Quais os fatores de risco para Covid-19 grave na pediatria?

Apesar da grave crise de saúde pública que vivemos, ainda existem dúvidas a respeito da gravidade do acometimento por Covid-19 na pediatria.

Apesar da grave crise de saúde pública que vivemos gerada pela pandemia do SARS-CoV-2, ainda existem dúvidas no que diz respeito à gravidade do acometimento pela Covid-19 em pediatria. A maioria dos relatos estatísticos colocam as crianças como um grupo relativamente protegido dentro do contexto epidêmico, com menores taxas de infecção e de hospitalização.

Apesar de menos frequente do que na população adulta, a Covid-19 grave em crianças pode ocorrer. Como exemplo de gravidade nessa faixa etária, podemos citar os casos de inflamação sistêmica sob a forma da síndrome inflamatória multissistêmica, que pode evoluir com choque hemodinâmico grave, e que têm sido relatados em todo o globo desde o início da pandemia.

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Por ser um quadro raro com pouco tempo desde a primeira descrição, muitos aspectos da Covid-19 grave em crianças ainda estão inexplicados. Fatores prognósticos e grupos de risco ainda não são totalmente conhecidos devido à escassez de trabalhos. Estudos voltados para essa temática são fundamentais para auxiliar os pediatras a investigarem os pacientes com maior potencial de evolução desfavorável.

Quais os fatores de risco para Covid-19 grave na pediatria?

Novo estudo

Um estudo publicado na Pediatrics de março de 2021, conduzido por um grupo de pesquisadores franceses, traz exatamente essa preocupação. Os pesquisadores conduziram um estudo prospectivo com base nacional em crianças hospitalizadas por Covid no período entre 15 de fevereiro a 01 de junho de 2020, com participação de 60 hospitais franceses e inclusão de 397 crianças. A doença foi confirmada pela presença de RT-PCR positivo para a Covid-19 ou pela presença de lesões sugestivas da doença na tomografia de tórax. Para os pacientes incluídos, foram coletados dados relativos a aspectos demográficos e clínicos, assim como sobre o desfecho.

O desfecho primário avaliado foi a ocorrência de doença grave nas crianças hospitalizadas por Covid, sendo essa demonstrada por necessidade de suporte ventilatório (uso de ventilação invasiva ou não invasiva), suporte hemodinâmico ou morte.

A média de idade das crianças incluídas no estudo foi de 16 meses. Cerca de 29% apresentavam doenças de base. Com relação aos sintomas, 78% das crianças se apresentaram com febre, 43% com tosse, 39% com dificuldades alimentares, 31% com taquidispneia e 24% com diarreia. Os marcadores inflamatórios eram baixos na maioria das crianças, mas algumas apresentaram linfopenia (27%) e/ou trombocitopenia (9%). A radiografia de tórax se demonstrou alterada em 34% dos pacientes, sendo a lesão mais frequente o infiltrado intersticial bilateral. Houve doença grave em 11% dos pacientes, com morte de 7 pacientes incluídos no estudo, a maioria por insuficiência respiratória.

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Com relação à gravidade, observou-se um padrão distinto dependendo do grupo etário das crianças. As crianças menores de 90 dias, apesar de ser o grupo mais frequente dessa amostra (37%), foram mais paucissintomáticos (59%) e não tiveram casos relatados de MIS-C, mas apresentaram quadros de infecções de vias aéreas inferiores em 12%. Apenas 3% dessas crianças apresentaram quadro grave.

Já as crianças com idades entre 3-12 meses foram menos paucissintomáticas (33%), com um número muito maior de crianças com doença de trato respiratório inferior (33%). Os quadros graves ainda foram raros nesse grupo (6%), com apenas um quadro relatado de MIS-C. Nos grupos etários acima de 1 ano de idade, o diagnóstico de MIS-C foi muito mais frequente, com taxas que variaram de 15% para crianças entre 1-5 anos, 18% entre 5-10 anos e 15% entre 10-15 anos.

No estudo, as crianças que se apresentaram com MIS-C apresentaram quadro clínico mais grave, e maior gap temporal entre o contato com o vírus e a hospitalização, sugerindo que esse quadro realmente é uma manifestação mais tardia da doença.

Após análise multivariada, observou-se três características associadas à doença grave em pacientes com quadro agudo de Covid (ou seja, excluindo-se as formas de MIS-C): idade acima de 10 anos, hipoxemia, e proteína C reativa ≥ 80 mg/L.

Conclusões

Um resultado interessante desse estudo diz respeito à menor gravidade encontrada em lactentes jovens, que vai de encontro a outros artigos na literatura. Uma hipótese para essa diferença é a definição de gravidade usada nesse estudo, que inclui apenas a necessidade de suporte ventilatório ou hemodinâmico, e não outras variáveis como internações na UTI ou uso de cateter nasal. A taxa de internação nesse grupo etário foi a mais alta nesse grupo, mas isso provavelmente se deve ao fato de que a doença se manifestou como febre numa grande quantidade de lactentes, e febre sem foco costuma ser uma indicação importante de internação nesse grupo etário.

Esses resultados iluminam algumas questões importantes para os cuidados da Covid-19 em pacientes pediátricos. Crianças que se apresentem com idades mais avançadas, com hipoxemia e marcadores inflamatórios elevados devem ser melhor observadas devido ao risco de pior prognóstico da doença. Pediatras que atuam em setores de emergência e unidades de terapia intensiva devem ficar atentos a esses marcadores quando atuando com crianças suspeitas ou com confirmação de Covid.

Referências bibliográficas:

  • Ouldali N, Yang DD, Madhi F, et al. Factors Associated With Severe SARS-CoV-2 Infection. Pediatrics. 2021;147(3):e2020023432. doi: 10.1542/peds.2020-023432.

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