Rastreio de tuberculose em crianças menores de cinco anos: sintomas ou PPD?

Uma das maiores causas de mortalidade infantil, a tuberculose é de díficil diagnóstico em crianças menores de 5 anos, o que contribui para alta mortalidade.

A tuberculose (TB) é uma das maiores causas de mortalidade infantil no mundo. Crianças menores de 5 anos são especialmente vulneráveis, uma vez que possuem maior risco de progressão para doença ativa. A dificuldade no diagnóstico de tuberculose em crianças nessa faixa etária é outro fator que contribui para a alta mortalidade. Uma vez que resulta em atraso para o início de tratamento.

Saiba mais: Quais os fatores de risco para tuberculose entre contatos?

Médico faz rastreio em crianças para detectar tuberculose

Rastreando a tuberculose em crianças

A recomendação atual da Organização Mundial de Saúde é que todas as crianças com menos de 5 anos que sejam contatos de indivíduos diagnosticados com TB sejam avaliadas e, na ausência de TB ativa, recebam tratamento preventivo. Classicamente, o rastreio para TB ativa envolve a aplicação de PPD. Contudo, a disponibilidade do teste e o maior número de visitas às unidades de saúde que sua utilização exige, comprometem a efetividade dessa estratégia.

Outra forma de rastreio é a baseada em sintomas, principalmente perda involuntária ou ausência de ganho adequado de peso, febre, tosse, fadiga ou diminuição de atividades. Por essa estratégia, crianças assintomáticas poderiam receber tratamento preventivo de forma segura, enquanto as crianças com sintomas deveriam passar por avaliação clínica para excluir TB ativa. Um estudo conduzido na África do Sul procurou avaliar a efetividade do rastreio baseado em sintomas quando comparado com o baseado em PPD.

Materiais e métodos

Trata-se de um estudo pragmático, randomizado por clusters, conduzido em todas as unidades de saúde de atenção primária em um subdistrito da África do Sul. As clínicas foram randomizadas para conduzir o rastreio baseado em PPD ou em sintomas. Todas as crianças com menos de 5 anos que foram identificadas como contatos de casos de TB pulmonar ou extrapulmonar eram elegíveis, mas aquelas cujo caso índice tinha TB resistente à isoniazida ou à rifampicina foram excluídas.

O rastreio por sintomas foi baseado no guideline nacional da África do Sul vigente à época. Além de considerar como sintomas tosse ou febre persistente por mais de 2 semanas, perda ou ganho inadequado de peso documentados, fadiga, que podia ser manifestada como cansaço ou como diminuição de atividades, massa cervical, letargia ou sibilos refratários ao uso de broncodilatadores. A presença de pelo menos 1 sintoma foi caracterizada como rastreio positivo. Crianças no braço de rastreio baseado em PPD foram avaliadas com PPD e com a presença de sintomas. Resultados de PPD ≥ 10mm em crianças HIV-negativas ou ≥ 5mm em crianças HIV-positivas foram considerados como PPD reator.

Assintomáticas

As crianças assintomáticas com PPD não reator receberam tratamento com isoniazida por 6 meses. Crianças sintomáticas ou assintomáticas com PPD reator foram encaminhadas para avaliação médica em um hospital de referência, com realização de radiografia de tórax e aspirado gástrico se necessário. Aquelas com diagnóstico clínico ou microbiológico de TB foram tratadas com esquema básico de isoniazida, rifampicina e pirazinamida com ou sem etambutol. As crianças em tratamento profilático foram acompanhadas mensalmente para avaliação do desenvolvimento de sinais ou sintomas de TB, dispensação de medicação e monitoramento de eventos adversos.

O desfecho primário foi a diferença na proporção de crianças identificadas como contatos de um caso de TB que iniciaram tratamento contra TB ativa ou latente entre os dois braços do estudo. O desfecho secundário foi a proporção de crianças que passaram por cada etapa de cuidado (identificação, rastreio, início e término do tratamento preventivo) em cada braço.

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Resultados

Ao todo, foram identificados 1.364 casos índices e 550 crianças como contatos no braço de rastreio baseado em sintomas e 1.433 casos índices e 467 crianças no braço de rastreio baseado em PPD. As características socioeconômicas de casos índices e de crianças estavam balanceadas entre os dois grupos. A média de idade do caso índice foi de 35 anos, sendo mais da metade mulheres. A maioria tinha TB pulmonar e quase 75% eram HIV-positivos. Em relação às crianças, a média de idade foi de 24 e 25 meses no grupo de sintomas e no de PPD, respectivamente. Somente 39% das crianças no grupo de rastreio por sintomas e 41% no por PPD eram filhos dos casos índices. Menos de 1% eram HIV-positivas.

Ajustes

As proporções ajustadas de crianças iniciando tratamento para TB ativa ou latente foram de 51,5% e 57,1% nos grupos de rastreio por sintomas e por PPD, respectivamente (diferença de -5,6%; IC 95% = -23,7% a 12,6%; p = 0,52). Quando os números são ajustados para contemplar somente as crianças avaliadas quando havia disponibilidade de PPD em todas as clínicas, as proporções foram de 58,1% no grupo de rastreio por sintomas e de 56,5% no grupo de rastreio por PPD (diferença de risco de 1,6%; IC 95% = -16,7 a 19,8; p = 0,86).

A proporção de crianças identificadas foi de 55% no grupo de sintomas (IC 95% = 38 a 73%) e de 45% no grupo de PPD (IC 95% = 33 a 57%), diferença sem significância estatística. A proporção de crianças que foram rastreadas também foi semelhante entre os de rastreio por sintomas e por PPD (30% vs. 27%, respectivamente), assim como a proporção das que iniciaram (30% vs. 25%) e das que completaram 6 meses de tratamento preventivo (14% vs. 15%). Não foram relatadas mortes ou descontinuações de tratamento por eventos adversos.

Mensagens práticas sobre rastreio de tuberculose em crianças

Não houve diferença para o início de tratamento preventivo para TB em crianças menores de 5 anos entre estratégias de rastreio baseadas somente em avaliação de sintomas e em avaliação de sintomas associada à administração de PPD.

Destaca-se que, em ambas as estratégias, as proporções de crianças identificadas e retidas nos centros de saúde foram baixas. Esses resultados, como destacado pelos autores, demostram que outras intervenções podem ser necessárias para garantir adesão e continuidade do cuidado de contatos pediátricos de TB.

Referência bibliográfica:

  • Salazar-Austin N, et al. Improving Tuberculosis Preventive Therapy Uptake: A Cluster-randomized Trial of Symptom-based Versus Tuberculin Skin Test-based Screening of Household Tuberculosis Contacts Less Than 5 Years of Age. Clinical Infectious Diseases. 2020;70(8):1725–32. DOI: 10.1093/cid/ciz436

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