Pneumonite química: o que há de novo no prognóstico da doença?

A pneumonite química pós-operatória pode ser minimizada, garantindo que o paciente tenha jejum por ao menos 8 horas e tenha se abstido de líquidos claros.

Tempo de leitura: [rt_reading_time] minutos.

Este artigo é a terceira parte de uma série especial sobre pneumonias aspirativas. A parte 1 se intitula Pneumonia aspirativa: o que há de novo na abordagem da doença? Parte 1 e a segunda parte denomina-se Pneumonia aspirativa: o que há de novo na abordagem da doença? Parte 2.

A aspiração de pequenas quantidades de secreção orofaríngea (microaspiração) é algo normal em pessoas saudáveis durante o sono. Entretanto, também figura como um dos principais mecanismos fisiopatogênicos das pneumonias. Já quando ocorre a aspiração de grande quantidade de conteúdo não colonizado do trato gastrointestinal temos a macroaspiração, que pode evoluir para uma reação inflamatório devido à irritação pelo conteúdo gástrico e ácidos biliares, sem infecção, o que é denominado pneumonite química. A pneumonite química só ocorre com aspiração de grande volume com pH baixo (geralmente < 2,5).

Em modelos animais, a pneumonite química se desenvolve somente após a exposição a, pelo menos, 120 mL de conteúdo gástrico com pH de 1. Na maioria dos casos, nem a pneumonite química, nem a pneumonia aspirativa ocorrem devido à aspiração de alimentação por sonda ou de sangue, uma vez que o pH do aspirado geralmente é alto e não contaminado por bactérias. A lesão pulmonar por aspiração ácida ocorre em decorrência da liberação de mediadores inflamatórios, incluindo quimiocinas, citocinas pró-inflamatórias e recrutamento de neutrófilos.

Em 1946, Mendelson descreveu a pneumonite química como complicação da anestesia obstétrica. Na atualidade, a pneumonite química é incomum quando relacionada ao procedimento anestésico de modo geral (um caso por 3216 procedimentos), sendo que o risco aumenta quando se trata de cirurgias de emergência e reduz nos procedimentos eletivos. Em até 64% dos pacientes com aspiração durante a anestesia, anormalidades clínicas ou radiográficas não se desenvolvem.

Leia maisCBMI 2018: devemos manter via oral quando há risco de broncoaspiração?

A pneumonite química é caracterizada por um início súbito de dispneia, hipoxemia, taquicardia e sibilos ou crepitações difusas à ausculta pulmonar. A asfixia pode ocorrer quando da aspiração de grandes volumes. A síndrome do desconforto respiratório agudo se desenvolve em até 16,5% dos pacientes com aspiração testemunhada, embora a frequência aumente se outros fatores de risco estiverem presentes (choque, trauma ou pancreatite).

A radiografia de tórax geralmente é alterada, até que o material aspirado seja eliminado por sucção ou tosse. Um detalhe interessante é que geralmente os aspirados com pH baixo são estéreis, sendo que a infecção bacteriana não ocorre no início do quadro, mas pode se desenvolver subsequentemente.

Embora a terapia supressora da acidez gástrica esteja associada a um risco aumentado de pneumonia adquirida na comunidade ou pneumonia hospitalar, devido ao crescimento gástrico de bactérias gram-negativas, a neutralização do pH gástrico pode reduzir o risco de pneumonite química.

O diagnóstico da pneumonite química é clínico, mas alguns estudos utilizam culturas quantitativas de lavagem pulmonar para distinção entre esta entidade e a pneumonia bacteriana.

O tratamento inicial da aspiração de conteúdo gástrico requer manutenção das vias aéreas, controle do edema e/ou broncoespasmo e minimização do dano tecidual. Dependendo da gravidade da pneumonite e da extensão dos cuidados necessários, o tratamento pode incluir aspiração, broncoscopia, intubação orotraqueal, ventilação mecânica e terapia intensiva. O uso de glicocorticoides não é recomendado.

A antibioticoterapia só é indicada em pacientes que façam uso de supressoras da acidez gástrica ou tenham um quadro de obstrução do intestino delgado. Em casos leves a moderados, recomenda-se a suspensão de antibióticos, mesmo se houver evidência radiográfica de infiltrado, monitoramento de achados clínicos e radiográficos e reavaliação após 48h. Em casos mais graves, entretanto, os antibióticos devem ser iniciados empiricamente, e a decisão de continuar com a antibioticoterapia por mais de dois a três dias deve ser guiada pela evolução clínica do paciente.

A pneumonite química pós-operatória pode ser minimizada, garantindo que o paciente tenha jejum por ao menos oito horas e tenha se abstido de líquidos claros por, pelo menos, duas horas antes de a cirurgia ser realizada. Medicamentos conhecidos por promover aspiração e interferir com a deglutição pneumonite química, incluindo sedativos, agentes antipsicóticos e, para alguns pacientes de risco, anti-histamínicos.

É médico e quer ser colunista do Portal da PEBMED? Inscreva-se aqui!

Referências:

  • Mandell LA, Niederman MS. Aspiration Pneumonia. N Engl J Med 2019;380:651-63.

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo

Selecione o motivo:
Errado
Incompleto
Desatualizado
Confuso
Outros

Sucesso!

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo.

Você avaliou esse artigo

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Baixe o Whitebook Tenha o melhor suporte
na sua tomada de decisão.

Especialidades