Qual o impacto da cirrose hepática após realização de angioplastia coronariana?

Pouco se sabe sobre os desfechos cardiovasculares e hepáticos na DAC. Recentemente foi avaliado o impacto da cirrose após angioplastia coronariana.

A prevalência de doença arterial coronariana (DAC) entre pacientes cirróticos é estimada em 30%, sendo que cerca de 7% apresentam obstrução de mais de 50% em pelo menos uma artéria coronariana. A cirurgia de revascularização do miocárdio é pouco realizada nessa população devido à frequente presença de coagulopatia, trombocitopenia, varizes esofagianas e insuficiência renal. Dessa forma, a angioplastia coronariana percutânea torna-se a primeira opção de tratamento da DAC obstrutiva entre cirróticos.

No entanto, pouco se sabe sobre os desfechos cardiovasculares e hepáticos nesse contexto. Recentemente, Lu e colaboradores avaliaram o impacto da cirrose até 90 dias após intervenção coronariana percutânea.

Cirrose hepática após angioplastia

Foi realizado um estudo transversal que avaliou banco de dados de 2010-2014 do Nationwide Readmissions Database (NRD). Foram identificadas todas as hospitalizações com necessidade de angioplastia coronariana e, posteriormente, selecionados pacientes com diagnóstico de cirrose hepática.

Os pacientes com cirrose foram comparados aos indivíduos sem cirrose quanto às comorbidades, desfechos intra-hospitalares, causas de readmissão e desfechos após readmissões. Desfechos primários foram: mortalidade por todas as causas e readmissões até 90 dias após a angioplastia. Desfechos secundários analisados foram: mortalidade na internação índice, infarto agudo do miocárdio (IAM), necessidade de nova revascularização e eventos adversos combinados até 90 dias após angioplastia primária (sangramento gastrointestinal, injúria renal aguda, acidente vascular encefálico, complicações vasculares).

Resultados

Foram identificadas 1.844.580 admissões com realização de angioplastia coronariana entre 2010-2014. Dessas, 7125 envolveram pacientes cirróticos. Portadores de cirrose apresentaram um número significativamente maior de comorbidades, especialmente anemia (27,4% vs 10,8%), coagulopatia (32,6% vs 2,8%) e doença renal crônica (28,0% vs 13,4%). Além disso, apresentaram mais choque cardiogênico e parada cardíaca, embora tenham tido menos IAM com supra de ST. Cerca de 22% dos cirróticos evoluíram com descompensação hepática na internação índice, principalmente ascite e encefalopatia.

A mortalidade por todas as causas foi maior no grupo cirrótico (10,3% vs 2,5%), inclusive na primeira internação (7% vs 1,8%). As taxas de readmissão (38,2% vs 20,2%) e o tempo de internação também foram maiores nessa população (7,7 vs 3,6 dias). Portadores de cirrose apresentaram ainda 2x mais eventos adversos, especialmente sangramento gastrointestinal (15,3% vs 2,7%), além de maior frequência de injúria renal aguda (28,4% vs 10,1%) e injúria renal aguda com necessidade de terapia renal substitutiva.

Após análise multivariada, cirrose esteve associada a mortalidade 2x maior, 1,5x mais readmissões em 90 dias, 2x mais eventos adversos, 3x mais sangramento gastrointestinal e 1,5x mais injúria renal com necessidade de diálise. O uso de stent medicado melhorou desfecho em cirróticos (odds ratio 0,60 para mortalidade, 0,73 para readmissões e 0,78 para eventos adversos).

Causas cardíacas permaneceram como principal motivo de reinternação de cirróticos e não cirróticos em 90 dias, especialmente angina, insuficiência cardíaca e IAM. A presença de ascite aumentou a mortalidade, readmissão e eventos adversos em 1,5-2x e a presença encefalopatia se associou a aumento de quase 3x na mortalidade.

Mais do autor: Descalonamento de imunossupressores e biológicos na doença inflamatória intestinal: quando e como fazer?

Comentários

O tratamento coronariano intervencionista no paciente cirrótico constitui um grande desafio na prática clínica. A presença de coagulopatia, trombocitopenia e hipertensão portal dificultam o uso de antiagregantes plaquetários por longo período de tempo e a realização de cirurgias de revascularização miocárdica. Assim, a angioplastia com colocação de stents medicados de nova geração, os quais necessitam de menor tempo de antiagregação, parecem ser a melhor opção para esses pacientes. Além disso, é clara a necessidade de se minimizar o risco de injúria renal aguda nesse contexto, reduzindo o uso de contraste endovenoso durante a angioplastia ao mínimo necessário.

Embora esse estudo seja um dos maiores já realizados para avaliar pacientes cirróticos submetidos a angioplastia coronariana, diversas limitações podem ser apontadas, incluindo: o caráter retrospectivo, a ausência de estratificação dos pacientes por Child e MELD e a impossibilidade de aferição da mortalidade extra-hospitalar.

Por outro lado, esses dados reforçam a importância de estudos prospectivos para avaliar os desfechos clínicos da intervenção coronariana percutânea nessa subpopulação de pacientes, a qual parece se comportar de maneira distinta dos demais coronariopatas.

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