertensão, tabagismo e uso de maconha. Segundo o mesmo, não fumava há 2 semanas. Não fez uso de nenhuma medicação sistêmica. Na revisão de sistemas, tinha tido faringite leve e diarreia por 2 ou 3 dias mas negou febre, tosse, alterações do olfato ou paladar, confusão mental e queixas respiratórias.

Ao exame tinha pressão de 174/107 mmJh, oximetria de 97% em ar ambiente e afebril (36,8 °C). A acuidade visual era de movimento de mãos no olho direito e 20/20 em olho esquerdo. Um defeito pupilar aferente proeminente estava presente a direita. A motilidade extraocular era normal e o segmento anterior não tinha outras alterações a não ser uma catarata nuclear. Achados retinianos associados a oclusão arterial da retina estavam presentes em olho direito porém sem placas embólicas. No olho esquerdo foram encontrados uma malformação arteriovenosa com uma mancha algodonosa e uma hemorragia em chama de vela. O exame neurológico era normal.

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O paciente foi submetido a PCR para Covid-19 e o diagnóstico foi confirmado. Na ressonância magnética não havia sinais de evento isquêmico agudo ou hemorragia. Um defeito de enchimento envolvendo a porção média e distal da artéria carótida comum direita e se estendendo para o segmento comunicante da artéria carótida interna direita foi visto na angiotomografia. O fluxo diminuído também foi notado na artéria oftálmica direita. Não foi vista calcificação significativa. Os resultados laboratoriais evidenciaram um tempo de protrombina pouco elevado (14,6, normal 9,4–13,0 seg) e INR elevado (1,29, normal 0,83–1,14). O D dímero estava elevado (450, normal < 230 ng/mL DDU), fibrinogênio alto (545, normal 170− 460 mg/dL), LDH alto (272, normal 125–240 IU/L), e PCR alto (2,10, normal ≤ 0,80 mg/dL). Foi iniciada heparina de baixo peso molecular e o paciente foi transferido para unidade neurointensiva. Se manteve estável, afebril e com boa saturação em ar ambiente.

Análise

Vírus como o Covid-19 podem penetrar o sistema nervoso central (neurovirulência), podem também se ligar a  receptores da ACE-2 (enzima conversora de angiotensina) que estão ligados na autorregulação da pressão de perfusão cerebral, mas tem sido mais comum a evolução para eventos isquêmicos (que podem ocorrer em todos os grupos etários) associados a hipercoagulabilidade relacionada ao estado inflamatório, a coagulação intravascular disseminada induzida pela infecção e ao embolismo relacionado a injúria cardíaca pelo vírus. Esses mecanismos podem contribuir para o desenvolvimento de várias patologias que podem resultar em perda visual uni ou bilateral como a oclusão de artéria oftálmica, a oclusão de artéria central da retina, a oclusão de veia central da retina, a neuropatia óptica, o infarto cortical occipital e a neuroretinopatia macular aguda.

No paciente em questão o estado de hipercoagulabilidade levou a formação de trombo na carótica interna que levou a oclusão de artéria central da retina. A oclusão causa isquemia retiniana e deve ser tratada imediatamente para evitar morte celular e cegueira. As células retinianas conseguem suportar no máximo 2h em condições isquêmicas. A terapia com oxigênio hiperbárico pode ser usada como adjunta ao tratamento trombolítico. Esse caso ilustra a necessidade de suspeitar de Covid-19 em paciente com quadro neurológico ou oclusões vasculares retinianas incluindo indivíduos assintomáticos ou minimamente sintomáticos para a infecção por Covid-19.

Referências bibliográficas:

  • Murchinson AP, et al. Monocular visual loss as the presenting symptom of COVID-19 infection. Clinical Neurology and Neurosurgery. 2021;201:106440. doi: 1016/j.clineuro.2020.106440

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