Remdesivir para Covid-19: veja os resultados de novo estudo randomizado

Inicialmente desenvolvido para tratamento de ebola, o remdesivir vem sendo estudado como potencial agente para tratamento de Covid-19.

Remdesivir é uma pró-droga, análoga de adenosina, que tem ação contra diversas famílias de vírus, incluindo flavivírus, paramyxovirus, pneumovirus e coronavirus. Inicialmente desenvolvido para tratamento de ebola, vem sendo estudado como potencial agente para tratamento de Covid-19.

Estudos realizados in vitro mostraram capacidade do remdesivir em inibir a replicação de SARS-CoV-2 em células epiteliais humanas do trato respiratório. Em modelos animais de doença não letal, a administração precoce de remdesivir mostrou tanto efeitos clínicos quanto antivirais. O medicamento foi usado de forma compasssionada em pacientes críticos com Covid-19, com resultados que sugerem benefício.

Agora, uma publicação da JAMA mostrou novos resultados, dessa vez em um estudo controlado, com o uso de remdesivir para tratamento de Covid-19.

medicamentos variados incluindo remdesivir para covid-19

Remdesivir para Covid-19

Trata-se de um estudo duplo-cego e randomizado, controlado por placebo, conduzido em dez hospitais localizados em Wuhan, China. Os critérios de elegibilidade foram homens e mulheres não gestantes, adultos e com PCR positivo para SARS-CoV-2 e que apresentavam pneumonia confirmada por exame de imagem, hipoxemia e estavam nos primeiros 12 dias de sintomas.

Foram excluídos pacientes gestantes ou lactantes, com cirrose hepática ou com aumento significativo de transaminases, com doença renal grave conhecida ou em terapia substitutiva renal, com possibilidade de transferência para outra unidade hospitalar nas primeiras 72h e participação em outro estudo para tratamento de Covid-19 nos 30 dias prévios à inclusão. O uso de outros tratamentos, como lopinavir/ritonavir e corticoide, era permitido.

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Os participantes foram aleatoriamente alocados para ficar no grupo que recebeu remdesivir ou no grupo placebo, na proporção de 2:1, respectivamente. A randomização foi estratificada de acordo com o nível de suporte ventilatório requerido pelos participantes: 1) sem suporte de oxigênio ou com cateter nasal ou máscara de oxigênio ou 2) uso de oxigênio de alto fluxo, ventilação não invasiva (VNI), ventilação invasiva ou ECMO.

Os alocados no grupo do remdesivir receberam tratamento intravenoso com a droga por 10 dias (200 mg no D1 e 100 mg nos dias seguintes). O grupo controle recebeu o mesmo volume de placebo. Os participantes foram avaliados diariamente em relação ao desenvolvimento de eventos adversos e realizaram exames laboratoriais (dias 1, 3, 7 e 10) e ECG (dias 1 e 14). Além disso, swabs naso e orofaríngeos e fecais e anais para detecção de PCR viral foram coletados de forma sistemática.

O desfecho primário foi tempo para melhora clínica nos primeiros 28 dias após a randomização, definida como redução de pelo menos 2 pontos em relação à admissão na escala utilizada (morte = 6; admissão hospitalar para ECMO ou VM = 5; admissão hospitalar para VNI ou oxigenoterapia de alto fluxo = 4; admissão hospitalar para oxigenoterapia = 3; admissão hospitalar sem necessidade de oxigenoterapia = 2; alta hospitalar ou com critérios de alta =1) ou alta hospitalar.

Desfechos secundários incluíram a proporção de pacientes em cada ponto da escala nos dias 7, 14 e 28 após a randomização, mortalidade por todas as causas em 28 dias, frequência de VM, duração de oxigenoterapia, duração de internação hospitalar e proporção de pacientes com infecção nosocomial.

