Principais orientações na prescrição de anticoagulantes

Em nossa publicação de conteúdos compartilhados do Whitebook, vamos falar sobre: Principais orientações na prescrição e manejo clínico dos anticoagulantes.

Nessa semana, publicamos um artigo explicando os principais aspectos no manejo de pacientes com coagulopatias, quando em situações que necessitem de anticoagulação: Anticoagulação em pacientes com coagulopatias. Por isso, em nossa publicação semanal de conteúdos compartilhados do Whitebook Clinical Decision, vamos falar sobre: Principais orientações na prescrição e manejo clínico dos anticoagulantes.
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Este conteúdo deve ser utilizado com cautela, e serve como base de consulta. Este conteúdo é destinado a profissionais de saúde. Pessoas que não estejam neste grupo não devem utilizar este conteúdo.

Introdução

  • Os anticoagulantes utilizados na prática clínica são representados pela heparina e pelos anticoagulantes orais. O presente capítulo busca resumir as principais orientações na prescrição e manejo clínico dos anticoagulantes.

Heparina Não-fracionada (HNF):

  • Mecanismo de Ação: Inibe indiretamente a trombina por atuar como co-fator da antitrombina (AT), aumentando sua atividade e, consequentemente, seu efeito anticoagulante sob a trombina, o fator Xa, e, em menor grau, os fatores XII, XI e IXa.
  • Limitações:
    • Curta janela terapêutica;
    • Relação dose-resposta altamente variável, devido a sua variável biodisponibilidade decorrente da ligação a proteínas plasmáticas, o que requer monitorização laboratorial;
    • Menor eficácia em pacientes com doenças agudas, pois muitos dos reagentes inflamatórios de fase aguda são proteínas de ligação à heparina, diminuindo sua biodisponibilidade;
    • Incapacidade de inativar a trombina ligada à fibrina, bem como o fator Xa dentro de um trombo, ou seja, um trombo pode continuar a crescer apesar do uso da heparina.
  • Monitorização: A resposta anticoagulante de uma dose padrão de HNF varia amplamente entre os pacientes, e não há informações suficientes na literatura que determinem a modificação da dose inicial de acordo com o perfil hemodinâmico do paciente (peso “seco” X peso “molhado”), sendo necessário monitorar a resposta de cada paciente, utilizando-se o tempo de tromboplastina parcial ativada (PTTa) ou os níveis plasmáticos de heparina. As medições devem ser feitas antes da terapia com heparina, quatro a seis horas após seu início, e quatro a seis horas após qualquer alteração de dose. O valor geralmente aceito como alvo de manutenção da terapia com heparina é de 1,5 a 2,5 vezes a média do valor de controlo ou do limite superior do intervalo normal de PTTa.
  • PTTa basal alargado: A presença de um PTTa basal alargado torna este teste pouco confiável na monitorização da terapia com heparina não fracionada (HNF), sendo necessária a utilização de testes alternativos de monitorização:
    • Dosagem de anti-fator Xa ou dosagem de heparina séricos (não são afetados pela presença do anticoagulante lúpico ou por deficiência de fator de coagulação);
    • Se a razão do PTTa é de fato o anticoagulante lúpico, podem ser usados testes de PTTa não sensíveis ao anticoagulante lúpico;
    • Alternativamente, podemos utilizar um heparina de baixo peso molecular (HBPM), que não exige monitorização pelo PTTa.
  • Monitorizar contagem de plaquetas: Pelo risco de trombocitopenia induzida por heparina, deve-se monitorizar a contagem de plaquetas diariamente a partir do 4º dia de tratamento com HNF, ou a cada dois a três, também a partir do 4º dia, em pacientes em uso de dose profilática, até o 14º dia ou até que a heparina seja interrompida
  • Resistência à heparina: Corresponde a pacientes que necessitam de altas doses  de heparina para atingir um PTTa no intervalo terapêutico (1,5-2,5) (> 35.000 U/24h, com exclusão do bolus inicial). Causas desse fenômeno incluem o aumento da liberação de heparina, aumento dos níveis de heparina ligada a proteínas plasmáticas, as elevações de fibrinogênio e dos níveis de fator VIII, certos medicamentos (por exemplo, a aprotinina) e a deficiência de antitrombina. Preconiza-se que o ajuste da dosagem de heparina em pacientes com resistência deve ser baseada nos níveis de anti-Xa, em vez do PTTa. Nos casos de deficiência de antitrombina, para a ação da heparina, deve ser administrado concentrado de antitrombina, e monitorado seu nível sérico.
  • Administração e Eficácia: A administração de heparina intravenosa é repleta de dificuldades e a prática clínica do uso de uma abordagem de titulação da dose de heparina freqüentemente resulta em terapia inadequada (60% dos pacientes tratados falham em alcançar um PTTa adequado em 24 horas). Mesmo com a criação de protocolos de administração, subdosagem, juntamente com a impossibilidade de obtenção de um PTTa adequado durante as 24 horas iniciais, é ainda um problema, especialmente nos pacientes obesos.
  • Complicações
    • Sangramento: O manejo da hemorragia em um paciente submetido a heparina depende da localização, gravidade da hemorragia, risco de tromboembolismo venoso recorrente (TEV), e nível do PTTa. Em pacientes com TEV recente e sangramento importante induzido por heparina, deve-se considerar interrupção da anticoagulação e inserção de um filtro de veia cava inferior. Em sangramentos vultuosos, a pronta reversão do efeito da heparina pode ser necessária pelo sulfato de protamina;
    • Trombocitopenia induzida por heparina: Complicação bem reconhecida e potencialmente fatal da terapia com heparina, normalmente ocorrendo dentro de 5 a 10 dias após o início da terapia com heparina;
    • Necrose cutânea: Pacientes afetados desenvolvem anticorpos heparina-dependentes, mas a maioria não experimenta trombocitopenia;
    • Osteoporose: Tem sido relatada em pacientes que receberam heparina não fracionada por mais de seis meses.

