Recomendações atualizadas sobre o uso de bloqueadores neuromusculares na SDRA

Estudo abordou a prática clínica sobre o uso de bloqueadores neuromusculares em pacientes com síndrome da angústia respiratória aguda (SDRA).

Recentemente, o jornal Intensive Care Medicine publicou o artigo Neuromuscular blockade in patients with ARDS: a rapid practice guideline, de Alhazzan e colaboradores, que abordou novas diretrizes de prática clínica sobre o uso de bloqueadores neuromusculares (BNM) em pacientes com síndrome da angústia respiratória aguda (SDRA) em Unidades de Terapia Intensiva (UTI). O painel incluiu 20 clínicos especialistas de 12 países e 2 representantes de pacientes. Uma revisão sistemática e meta-análise foi realizada, sendo identificados sete ensaios clínicos randomizados envolvendo 1598 pacientes com SDRA. Para avaliação da força das recomendações, foi utilizado o método GRADE.

As recomendações se aplicam a adultos com SDRA inicial de qualquer etiologia e gravidade que estejam recebendo ventilação mecânica invasiva (VMI) em uma UTI, mas não se aplicam a pacientes com doença neuromuscular preexistente, àqueles com contraindicação ao bloqueio neuromuscular ou a crianças. Os usuários-alvo desta diretriz são médicos e profissionais de saúde que cuidam de pacientes com SDRA na UTI, incluindo médicos intensivistas, farmacêuticos, enfermeiros e fisioterapeutas (terapia respiratória ou motora).

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Pesquisador realiza estudo sobre uso de bloqueadores neuromusculares na SDRA

Resumo das evidências

  1. Efeitos desejáveis de infusões de BNM

O painel observou que o impacto de uma infusão de BNM na saúde mental, função cognitiva, qualidade de vida e dias sem ventilação era incerto.

  1. Efeitos desejáveis de infusões de BNM

O uso de uma infusão de BNM por 48 horas possivelmente aumentou os riscos de eventos adversos e fraqueza adquirida na UTI. No entanto, o impacto na função física em longo prazo foi incerto.

  1. Equilíbrio entre efeitos desejáveis e indesejáveis

A evidência sugere que em adultos com SDRA moderada a grave que são ventilados mecanicamente usando alvos de sedação mais leves (RASS 0 a – 3), evitar o uso de uma infusão de BNM é favorável. Para pacientes com SDRA moderada a grave que não podem ser ventilados mecanicamente usando alvos de sedação mais leves ou precisam de sedação profunda contínua para facilitar a ventilação protetora pulmonar ou ventilação na posição prona, o uso de uma infusão de BNM é razoável. O painel emitiu apenas sugestões para pacientes com SDRA moderada a grave. Pesquisas futuras são necessárias para ajudar a delinear subgrupos específicos de pacientes que podem ou não se beneficiar de uma infusão de BNM.

  1. Recomendações e sugestões do painel de especialistas
O painel NÃO RECOMENDA o uso rotineiro de uma infusão de BNM em adultos com SDRA antes de otimizar a VMI e avaliar a gravidade da SDRA. Recomendação, baixa certeza de evidência.

Força: forte.

Em adultos com SDRA moderada ou grave que toleram ventilação usando uma estratégia de sedação mais leve, o painel SUGERE CONTRA o uso de uma infusão de BNM. Sugestão, baixa certeza de evidência.

Força: fraca.

Se o bloqueio neuromuscular for necessário para facilitar a ventilação de proteção pulmonar, o painel SUGERE o uso de bolus intermitente de BNM com sedação profunda criteriosa ao invés de uma infusão de BNM com sedação profunda. Sugestão, baixa certeza de evidência.

Força: fraca.

Em adultos com SDRA moderada ou grave em que os médicos determinam a necessidade de sedação profunda contínua e bloqueio neuromuscular para facilitar a ventilação de proteção pulmonar, o painel SUGERE o uso de uma infusão de BNM por até 48 horas, ao invés de bolus intermitentes. Sugestão, baixa certeza de evidências.

Força: fraca.

Esta recomendação pode ser aplicada para facilitar a ventilação de proteção pulmonar em adultos que estão persistentemente hipoxêmicos, ventilados na posição prona ou em risco de ventilação prejudicial, isto é, assincronia com o ventilador ou pressões de platô elevadas.

  1. BNM de escolha

De acordo com o painel, o BNM de escolha é o cisatracúrio, pois foi o único agente estudado em grandes ensaios clínicos randomizados. O impacto do uso de outras infusões de BNM para pacientes com SDRA é incerto. Os dois maiores ensaios clínicos usaram cisatracúrio em uma dose fixa de 15 mg em bolus seguida por uma infusão de 37,5 mg/h por 48 horas. Como as relações entre a dose de cisatracúrio e os efeitos clínicos e adversos não são claras, a dose deve ser ajustada para o efeito clínico paralítico. Embora seja plausível supor que o efeito benéfico do cisatracúrio esteja relacionado ao seu efeito de bloqueio neuromuscular, algumas evidências sugerem que possa ter um efeito anti-inflamatório direto também. Portanto, não está claro se deve ser usada uma dose alta fixa de cisatracúrio ou ajustar a dose para o efeito paralítico. Benefícios e danos potenciais devem ser considerados ao se tomar essa decisão. O painel considerou que o custo da infusão de cisatracúrio por 48 horas não era grande em países de alta renda, mas poderia ser considerado um custo moderado em países de baixa renda e em alguns países de renda média. Além disso, o painel ponderou que o uso de uma infusão de BNM era provavelmente viável na maioria dos ambientes de recursos elevados e não previu grandes barreiras para a implementação neste contexto.

