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A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), segundo o último Consenso Brasileiro do Refluxo Gastroesofágico, é uma afecção crônica decorrente do fluxo retrógrado de parte do conteúdo gástrico para o esôfago e órgãos adjacentes, acarretando um espectro variável de sintomas e/ou sinais esofagianos e/ou extraesofagianos, associados ou não a lesões teciduais. É uma condição patológica muito relevante epidemiologicamente, por acometer em torno de 30% da população.
O movimento retrógrado do conteúdo gástrico que inclui componentes agressivos a mucosa esofágica como a pepsina, ácido e ácidos biliares do refluxo para o esôfago pode levar à DRGE. Muitos fatores podem estar relacionados com este processo patológico, tais como diminuição da peristalse esofágica, alteração anatômica do posicionamento do ângulo de His e principalmente relaxamento transitório do esfíncter esofagiano inferior. Deve ser considerado também o efeito protetor da saliva e do bicarbonato neutralizando o pH ácido. O papel agressor do ácido já está bem estabelecido, mas o da pepsina em geral é pouco abordado.
A DRGE pode se apresentar com sintomas típicos como de pirose e regurgitação ou manifestações atípicas (quadro 1).
Topografia | Manifestações atípicas da DRGE |
Esofágicas |
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Otorrinolaringológicas |
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Pulmonares |
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Outras |
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O diagnóstico da manifestação esofágica da DRGE é inferido através de detalhada história clínica e realizado através do exame endoscópico com visualização de esofagite. Nos casos de refluxo atípico, a pesquisa através das monitorizações de pHmetria e impedanciopHmentria podem ser solicitadas. Porém, são procedimentos invasivos, e associados a desvantagens como baixa tolerância do paciente, alto custo e restritos a poucos centros diagnósticos. Desta forma a pesquisa por outros testes diagnósticos tem sido sugerida na pesquisa do refluxo atípico. Entre eles, o teste da pepsina, pode ser realizado, embora não o seja feito de rotina em nosso meio.
Leia também: Como identificar e tratar corretamente o refluxo gastroesofágico?
A pepsina é uma enzima proteolítica descoberta pela primeira vez por Theodor Schwann em 1836, presente em todos os vertebrados. É secretada pelas células principais e ativada nas secreções gástricas ácidas, sendo desativada em pH 7,0 e reativada após a reacidificação. Quando há refluxo a pepsina entra na cavidade oral e é misturada à saliva. Estudos demonstraram que os tecidos do esôfago e da garganta são sensíveis à pepsina, e uma pequena quantidade de pepsina ativada poderia causar inflamação na mucosa do esôfago e da garganta, causando desconforto subjetivo e sintomas. A DRGE poderia ser inferida pela alteração da concentração de pepsina na saliva, no escarro, no líquido do lavado alveolar e ainda na efusão da orelha média como um sinal de eventos de refluxo prévios. A pepsina é considerada um importante fator etiológico no refluxo laringofaríngeo cursando com faringite crônica e também na erosão dentária.
Uma concentração mais elevada de pepsina tem maior probabilidade de estar associada a um aumento da gravidade dos espaços intercelulares dilatados no esôfago, logo a sua pesquisa pode ser útil no estuda da DRGE.
Dettmar e colaboradores estudaram trinta e dois pacientes com sintomas de faringite crônica e 96 amostras de saliva destes pacientes foram analisadas, quanto à presença de pepsina através do dispositivo não invasivo Peptest TM. Questionários avaliaram os sintomas de refluxo. O Peptest TM contém dois anticorpos monoclonais anti-pepsina humanos totalmente validados e sensíveis para a detecção de pepsina na saliva. Este teste é um ensaio quantitativo que produz uma concentração específica de pepsina, que pode ser analisada qualitativamente: negativo: concentração de pepsina salivar de 75 ng/ L ou menos, fraco positivo: concentração de pepsina salivar de 75-125 ng/mL, médio positivo: concentração de pepsina salivar de 125–200 ng/mL e forte positivo: concentração de pepsina salivar de 200 ng/mL ou mais. Os autores detectaram que 78% dos pacientes com faringite crônica tinham concentrações médias a altas de pepsina em suas amostras de saliva. Em pacientes com faringite crônica, 81% apresentaram concentração de pepsina positiva nas amostras pós-prandiais, em comparação com controles sem refluxo (32%).
Outro interessante artigo publicado pelo grupo de Wang tentou estabelecer se a pepsina salivar seria útil para o diagnóstico de subtipos de doença do refluxo gastroesofágico e distúrbios relacionados à DRGE. Os autores concluíram que pacientes com esofagite erosiva, esofagite não erosiva, sintomas não esofágicos do refluxo ou esôfago de Barrett tiveram uma prevalência maior de concentração de pepsina salivar (todos P <0,001). Não houve diferença significativa na taxa de positividade para pepsina em pacientes com azia funcional em comparação com controles saudáveis. Observaram ainda que o esôfago de Barrett está intimamente relacionado ao refluxo ácido, refluxo de pepsina e / ou biliar e que todos contribuem para a lesão esofágica e metaplasia da mucosa. Outra conclusão importante deste estudo foi que as taxas positivas de pepsina diminuíram significativamente após o tratamento com inibidores de bomba de prótons nos grupos com refluxo; ao inibir a secreção de ácido gástrico e o refluxato total.
Recente estudo de 2021 avaliou a necessidade de múltiplos testes de pepsina salivar em 138 pacientes com sinais e / ou sintomas associados ao refluxo laringofaríngeo. A pepsina salivar foi detectada no dia do monitoramento da pHmetria, uma vez pela manhã e várias vezes. Dos 97 pacientes com resultados positivos para refluxo na monitorização pHmetria e pepsina realizada várias vezes ao dia, 54 tiveram resultados negativos para uma única detecção matinal.
Conclusão:
A pesquisa da pepsina salivar pode ser usada para o diagnóstico de DRGE típico e atípico. O nível de pepsina salivar pode distinguir o refluxo verdadeiro, das doenças esofágica sem refluxo, tais como esôfago hipersensível. É um exame de fácil realização e baixo custo. Porém, embora uma única detecção de pepsina salivar pela manhã seja mais econômica, a sensibilidade é muito baixa e é necessário realizá-la várias vezes ao dia.
Referências bibliográficas:
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