Qual o impacto do atraso no tratamento de diferentes tipo de câncer sobre a mortalidade?

Revisão sistemática recente analisou o risco de maior mortalidade após 4 semanas de atraso para o início de tratamento do câncer.

Foi publicada, recentemente, no BMJ uma revisão sistemática com uma meta-análise de estudos realizados entre 01/2000 e 10/04/2020, isto é, antes da pandemia de Covid-19. Entre os principais tipos de câncer analisados foram incluídos mama, bexiga, colorretal, pulmão, colo de útero e cabeça e pescoço. Estes setes tipos de câncer representam cerca de 44% da incidência mundial. Uma das métricas avaliadas é a razão de risco para maior mortalidade após quatro semanas de atraso para o início de tratamento, seja cirúrgico, adjuvante ou neoadjuvante (pré-operatório). Atraso de tratamento foi definido como o tempo decorrente após o diagnóstico até o primeiro tratamento, seja ele cirúrgico, quimioterápico ou radioterápico.

Atraso no tratamento de câncer pode gerar aumento na mortalidade

Método da revisão

A revisão incluiu 34 estudos para 17 indicações, incluindo mais de 1 milhão e 270 mil pacientes.

A associação entre mortalidade e atraso no tratamento do câncer foi identificada em 13 das 17 indicações, atingindo significância estatística. Alguns resultados se destacam como 8% e 6% maior o risco de mortalidade para cada atraso de quatro semanas na cirurgia de mama ou de uma colectomia, respectivamente. Atrasos adicionais podem ser ainda piores, 17% e 26% maior o risco de morte em caso de atraso de 8 e 12 semanas na cirurgia da mama, respectivamente.

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E para o tratamento sistêmico? Há 9% mais risco de morte em caso de atraso da radioterapia para o câncer de cabeça e pescoço, chegando a 23% de risco a mais em caso de atraso na radio para colo de útero. Atraso do tratamento neoadjuvante para o câncer de bexiga levou a um risco 24% maior; 9% para mama em adjuvância e 28% se neoadjuvância, um risco 13% maior foi identificado após atraso na adjuvância de câncer cólon.

Uma projeção no caso do câncer de mama é assustadora, assumindo uma taxa de mortalidade de cerca de 12% para cada grupo de 1000 mulheres tratadas, teremos um “excesso de mortes” de 10-20-31 mulheres em caso de atrasos na cirurgia de 4-8-12 semanas, respectivamente.

Os autores concluem que o atraso do tratamento do câncer é um problema de saúde pública global, e que um “simples” atraso de quatro semanas no tratamento pode aumentar a mortalidade em diferentes tipos de câncer e para diferentes modalidades terapêuticas. Políticas públicas devem ser implementadas imediatamente para mitigar estes impactos deletérios.

E esses dados foram compilados antes da pandemia de SARS-Cov-2, contextualizando estes dados e estas projeções para um lockdown de 12 semanas, podem ser estimadas um número excedente de mortes da ordem de 1.400 no Reino Unido, 6.100 nos EUA, 700 no Canadá e 500 na Austrália, assumindo que nestes países a cirurgia é o primeiro tratamento em cerca de 80% dos casos para uma taxa de mortalidade de 12%.

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E nem estamos avaliando outros desfechos que não mortalidade como deterioração funcional, perda de qualidade de vida, de produtividade, morbidade maior, deterioração psicológica, com maiores impactos econômicos para a sociedade, etc. Atrasos no tratamento têm impactos muitos maiores para os pacientes e para a sociedade do que “apenas” aumentar a mortalidade. É óbvio que mortalidade não é algo “apenas”.

Mensagem final

Claro que o estudo tem muitas limitações, não podemos generalizar para todos os tipos de câncer e todos os diferentes estadiamentos, existem muitos tumores indolentes, subtipos moleculares de melhor prognóstico, tratamentos neoadjuvantes hormonais que podem servir de ponte para uma cirurgia posterior em tempos de pandemia como no câncer de mama, mas ele reúne uma quantidade brutal de informações e reforça conceitos intuitivos e baseados já em evidências prévias de que o “câncer não espera”.

A(s) vacina(s) vai(vão) chegar, mas não dá para esperar ela(s). E o SARS-CoV-2 não se cansou da humanidade.

Referências bibliográficas:

  • Hanna TP, et al. Mortality due to cancer treatment delay: systematic review and meta-analysis; BMJ. 2020;371:m4087. doi: 1136/bmj.m4087 (Published 04 November 2020).
  • Parmar A, Chan KKW. Prioritising research into cancer treatment delays; BMJ. 2020;371:m4261. doi: 1136/bmj.m4261 (Published 04 November 2020).

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