Recentes avanços no tratamento das vasculites de grande calibre ocorreram após a introdução dos biológicos ao seu arsenal terapêutico. Visando padronizar as recomendações a respeito do tratamento dessas condições, o American College of Rheumatology (ACR), em conjunto com a Vasculitis Foundation, publicaram seus guidelines para o manejo da arterite de células gigantes (ACG) e da arterite de Takayasu (TAK).
Vejam a seguir os principais pontos desse documento, de maneira resumida.
Definições
Dentre as definições utilizadas nos guidelines, destaco:
- Doença ativa: sinais e sintomas novos, persistentes ou progressivos que possam ser atribuídos à ACG ou TAK e que não estão relacionados a dano;
- Doença grave: manifestações ameaçadoras da vida ou de órgãos (perda visual, AVC isquêmico, infarto agudo do miocárdio, isquemia de membros);
- Doença refratária: persistência de doença ativa apesar de imunossupressão;
- Remissão: ausência de sinais/sintomas que possam ser atribuídos à atividade de ACG ou TAK;
- Reativação: recorrência de doença ativa após período de remissão;
- Isquemia craniana: acometimento neurológico ou visual (amaurose fugaz, perda visual, AVC).
Arterite de células gigantes
1) Avaliação diagnóstica
- Os autores dão preferência para a biópsia da artéria temporal superficial (vs. ultrassonografia e RM das artérias cranianas) para estabelecer o diagnóstico da doença;
- Os autores recomendam condicionalmente a realização de biópsia unilateral (vs. bilateral) da artéria temporal superficial, de preferência com segmento longo (>1 cm). Essa biópsia pode ser repetida duas semanas após o início do tratamento com glicocorticoides;
- Para pacientes com suspeita de ACG e biópsia negativa, a realização de estudo angiográfico não invasivo de grandes vasos pode ser realizado para auxiliar no diagnóstico;
- Para pacientes com diagnóstico recente de ACG, a realização de estudo angiográfico não invasivo de grandes vasos é condicionalmente recomendado para avaliar a extensão da doença (acometimento aórtico e seus grandes ramos).
2) Tratamento farmacológico
- Glicocorticoides: iniciar esquema de doses altas de corticoide oral diário (vs. dias alternados). Na presença de risco de perda visual ou de manifestações graves, preferir a pulsoterapia com metilprednisolona;
- Tocilizumabe: os autores recomendam condicionalmente que o tocilizumabe deve ser usado como tratamento de primeira linha em associação com os glicocorticoides em todos os pacientes (vs. glicocorticoide isolado);
- Para pacientes com acometimento de grandes vasos, é recomendado o uso associado de glicocorticoides e imunossupressores associados (vs. glicocorticoide isolado);
- O acréscimo de imunossupressores deve ser feito para pacientes que apresentem reativação com doses moderadas a altas de glicocorticoide;
- Os autores sugerem dar preferência ao tocilizumabe (vs. metotrexato). O metotrexato pode ser utilizado em alguns casos. Abatacepte pode ser considerado em casos refratários (ordem de preferência: tocilizumabe → metotrexato ou abatacepte);
- Duração do tratamento: a duração ótima do tratamento da ACG não é bem definida e deve ser individualizada;
- Aspirina: recomendado condicionalmente para pacientes que apresentam obstrução crítica de carótidas ou vertebrais;
- Estatinas: os autores se posicionaram condicionalmente contra o uso de estatinas no tratamento específico da ACG.
3) Tratamento cirúrgico
- Para pacientes que necessitam de procedimentos vasculares, a decisão do melhor momento deve ser uma decisão compartilhada entre o cirurgião vascular e o reumatologista;
- Em caso de sintomas isquêmicos progressivos, os autores sugerem inicialmente aumentar a imunossupressão (vs. proceder com cirurgia vascular);
- Caso o paciente esteja em atividade, os autores recomendam o uso de altas doses de corticoide no período perioperatório.
4) Monitorização laboratorial
- A monitorização no longo prazo é fundamental, mesmo que o paciente esteja em aparente remissão;
- Para pacientes que apresentam elevação isolada de provas inflamatórias, os autores recomendam observação clínica (vs. aumento da imunossupressão).
Leia também: Guidelines 2021 do ACR para o tratamento da poliarterite nodosa
Arterite de Takayasu
1) Tratamento farmacológico
- Glicocorticoides: os autores recomendam condicionalmente a corticoterapia oral em altas doses (vs. pulsoterapia com corticoide) em pacientes com TAK ativa e grave. Caso o paciente atinja remissão com 6-12 meses de tratamento, recomenda-se a retirada completa do corticoide (vs. manutenção a longo prazo em baixas doses);
- Imunossupressores: recomenda-se a associação de imunossupressores + glicocorticoides (vs. glicocorticoides isolados) no tratamento da TAK ativa, preferencialmente metotrexato ou azatioprina;
- Casos refratários à corticoterapia: preferir anti-TNF (vs. tocilizumabe);
- Aspirina: adicionar em casos com TAK ativa e acometimento de artérias cranianas ou vertebrobasilar.
2) Tratamento cirúrgico
- Para pacientes que necessitam de procedimentos vasculares, a decisão do melhor momento deve ser uma decisão compartilhada entre o cirurgião vascular e o reumatologista;
- Os autores recomendam contra a realização de procedimentos cirúrgicos em pacientes com TAK em remissão e claudicação intermitente em membros . Caso o paciente apresente piora dos sintomas de claudicação em vigência e atividade da doença, recomenda-se o tratamento farmacológico (vs. cirúrgico);
- Na presença de hipertensão renovascular, os guidelines recomendam condicionalmente o tratamento farmacológico (vs. cirúrgico). O mesmo é válido para estenoses de vasos cranianos e cervicais;
- Caso seja optado pelo tratamento cirúrgico, o mesmo deve ser feito em vigência de remissão da doença. Se a doença estiver ativa, manter doses elevadas de glicocorticoides no período perioperatório.
3) Monitorização laboratorial
- A monitorização no longo prazo é fundamental, mesmo que o paciente esteja em aparente remissão;
- Para pacientes que apresentam elevação elevada de provas inflamatórias, os autores recomendam observação clínica (vs. aumento da imunossupressão).
Veja mais: Arterite temporal: arterite de células gigantes ou vasculite associada ao ANCA?
4) Imagem vascular
- Preferir métodos não invasivos de imagem vascular;
- Os autores recomendam condicionalmente a realização de exames de imagem vascular com intervalos regulares, em associação com o acompanhamento clínico;
- Progressão de lesões estenóticas prévias de maneira assintomática, sem sinais de inflamação na imagem: recomenda-se a manutenção do esquema terapêutico (vs. aumento do grau de imunossupressão);
- Progressão de lesões estenóticas prévias, com sinais de inflamação ou sintomas: aumentar o grau de imunossupressão;
- Surgimento de novas lesões estenóticas ou sinais de inflamação em territórios previamente não acometidos em doença aparentemente em remissão clínica: aumentar o grau de imunossupressão.
Referências bibliográficas:
- Maz M, Chung SA, Abril A, et al. 2021 American College of Rheumatology/Vasculitis Foundation Guideline for the Management of Giant Cell Arteritis and Takayasu Arteritis. Arthritis Care Res. 2021;8:1071-87. https://doi.org/10.1002/art.41774