Heparina de baixo peso molecular (HBPM):

  • Mecanismo de Ação: Assim como a heparina não fracionada, as heparinas de baixo peso (HBPM) inativam o fator Xa. No entanto, diferente daquelas, apresentam menor efeito sobre a trombina, por serem moléculas pequenas e incapazes de formar os complexos inativadores da trombina. Portanto, as HBPM (e fondaparinux) não causam alargamento do PTTa. São, no mínimo, tão eficazes quanto a heparina não fracionada na prevenção e tratamento do tromboembolismo venoso.
  • Vantagens
    • Maior biodisponibilidade por via subcutânea;
    • Duração de efeito anticoagulante prolongado, permitindo 1 a 2 administrações diárias;
    • Efeito dose-resposta (atividade anti-Xa) mais previsível e com boa relação ao peso corporal. Sendo necessário seu ajuste apenas em obesos e portadores de insuficiência renal;
    • Monitorização laboratorial não é necessária;
    • Menor risco de complicações hemorrágicas e imunomediadas (trombocitopenia e necrose cutânea), podem ser administrada com segurança em ambiente ambulatorial (o risco não é nulo!).
  • Equivalência: As três HBPM de uso clínico (enoxaparina, dalteparina e tinzaparina) não apresentam equivalência de doses entre si, no entanto, todas são consideradas igualmente potentes, não havendo diferença estabelecida entre estas.
  • Sangramento e reversão com protamina: Ao contrário de sua eficácia com heparina não fracionada, a protamina não neutraliza completamente a atividade anti-Xa das HBPM. Ainda assim, pacientes que sofrem de hemorragia por superdosagem de HBPM devem receber sulfato de protamina (1 mg/100 unidades de atividade anti-Xa), o que pode reduzir parcialmente o sangramento clínico. Doses menores podem ser suficientes caso a última dose de HBPM tenha sido administrada há 8 horas ou mais.

Cumarínicos – Antagonistas da Vitamina K:

  • A Varfarina é o anticoagulante oral mais usado na prática clínica ambulatorial. Embora amplamente utilizado, seu manejo clínico não é dos mais simples, apresentando estreita janela terapêutica, grande variabilidade na relação dose-resposta e grande interação com outras drogas e alimentação. O conhecimento de suas propriedades farmacológicas, portanto, é fundamental para a correta prescrição médica.
  • Mecanismo de Ação: O efeito anticoagulante da varfarina é mediado através da inibição dos fatores de coagulação vitamina K-dependentes (II, VII, IX e X). Este efeito da varfarina resulta na síntese de formas imunologicamente detectáveis porém biologicamente inativas destas proteínas de coagulação. Também inibe as proteínas C e S, que possuem propriedades anticoagulantes. Devido a estes efeitos concorrentes, antagonistas da vitamina K criam um paradoxo bioquímico através da produção de um efeito anticoagulante devido à inibição de pró-coagulantes (fatores II, VII, IX e X) e um efeito potencialmente trombogênico, ao alterar a síntese de inibidores naturais da coagulação (proteínas C e S). C
  • Durante os primeiros dias de tratamento com varfarina, o prolongamento do tempo de protrombina reflete principalmente a sua ação sobre a via extrínseca da coagulação, através da depressão do fator VII. Os outros fatores (II, IX e X) mantêm-se relativamente inalterados durante os primeiros dias. Deste modo, o paciente não está completamente anticoagulado com varfarina até que estes outros componentes também sejam reduzidos. Níveis de equilíbrio dos fatores são atingidos cerca de uma semana após o início da terapia. Por esta razão, os anticoagulantes parenterais devem ser utilizados por 4-5 dias enquanto é iniciado o tratamento com varfarina em pacientes com doença trombótica aguda, sendo descontinuados após este período, quando garantido um nível terapêutico de INR (2-3).
  • Manejo Terapêutico
    • Em idosos, desnutridos, hepatopatas, doentes crônicos: Iniciar tratamento com doses menores (2,5 mg/dia);
    • Monitorização: Inicialmente 2 vezes por semana até estabilização do INR dentro da faixa alvo e, a seguir, semanalmente ou quinzenalmente. Após INR mantido e dose estabilizada, monitorizar mensalmente o valor do INR;
    • INR alvo: Para a maioria das situações estabelece-se INR alvo como entre 2,0 e 3,0. Em pacientes com síndrome do anticorpo antifosfolipídeo (SAF) e múltiplos episódios de tromboembolismo prévio, deve-se considerar manter o INR entre 2,5 e 3,5;
    • Ajuste de dose: A dose da varfarina deve ser ajustada (aumentada ou diminuída) em 5-20% da dose semanal na dependência do valor do INR.
  • Interações
    • Interações genéticas: Vários polimorfismos genéticos, principalmente relacionados ao citocromo P450 alteram a biodisponibilidade da varfarina;
    • Interações medicamentosas:
      •  Aumentam o efeito da Varfarina: AINE; álcool; amiodarona; ciprofloxacina; eritromicina; fenitoína; fluconazol; isoniazida; lovastatina; metronidazol; norfloxacino; omeprazol; paracetamol; propafenona; propranolol; tiroxina; sulfametoxazol+trimetoprim;
        • Diminuem o efeito da Varfarina: Barbituratos; carbamazepina; colestiramina; rifampicina; sucralfate.
  • Interações alimentícias:
    • Aumentam o efeito da Varfarina: Vitamina E; ginkgo biloba; alho;
    • Diminuem o efeito da Varfarina: Abacate; alface; brócolis; chá verde; espinafre; ginseng.
  • Interações com tabagismo: Fumantes exigem doses 12% maior do que não fumantes, revelando o aumento da depuração da varfarina em pacientes fumantes.
  • Contraindicações
    • Alergia à varfarina;
    • Aneurisma cerebral;
    • Cirurgia ocular ou neurocirurgia recente;
    • Diátese hemorrágica ou sangramento ativo;
    • Incapacidade de monitorização do INR;
    • Gestação;
    • Punção venosa em local não compressível.
  • Conduta na Superdosagem
    • INR 4 – 6: Suspender Varfarina + Dosar INR 24/24h + Retornar Varfarina em doses pequenas quando INR  estiver normal;
    • INR 6 – 10: Vitamina K 0,5-1mg SC + Dosar INR 8/8h + Repetir Vitamina K 24h após, se necessário ® Se INR normal – recomeçar Varfarina;
    • INR 10 – 20: Vitamina K 3-5mg EV + Dosar INR 6/6h + Considerar plasma + Repetir Vitamina K  em 12h, se necessário;
    • INR < 20 com sinais de sangramento ou > 20: Vitamina K 10 mg IV + Plasma fresco 15 mL/Kg + Dosar INR 6/6h + Repetir Vitamina K  em 12h, se necessário.
  • Interrupção da anticoagulação antes de procedimentos invasivos
    • Pacientes de baixo risco de evento tromboembólico: Suspender varfarina 5 dias antes do procedimento cirúrgico;
    • Pacientes de risco moderado a alto de evento tromboembólico: Suspender varfarina 5 dias antes do procedimento cirúrgico e iniciar heparina, de modo a garantir a cobertura de anticoagulação pelo maior período possível. A heparina não-fracionada deve ser suspensa 6 horas antes da cirurgia e a heparina de baixo peso molecular deve ser suspensa 24 horas antes;
    • Checagem de INR: Checar INR antes da cirurgia, que deve estar abaixo de 1,5 (1,2 para procedimentos neurocirúrgicos);
    • Reinicio da anticoagulação pós-procedimento: A anticoagulação deve ser reiniciada 24 horas após o término do procedimento, salvo quando o risco de sangramento seja alto, sendo preconizado nesta situação apenas iniciar dose profilática;
    • Necessidade de cirurgia de urgência: Utilizar plasma fresco congelado 8 mL/kg no pré-operatório para reverter anticoagulação e garantir maior segurança do procedimento.