Resultados

O estudo foi interrompido precocemente devido ao controle dos casos em Wuhan e diminuição na possibilidade de inclusão de participantes. Com isso, o poder estatístico do estudo, inicialmente calculado para 80%, caiu para 58%. Foram incluídos na análise 158 pacientes no braço do remdesivir e 78 no grupo placebo.

A média de idade foi de 65 anos. A proporção de homens e mulheres no estudo foi de 56% vs. 44% no grupo que recebeu remdesivir e de 65% vs. 35% no grupo placebo, respectivamente. As comorbidades mais comuns foram hipertensão arterial, diabetes e doença coronariana. A maioria dos pacientes estava na categoria 3 da escala clínica utilizada (admissão hospitalar para oxigenoterapia).

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Os grupos eram heterogêneos em algumas características: o grupo que recebeu remdesivir possuía mais pacientes com comorbidades e com taquipneia, enquanto o grupo placebo tinha mais pacientes com 10 dias ou menos de sintomas. Como terapia concomitante, 18% dos pacientes receberam lopinavir/ritonavir, mas de forma balanceada entre os grupos.

Em relação ao tempo para melhora clínica, não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos, com uma média de 21 dias no grupo que recebeu remdesivir e de 23 dias no grupo placebo (HR = 1,23; IC 95% 0,87 – 1,75). Embora sem diferença significativa, na análise por intenção de tratamento do subgrupo de pacientes com 10 dias de sintomas ou menos, o grupo que recebeu remdesivir teve um tempo para melhora clínica numericamente menor do que o grupo placebo (18 dias vs. 23 dias, respectivamente; HR = 1,52 [0,95 – 2,43]).

A mortalidade em 28 dias também não foi diferente entre os grupos (14% no grupo do remdesivir vs. 13% no grupo placebo). No subgrupo de pacientes com 10 dias ou menos de sintomas, a mortalidade foi numericamente maior no grupo placebo, enquanto que, no subgrupo com mais dias de sintomas, a mortalidade foi numericamente maior no grupo do remdesevir. Em ambos os casos, as diferenças encontradas não alcançaram diferença estatística.

Também não foram encontradas diferenças significativas na avaliação das taxas de melhora clínica nos dias 14 e 28, de tempo de VM, tempo de necessidade de oxigenoterapia, duração de internação hospitalar ou tempo para clearance viral nos swabs coletados. Contudo, os valores numéricos tendem a favorecer o remdesivir nos dois primeiros parâmetros.

Não houve diferença entre os grupos em relação à presença de eventos adversos (66% no grupo que recebeu remdesivir vs. 64% no grupo controle). Os eventos mais comuns no grupo do remdesevir foram constipação, hipoalbuminemia, hipocalemia, anemia, trombocitopenia e aumento de bilirrubina total. Já no grupo que recebeu placebo, foram mais comumente relatados hipoalbuminemia, constipação, anemia, hipocalemia, aumento de TGO, aumento de lipídeos séricos e aumento de bilirrubina total.

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Mensagens práticas

  1. Apesar de não alcançar significância estatística, remdesivir esteve associado a uma redução numérica de 5 dias na média de tempo para melhora clínica quando utilizado nos primeiros 10 dias de sintomas.
  2. O uso de remdesivir não mostrou reduções significativas nos níveis ou na detecção de RNA de SARS-CoV-2 em amostras clínicas do trato respiratório.
  3. O tratamento foi bem tolerado no geral, mas uma proporção maior de pacientes no braço do remdesivir teve o tratamento interrompido por eventos adversos, principalmente sintomas gastrointestinais, aumento de transaminases e bilirrubinas e piora do status cardiopulmonar.
  4. Uma das grandes limitações do trabalho é o tamanho amostral menor do que o originalmente calculado, o que diminui o poder estatístico do estudo. Dessa forma, diferenças que possam existir entre os grupos podem não ter sido encontradas pelo número limitado de pacientes incluídos.
  5. Outros ensaios precisam ser feitos para que a presença ou ausência de possíveis benefícios do remdesivir no tratamento de Covid-19 sejam comprovados.

Referências bibliográficas:

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