  1. Monitoração e avaliação

Quando um BNM é prescrito para adultos com SDRA, os pacientes devem estar adequadamente sedados e a adequação da paralisia deve ser monitorada. Uma modalidade para medir a adequação da paralisia é a medição da sequência de quatro estímulos (train-of-four – TOF), um estimulador de nervo que gera uma corrente elétrica para estimular contrações musculares. A resposta ao estímulo elétrico depende da intensidade da corrente, do local em que é aplicada e da extensão da paralisia. A estratégia ideal para avaliar a adequação da paralisia não é clara; os médicos devem usar a estratégia com a qual se sentem mais confortáveis.

Saiba mais: Recrutamento alveolar e aumento da PEEP X baixa PEEP na mortalidade da SDRA

  1. Fatores que afetam a adaptação em locais com poucos recursos ou países de baixa renda
  • A decisão de priorizar recomendações sobre o uso de infusão de BNM em locais com poucos recursos ou em países de baixa renda depende da prevalência e dos resultados da SDRA neste cenário;
  • Desenvolvedores de diretrizes em locais com poucos recursos ou países de baixa renda podem usar as estimativas relativas das novas diretrizes para estimar o efeito do tratamento absoluto em seu contexto. Além disso, devem considerar rebaixar a certeza da evidência para uma forma indireta, uma vez que a maioria dos ensaios clínicos foi realizada em centros de cuidados terciários em países de alta renda, e sua aplicabilidade a outros contextos é desconhecida;
  • Os valores e preferências dos pacientes são possivelmente diferentes ao redor do mundo, portanto, os desenvolvedores de diretrizes em locais com poucos recursos ou países de baixa renda devem levar em consideração os valores culturais locais e as crenças dos pacientes em relação aos principais resultados, como mortalidade, por exemplo;
  • Embora o custo da infusão de cisatracúrio seja geralmente aceitável em países de alta renda, pode ser moderado ou alto em locais com poucos recursos ou países de baixa renda. Nesses locais, o acesso a cuidados intensivos, dispositivos de monitoramento de paralisia, terapias de resgate e centros de reabilitação são limitados;
  • Os desenvolvedores de diretrizes em locais com poucos recursos ou países de baixa renda devem considerar o impacto do direcionamento de recursos para usar a infusão de BNM na SDRA sobre a equidade e outras prioridades concorrentes. Ademais, devem considerar a aceitabilidade do uso da infusão de BNM por pacientes, profissionais de saúde e formuladores de políticas;
  • Vários fatores potenciais podem influenciar a viabilidade do uso de infusão de BNM em pacientes com SDRA em locais com poucos recursos ou países de baixa renda, como disponibilidade de medicamentos, dispositivos para monitorar a adequação da paralisia, agentes sedativos e ventiladores.
  1. Prioridades de pesquisas

Vários tópicos podem ser abordados em pesquisas futuras, como:

  • Impacto das infusões de BNM nos resultados funcionais e cognitivos em longo prazo;
  • Interação entre diferentes estratégias de ventilação como, por exemplo, o uso de BNM e PEEP alta versus baixa, ou ventilação prona versus supina;
  • Efeito de outros agentes BNM;
  • Eficácia e segurança de bolus intermitentes versus uma infusão contínua de BNM;
  • Generalização dos resultados para locais com poucos recursos.

Conclusões

As evidências atuais não apoiam o uso precoce de rotina de uma infusão de BNM em adultos com SDRA de qualquer gravidade. A infusão contínua de BNM para pacientes ventilados com uma estratégia de sedação mais leve deve ser evitada. No entanto, para pacientes que requerem sedação profunda para facilitar a ventilação protetora pulmonar ou estejam em posição prona e requerem bloqueio neuromuscular, uma infusão de BNM por 48 horas é uma opção razoável.

Referências bibliográficas:

  • Alhazzani W, Belley-Cote E, Møller MH, Angus DC, Papazian L, Arabi YM, Citerio G, Connolly B, Denehy L, Fox-Robichaud A, Hough CL, Laake JH, Machado FR, Ostermann M, Piraino T, Sharif S, Szczeklik W, Young PJ, Gouskos A, Kiedrowski K, Burns KEA. Neuromuscular blockade in patients with ARDS: a rapid practice guideline. Intensive Care Med. 2020 Oct 26:1–10. doi: 1007/s00134-020-06227-8.

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