Novos anticoagulantes orais:

  • Dabigatrana (Pradaxa®): É um inibidor de direto de trombina de uso oral.
    • Interações Medicamentosas: Não interage com o citocromo P450, no entanto não está imune a interações medicamentosas. Algumas drogas como rifampicina, quinidina, cetoconazol, verapamil e amiodarona alteram a biodisponibilidade da droga, e, devido a sua interação pouco previsível, deve-se evitar o uso concomitante com essas drogas;
    • Indicações: Prevenção e tratamento do tromboembolismo venoso; fibrilação atrial permanente não valvar;
    • Contraindicações: ClCr < 30 mL/min (insuficiência renal grave);
    • Monitorização: Por apresentar farmacocinética previsível, monitoramento de rotina de coagulação não é necessário;
    • Reversão da atividade anticoagulante: Sua principal limitação é a ausência de um antídoto capaz de reverter o estado de anticoagulação diante de um quadro de sangramento agudo. A descontinuação da droga, no entanto, parece ser suficiente para controlar hemorragias na maioria dos ambientes clínicos;
    • Eventos hemorrágicos e trombóticos: Preocupações têm sido levantadas sobre a segurança do dabigatran em termos de sangramento e eventos trombóticos. Foram relatados eventos hemorrágicos em pacientes com mais de 80 anos e portadores de doença renal, assim como aumento do risco de eventos trombóticos em pacientes com múltiplos fatores de risco para síndrome coronariana aguda e infarto agudo do miocárdio. Seu uso, portanto, deve ser cauteloso nesses pacientes.
  • Rivaroxabana (Xarelto®): É um inibidor direto do fator Xa de uso oral.
    • Interações Medicamentosas: Algumas drogas como cetoconazol, itraconazol, voriconazol, rifamicinas e carbamazepina alteram a biodisponibilidade da droga, e, devido a sua interação pouco previsível, deve-se evitar o uso concomitante com essas drogas;
    • Indicações: Prevenção e tratamento do tromboembolismo venoso; fibrilação atrial permanente não valvar;
    • Contraindicações: ClCr < 30 mL/min (insuficiência renal grave); insuficiência hepática (Child B e C); < 18 anos (falta de estudos); gestação e amamentação;
    • Monitorização: Por apresentar farmacocinética previsível, monitoramento de rotina de coagulação não é necessário;
    • Reversão da atividade anticoagulante: Sua principal limitação é a ausência de um antídoto capaz de reverter o estado de anticoagulação diante de um quadro de sangramento agudo. A descontinuação da droga, no entanto, parece ser suficiente para controlar hemorragias na maioria dos ambientes clínicos;
    • Eventos hemorrágicos: Em casos de eventos hemorrágicos, a descontinuação da droga deve ser imediata e podem ser utilizados complexos de protrombina ativada para reverter os quadros graves com risco de vida.
  • Apixabana (Eliquis®): É um inibidor direto do fator Xa de uso oral.
    • Indicações: Prevenção e tratamento do tromboembolismo venoso; fibrilação atrial permanente não valvar;
    • Contraindicações: ClCr < 30 mL/min (insuficiência renal grave); insuficiência hepática (Child B e C); < 18 anos (falta de estudos); gestação e amamentação;
    • Monitorização: Por apresentar farmacocinética previsível, monitoramento de rotina de coagulação não é necessário;
    • Reversão da atividade anticoagulante: Sua principal limitação é a ausência de um antídoto capaz de reverter o estado de anticoagulação diante de um quadro de sangramento agudo. A descontinuação da droga, no entanto, parece ser suficiente para controlar hemorragias na maioria dos ambientes clínicos;
    • Eventos hemorrágicos: Em casos de eventos hemorrágicos, a descontinuação da droga deve ser imediata e podem ser utilizados complexos de protrombina ativada para reverter os quadros graves com risco de vida.
Este conteúdo foi desenvolvido por médicos, com objetivo de orientar médicos, estudantes de medicina e profissionais de saúde em seu dia-a-dia profissional. Ele não deve ser utilizado por pessoas que não estejam nestes grupos citados, bem como suas condutas servem como orientações para tomadas de decisão por escolha médica. Para saber mais, recomendamos a leitura dos termos de uso dos nossos produtos.

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